sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Avaliação: Pano Velho - 3

Algumas notas mais sobre o novo/velho modelo de avaliação docente do ministro Nuno Crato.

Artigo 8.º (Intervenientes) - Este artigo introduz a novidade de fazer do presidente do Conselho Geral mais um agente no processo de avaliação — sobre o mérito desta novidade, dou a minha opinião mais abaixo. 
Antes disso, uma curiosidade: na 2.ª versão deste Projecto, previa-se que, na circunstância do presidente do Conselho Geral não ser um docente, este órgão elegeria, entre os seus membros, um professor para exercer as novas funções que o Projecto atribui ao cargo (n.º 2 do Artigo 26.º). Na 3.ª versão, o conteúdo deste n.º 2 desapareceu. Mas não desapareceu por opção (porque um outro artigo remete para ele, como se ele existisse...), desapareceu porque ninguém reviu com a devida atenção o trabalho de redacção.
Até a este nível, há continuidade entre a nova equipa do Ministério da Educação e a anterior...

Artigo 9.º (Presidente do Conselho Geral) - Este Artigo especifica as competências do presidente do Conselho Geral no processo avaliativo, e a sua principal competência é a de homologar as propostas de decisão dos recursos que sejam apresentados. 
Não sendo a homologação da proposta de decisão um mero e automático acto administrativo, isto é, a homologação ou a não homologação da proposta dependerá de critérios fundamentados, não se compreende que se atribua essa competência ao presidente do Conselho Geral.
Pergunta-se: porquê ao presidente do Conselho Geral? Algum presidente do Conselho Geral, ou algum professor que faz parte deste órgão, foi eleito segundo critério que incluísse os seus eventuais conhecimentos ou as suas eventuais competências em matéria avaliativa, ou de juízo avaliativo, ou de juízo sobre propostas avaliativas? Nenhum foi, nem era cogitável que fosse. 
O Conselho Geral é um órgão essencialmente vocacionado para a definição da política educativa da escola, não é um órgão técnico, nem arbitral, nem para-judicial.
Por conseguinte, e do ponto de vista objectivo, o presidente do Conselho Geral não possui, atribuída pela natureza do órgão ou pelas funções que desempenha, qualquer característica específica que o indicie como particularmente preparado para a função de julgar, em matéria de avaliação docente, sobre o parecer de um recurso.
Por outro lado, do ponto de vista da coerência interna do Projecto, esta opção é ininteligível. O Projecto faz questão de distinguir os professores do 8.º, 9.º e 10.º escalões como não necessitando de uma avaliação idêntica à dos professores dos outros escalões, mas admite que possa ser um professor do 7.º, do 6.º, do 5.º ou de outro escalão inferior (pois qualquer um deles pode ser presidente do Conselho Geral) a decidir, em última instância, de um recurso apresentado por um professor dos últimos escalões — que até pode ter sido um seu avaliador...
Do ponto de vista da imparcialidade, esta opção está condenada à partida — e não chega que o Artigo 26.º do Projecto recorde o Código do Procedimento Administrativo. Exceptuando, os professores do 10.º escalão, que já não terão mais escalões para progredir, todos os professores são virtualmente concorrentes entre si, pela simples existência de cotas. Assim, de forma directa ou indirecta, em acto ou em potência, o presidente do Conselho Geral, ou quem o substitua, se não se encontrar no 10.º escalão, será parte interessada, particularmente, em recursos referentes à atribuição das classificações de «Muito Bom» e de «Excelente».

Artigo 11.º (Conselho Pedagógico) - A alínea a) deste Artigo diz que compete ao Conselho Pedagógico eleger os quatro membros que, em conjunto com o director, vão formar a Secção de Avaliação do Desempenho Docente. Este é mais um exemplo de remendo em pano velho. O anterior modelo de avaliação era péssimo e, agora, ao pretender-se dar continuidade a esse modelo com a introdução de alterações cirúrgicas — algumas delas de cariz aparentemente mais consensual, mas incongruentes com o modelo em que se inserem — gera-se, como resultado, um desconexo amontoado de normas que conflituam entre si. Este Artigo 11.º é um exemplo. Vejamos.
A Secção de Avaliação do Desempenho Docente tem, entre outras, as competências de:
- aprovar (ou não) a classificação final das propostas dos avaliadores;
- produzir parecer sobre o relatório de auto-avaliação dos professores do 8.º, 9.º e 10.º escalões e ainda sobre o relatório de auto-avaliação do subdirector, dos directores adjuntos, dos assessores de direcção, dos coordenadores de departamento e dos avaliadores designados pelos coordenadores.
Note-se o imbróglio que isto representa:
i) Poderá haver professores de escalões inferiores (se forem eleitos para Secção de Avaliação do Conselho Pedagógico) a participar na avaliação de professores de escalões superiores, violando objectivamente o princípio, anunciado pelo ministro, que impede que isso aconteça;
ii) Nesta circunstância, teremos professores que serão simultaneamente avaliados e juízes dos seus avaliadores (porque emitem parecer sobre o relatório de auto-avaliação dos coordenadores ou de quem por eles foi designado);
iii) Finalmente, os professores daquela Secção intervêm ainda, por via do parecer que emitem, na avaliação dos adjuntos da direcção e do subdirector.
A trapalhada é quase indescritível.

Não é fácil encontrar tanta improvisação, amadorismo e irresponsabilidade juntos.
Para a semana procurarei deixar mais algumas notas.