O sepulcral silêncio que caiu sobre o novo/velho modelo de avaliação do desempenho é ensurdecedor. Apesar de o líder do partido maioritário do Governo ter prometido revogar o modelo anterior e não o ter feito, apesar de ter prometido elaborar um modelo novo e não o ter feito, apesar de, do ponto de vista técnico, o modelo apresentado continuar a ser um desastre, apesar de, na substância, nada de significativo se ter alterado, o mutismo instalou-se, como se tudo estivesse bem, como se nada de esdrúxulo tivesse acontecido.
Como a insignificância destas notas não correm o risco de perturbar tão grande silêncio, eu aventuro-me a prosseguir com elas.
Artigo 18.º (Observação de aulas) — Este Artigo determina que, para os professores na carreira, a observação de aulas é facultativa, excepto nas seguintes circunstâncias: se o professor se encontrar no 2.º ou 4.º escalões; se obtiver uma classificação de «Insuficiente»; ou se quiser candidatar-se à classificação de «Excelente».
Como a insignificância destas notas não correm o risco de perturbar tão grande silêncio, eu aventuro-me a prosseguir com elas.
Artigo 18.º (Observação de aulas) — Este Artigo determina que, para os professores na carreira, a observação de aulas é facultativa, excepto nas seguintes circunstâncias: se o professor se encontrar no 2.º ou 4.º escalões; se obtiver uma classificação de «Insuficiente»; ou se quiser candidatar-se à classificação de «Excelente».
Para não ser exaustivo, duas observações apenas:
i) Nos termos deste Artigo, passa a ser possível classificar o desempenho de um professor como «Muito Bom» sem ninguém ter a mais pequena informação fidedigna acerca do desempenho desse professor, a nível científico e a nível pedagógico, isto é, sem existir a mais pequena informação fidedigna sobre o domínio que verdadeiramente é importante no ensino, sobre o domínio que é a essência da profissão docente. Esta aberrante situação acontece porque a observação de aulas não é obrigatória para se obter a classificação de «Muito Bom». Consequentemente, o que fica, em termos de elementos de avaliação da componente científico-pedagógica, é o que o professor escrever, a esse respeito, no seu mísero relatório de auto-avaliação de três páginas (sem a possibilidade de anexos). E como nessas três páginas tem de caber uma reflexão específica sobre cinco áreas — prática lectiva; actividades promovidas; análise dos resultados obtidos; contributos para os objectivos e metas fixados no Projecto Educativo do agrupamento de escolas ou escola não agrupada; formação realizada e o seu contributo para a melhoria da acção educativa (cf. post anterior sobre esta matéria) — o que dá pouco mais de um quarto de página para cada uma delas, aquilo que no relatório for escrito sobre a parte científico-pedagógica será absolutamente irrelevante, para não dizer absolutamente ridículo. Mas será precisamente essa irrelevância que constituirá a informação para se avaliar o desempenho de um professor, no domínio científio-pedagógico.
O soado rigor de Crato e a afamada exigência de Crato são isto! Resumem-se a isto! Tenho curiosidade de saber como é possível avaliar, através de uma página escrita anualmente, se um professor é «Muito Bom» no domínio científico-pedagógico. Mas a esta bizarria ainda se acrescenta outra do mesmo quilate que ocorrerá quando esse conteúdo for escrutinado por alguém que nada entenda da área científica do professor avaliado — o que sucederá sempre que o avaliador interno tiver de ser o coordenador do departamento e este não pertencer ao grupo disciplinar do docente avaliado (cf. Artigo 14.º ou aqui).
Eu julgava que, tecnicamente, não era possível fazer pior do que já existia. Afinal é possível. Neste aspecto, o ministro surpreendeu;
ii) Um professor que pretenda candidatar-se à classificação de «Excelente» terá de ter aulas observadas por um avaliador externo à escola. Quantas aulas? Duas. Duas singelas aulas. A partir daqui, um professor pode ver o seu desempenho classificado de «Excelente». Por conseguinte, o ministro da Educação considera que, pela observação de apenas duas aulas, é possível avaliar da excelência do domínio científico-pedagógico de um professor. Que as suas duas antecessoras pensassem assim, não admirava nem admirou (ambas só tinham como missão proletarizar os professores e dar a impressão de que os sujeitavam a uma avaliação), mas Nuno Crato — o rigoroso, o exigente, o escrupuloso — a pensar assim? Estamos, certamente, perante um sui generis conceito de rigor, um sui generis conceito de exigência e um sui generis conceito de seriedade: duas aulitas devidamente encenadas tornam possível ser-se classificado como um «Excelente» professor.
Não fazia ideia de que o rigor fosse isto, mas a vida reserva-nos permanentes surpresas.
O soado rigor de Crato e a afamada exigência de Crato são isto! Resumem-se a isto! Tenho curiosidade de saber como é possível avaliar, através de uma página escrita anualmente, se um professor é «Muito Bom» no domínio científico-pedagógico. Mas a esta bizarria ainda se acrescenta outra do mesmo quilate que ocorrerá quando esse conteúdo for escrutinado por alguém que nada entenda da área científica do professor avaliado — o que sucederá sempre que o avaliador interno tiver de ser o coordenador do departamento e este não pertencer ao grupo disciplinar do docente avaliado (cf. Artigo 14.º ou aqui).
Eu julgava que, tecnicamente, não era possível fazer pior do que já existia. Afinal é possível. Neste aspecto, o ministro surpreendeu;
ii) Um professor que pretenda candidatar-se à classificação de «Excelente» terá de ter aulas observadas por um avaliador externo à escola. Quantas aulas? Duas. Duas singelas aulas. A partir daqui, um professor pode ver o seu desempenho classificado de «Excelente». Por conseguinte, o ministro da Educação considera que, pela observação de apenas duas aulas, é possível avaliar da excelência do domínio científico-pedagógico de um professor. Que as suas duas antecessoras pensassem assim, não admirava nem admirou (ambas só tinham como missão proletarizar os professores e dar a impressão de que os sujeitavam a uma avaliação), mas Nuno Crato — o rigoroso, o exigente, o escrupuloso — a pensar assim? Estamos, certamente, perante um sui generis conceito de rigor, um sui generis conceito de exigência e um sui generis conceito de seriedade: duas aulitas devidamente encenadas tornam possível ser-se classificado como um «Excelente» professor.
Não fazia ideia de que o rigor fosse isto, mas a vida reserva-nos permanentes surpresas.