segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Comentário de segunda

Ministério da Educação assina acordo com a FNE (Público.PT, 9/9/11)

FNE satisfeita com o acordo assinado com o Ministério da Educação (Público.PT, 10/9/11)

Ministério da Educação assina uma acta global negocial com a Fenprof (Público.PT, 9/9/11)

Mário Nogueira: «É tempo de virar a página.» (Jornal de Notícias, 11/9/11)

Três anos e meio depois da Marcha da Indignação, realizada a 8 de Março de 2008, com a participação de 100 mil professores, Ministério da Educação e sindicatos, em uníssono, dizem dar por encerrado o problema da avaliação do desempenho docente. Este processo constitui um exemplo modelar do modo de se fazer política em Portugal e da qualidade dos políticos e sindicatos que temos.
Tudo isto começou com a irresponsabilidade política e a indescritível incompetência técnica de duas personagens que ficarão associadas aos momentos mais negros da história do país: José Sócrates e Lurdes Rodrigues — respectivamente, o primeiro responsável pela catástrofe nacional com que actualmente estamos confrontados e a primeira responsável pelo desastre que hoje vivemos em diversos sectores da Educação.
Em 2008, Lurdes Rodrigues tentou introduzir um modelo de avaliação dos professores que ficou conhecido por ser uma monstruosidade técnica e por constituir uma afronta à dignidade profissional dos docentes. Sucederam-se dois anos de graves conflitos entre os profissionais do ensino e a ministra, com avanços, recuos e, de permeio, com peripécias políticas e sindicais inqualificáveis.
Em 2010, Isabel Alçada substituiu o acinte da sua antecessora pelo sorriso, mas manteve a incompetência técnica e a obstinação política. Surpreendentemente, e sem nenhuma razão válida que o justificasse, os sindicatos assinaram um Acordo com a recém-empossada ministra. A celebração deste Acordo abriu o caminho à tentativa de levar à prática o aberrante processo avaliativo. Com a publicação, no início do ano lectivo 2010-2011, dos designados Padrões do Desempenho Docente foi atingido, neste processo, o zénite do absurdo. Quando, nas escolas, a farsa avaliativa recomeçou, a contestação ressurgiu, começou a crescer (sem a ajuda dos sindicatos, recorde-se — a assinatura do Acordo foi consequente) e o ambiente entre os professores a degradar-se rapidamente. O movimento de resistência à enormidade avaliativa acabou por ter uma brusca interrupção com a aprovação parlamentar da revogação da legislação que a sustentava e com a dissolução do Parlamento e a convocação de eleições.
A era do Partido Socialista chegava ao fim. Todavia, na história, este período ficará registado como o período da afronta gratuita e do incomensurável desperdício: ataque obcecado à classe docente, perda de milhares de horas em protestos, deterioração de relações de trabalho, desgaste psicológico e contínua instabilidade.

Chegados aqui, observa-se algo de inusitado: um novo ministro da Educação que, quando «não-ministro» prometia um mundo novo, não fez mais do que pegar no velho e enodoado modelo existente e remendá-lo. Impossibilitado de fundamentar com seriedade, o novo ministro faz afirmações falsas sobre o novo/velho modelo: a primeira das quais é dizer que, a partir de agora, a avaliação docente vai estar centrada na vertente científico-pedagógica. Isto deveria ser verdade, mas não é. Não é por três razões factuais:
i) Porque milhares de professores estão formalmente dispensados da avaliação dessa vertente (os do 8.º, 9.º e 10.º escalões, que só terão uma (pseudo) avaliação nos domínios da «Participação na escola e relação com a comunidade» e da «Formação Contínua»);
ii) Porque só em dois escalões essa avaliação é obrigatória;
iii) E porque essa avaliação consiste, ridiculamente, na observação de duas aulas.

Não há nenhuma dúvida de que este modelo continuará a ser uma encenação avaliativa que em nada contribuirá para a melhoria da formação e da qualificação profissional dos docentes. O curioso é verificar que é precisamente Nuno Crato — o, até há pouco tempo, campeão do rigor e da exigência — quem vai assinar a formalização do faz-de-conta e da facilitação generalizada.
Quanto aos sindicatos, há pouco a dizer. Basta assinalar a paupérrima qualidade discursiva e a objectiva incapacidade sindical da FNE, e referir a caricata posição da Fenprof cujas razões agora apresentadas para não assinar o actual Acordo constituem precisamente as mesmas razões que há um ano e meio a não impediu de assinar o Acordo com o Governo anterior.