sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Avaliação: Pano Velho - 5

Algumas notas mais sobre o novo/velho modelo de avaliação.

Artigo 14.º (Avaliador interno) [continuação] e Artigo 16.º (Documentos do procedimento de avaliação) - O n.º 3 do Artigo 14.º e o Artigo 16.º enunciam, respectivamente, os documentos «através» dos quais é feita a avaliação interna do desempenho e os documentos que «constituem» o processo de avaliação. Como os documentos «através» dos quais se avalia e os documentos que «constituem» o processo são precisamente os mesmos, consomem-se dois artigos para dizer... o mesmo.
Portanto, segundo estes Artigos, o avaliador interno irá avaliar «através de» e «constitutivamente» os seguintes três documentos: o projecto docente, o documento de registo e avaliação feito pelo Conselho Pedagógico e o relatório de auto-avaliação. Vejamos.
1 - Projecto docente.
Este «Projecto Docente» é apenas uma designação diferente dos estultos «Objectivos Individuais», do modelo anterior — e do mesmo modo que os «Objectivos Individuais» não eram de entrega obrigatória este «projecto» também não o é. Ora não sendo de elaboração obrigatória, e, por conseguinte, não sendo entregue, evidentemente, que não será «através» dele que o avaliador avalia e, consequentemente, o «projecto» não chega sequer a «constituir» um documento do processo.
Portanto, até aqui temos zero de novidade e zero de substância.

2 - Documento de registo e avaliação feito pelo Conselho Pedagógico. 
Estamos a falar do documento que o avaliador preenche para, pretensamente, registar a «participação do professor na escola e na comunidade» e a «formação contínua» realizada (formação que, na maioria dos casos, não existe há vários anos). Quanto a registos sobre a «dimensão científico-pedagógica», nada de minimamente sério poderá ser feito, a nível da avaliação interna, como veremos mais adiante.
Então, na prática, este documento é o quê? É uma folhinha de Excel com uns pretensos indicadores e descritores de desempenho docente inscritos em quadrículas, à frente das quais outras quadrículas se colocam para o avaliador assinalar umas cruzes. Por outras palavras, estamos a falar dos velhos padrões de desempenho, mas agora feitos por cada escola. Isto significa dizer que, de estabelecimento para estabelecimento, estes critérios se diferenciarão como o vinho se diferencia da água, e que, pela natureza da actividade avaliada (participação na escola e relação com a comunidade), esses critérios oscilarão entre o critério do «olhómetro» e o critério da «régua e esquadro», isto é, oscilarão entre o criteriosamente obscuro e o criteriosamente ridículo.
Também aqui, continuamos a ter zero de novidade (porque o pretenso método «avaliativo» é o mesmo) e muito duvidosa substância.

3 - Relatório de auto-avaliação.
O relatório de auto-avaliação que o novo/velho modelo prevê é um hino à asneira e à incoerência. De elaboração anual (excepto para os professores dos três últimos escalões), este relatório não pode ultrapassar as três páginas de extensão e não pode ter anexos. Ora todos sabemos que não é tecnicamente possível fazer uma auto-avaliação séria e profissional de um ano de trabalho em folha e meia. Mas o hino à asneira e à incoerência não termina aqui. Ele atinge o seu ponto mais alto quando se lê, no n.º 2, do Artigo 19.º, o seguinte:
«O relatório de auto-avaliação consiste num documento de reflexão sobre a actividade desenvolvida incidindo sobre os seguintes elementos: 
a) A prática lectiva; b) As actividades promovidas; c) A análise dos resultados obtidos; d) O contributo para os objectivos e metas fixados no Projecto Educativo do agrupamento de escolas ou escola não agrupada; e) A formação realizada e o seu contributo para a melhoria da acção educativa.» 
É constrangedor comentar isto, porque a dimensão do disparate é de uma ordem tal que o comentário se torna um incómodo. Na verdade, que conversa séria é que se pode ter acerca de um documento que diz: o relatório não pode ter mais de três páginas, e, ao mesmo tempo, diz que, nessas três páginas, deve ser elaborada: uma reflexão sobre a prática lectiva realizada durante um ano (com, por exemplo, cinco, seis ou mais turmas); uma reflexão sobre as actividades curriculares e não curriculares desenvolvidas durante esse ano; uma reflexão sobre análise os resultados obtidos em cada turma; uma reflexão sobre o contributo que o professor deu para a concretização dos objectivos enunciados no Projecto Educativo; e, ainda, uma reflexão sobre a formação contínua que foi realizada e sobre os contributos dessa formação para a melhoria da acção educativa do próprio professor. Tudo apresentado, no máximo, em folha e meia!
Este documento do Ministério da Educação não revela apenas incompetência, revela também uma lamentável falta de seriedade intelectual.
Por conseguinte, não saímos do zero de novidade (mantém-se o relatório) e atingimos o abaixo de zero na substância.