terça-feira, 28 de junho de 2011

Trechos - Tony Judt

«Mas se somos todos  'democratas', o que nos diferencia agora? O que defendemos? Sabemos o que não queremos: com a experiência amarga do século passado aprendemos que há coisas que os Estados de certeza não devem fazer. Sobrevivemos a uma época de doutrinas que propunham, com uma confiança alarmante, ditar como deviam agir os nossos governantes e recordar aos indivíduos — às vezes pela força — que os detentores de autoridade sabem o que é bom para eles. Não podemos voltar a isso.
Inversamente, e apesar das pretensas lições de 1989, sabemos que o Estado não é todo mau. A única coisa pior que governo a mais é governo a menos: nos Estados falhados, o povo sofre pelo menos tanta violência e injustiça quanto sob um governo autoritário, e a juntar a isso os comboios não chegam a horas. Além do mais, se pensarmos um pouco na questão, conseguimos perceber que o conto moral do século XX de 'socialismo contra liberdade' ou 'comunismo contra capitalismo' é enganador. O capitalismo não é um sistema político; é uma forma de vida económica, compatível na prática com ditaduras de direita (o Chile sob Pinochet), ditaduras de esquerda (a China contemporânea), monarquias sociais-democratas (a Suécia) e repúblicas plutocráticas (os Estados Unidos). Se as economias capitalistas prosperam mais em condições de liberdade talvez seja uma questão mais em aberto do que gostamos de pensar.»
Tony Judt, Um Tratado Sobre os Nossos Actuais Descontentamentos, pp. 141-142.