quarta-feira, 15 de junho de 2011

Às quartas

SE AMANHÃ ACORDO

      De súbito respira-se melhor e o ar da primavera
chega ao fundo. Mas foi somente um prazo
que o sofrimento concede para dizermos a palavra.
Ganhei um dia; tive o tempo
na minha boca como um vinho.
               Costumo procurar-me
na cidade que passa como um barco de loucos pela noite.
Encontro um rosto apenas: homem velho e sem dentes
a quem a dinastia, o poder, a riqueza, o génio,
tudo lhe deram afinal, excepto a morte.
É um inimigo mais temível que Deus,
o sonho que posso ser se amanhã acordo
e sei que vivo.
                      Mas de súbito a alvorada
cai-me entre as mãos como uma laranja rubra.

Jorge Gaitán Durán

(Trad.: José Bento)