Dos sete princípios apresentados pelo ministro da Educação — isto é dos sete pilares a partir dos quais o novo modelo de avaliação do desempenho docente se deveria constituir —, um já desapareceu (6.º), três não estão a ser respeitados (3.º, 4.º e 7.º) e um outro é apenas faz-de-conta (5.º).
Os sete pilares estão, por conseguinte, reduzidos a dois, sendo que um deles (1.º) é apenas uma alegada salvaguarda para que não haja prejudicados com os vergonhosos processos de (pseudo) avaliação que têm ocorrido — como se tal salvaguarda pudesse agora ser possível (tê-lo-ia sido se a promessa de revogação tivesse sido cumprida). O mal que eles originaram, alimentaram e disseminaram já não tem salvaguarda que o evite.
Agora, algumas notas acerca do articulado da última versão (6/9/11) do Projecto Crato.
Art.º 4 (Dimensões da avaliação) - Este artigo revela um pequeno progresso relativamente ao modelo Sócrates/Rodrigues/Alçada: de quatro dimensões passou-se para três. Finalmente foi reconhecido o que era para todos evidente: a antiga primeira dimensão («Vertente Profissional, Social e Ética») era uma excrescência, não apenas pelo seu conteúdo mas porque ele se repetia nas outras dimensões.
Lamentavelmente, o progresso começou e terminou aqui.
Sem se apresentarem as razões substantivas que pretensamente fundamentam a existência de uma dimensão designada de «Participação na escola e relação com a comunidade educativa», insiste-se, por modismo pedagógico ou por inserção no «politicamente correcto», na formalização desta dimensão avaliativa. Para além de ser uma dimensão que, na realidade, não é uma, mas duas, ela(s) nunca deveria(m) constituir uma dimensão da avaliação individual de cada professor. A relação com a comunidade educativa é uma relação da organização-escola com a comunidade, por isso, compete à escola, enquanto organização, o desenvolvimento dessa relação para a qual mobilizará os professores que forem necessários. Deste modo, nunca poderá ser um objectivo de natureza individual. É um dos parâmetros de uma política de escola e não um amontoado de actos individualizados que todos supostamente têm de realizar.
Sem se apresentarem as razões substantivas que pretensamente fundamentam a existência de uma dimensão designada de «Participação na escola e relação com a comunidade educativa», insiste-se, por modismo pedagógico ou por inserção no «politicamente correcto», na formalização desta dimensão avaliativa. Para além de ser uma dimensão que, na realidade, não é uma, mas duas, ela(s) nunca deveria(m) constituir uma dimensão da avaliação individual de cada professor. A relação com a comunidade educativa é uma relação da organização-escola com a comunidade, por isso, compete à escola, enquanto organização, o desenvolvimento dessa relação para a qual mobilizará os professores que forem necessários. Deste modo, nunca poderá ser um objectivo de natureza individual. É um dos parâmetros de uma política de escola e não um amontoado de actos individualizados que todos supostamente têm de realizar.
Por outro lado, a designada «Participação na escola» não é um fim em si mesmo. A participação na escola desenvolve-se sempre em contexto: decorre das exigências do processo de ensino-aprendizagem; decorre do trabalho do grupo disciplinar; decorre do trabalho de director de turma, etc. etc.
A dimensão «Formação contínua e desenvolvimento profissional» é uma exigência ou até mesmo um pré-requisito da dimensão «Científica e Pedagógica» (esta, sim, verdadeiramente importante). E enquanto pré-requisito ou constituinte essencial desta última dimensão não tem sentido ser avaliada à parte.
Conclusão: De quatro passámos para três dimensões, sendo que, das três, só uma — a «Científica e Pedagógica» — é realmente pertinente, enquanto dimensão avaliativa. (Lamentavelmente, como veremos mais à frente, a avaliação desta dimensão não passará, também neste projecto, do nível da encenação, do faz-de-conta).
Art.º 6.º (Elementos de referência da avaliação) - Como este modelo (da mesma forma que os anteriores) assenta no equívoco e na obsessão do reconhecimento e da premiação do mérito/excelência (ainda que explicitamente já não o assuma), este Artigo 6.º constitui um dos seus pés de barro. Não propriamente pelo seu conteúdo, mas pelo que nele se supõe para o futuro. Isto é, pelo que exige que se defina a médio prazo. Falo dos famigerados «Padrões de Desempenho», terminologia que, curiosamente, este projecto evita como o diabo evita a cruz — os «padrões» aparecem aqui genericamente designados de «parâmetros». Contudo, com uma nuance significativa: Nuno Crato não vai repetir o erro de Isabel Alçada, ou seja, o Ministério da Educação e Ciência, desta vez, atira para as escolas a responsabilidade da definição da maior parte dos parâmetros. Foge de pisar o terreno onde mais visivelmente este tipo de modelos de avaliação revela a sua incompetência e inoperância. Ao Ministério caberá apenas a definição dos parâmetros nacionais respeitantes à parte da avaliação externa — e não é difícil adivinhar que mesmo esta muito restrita definição de parâmetros caracterizar-se-á por um conjunto muito generalista e inócuo de proposições, de modo a não sujeitar-se ao ridículo e às consequentes críticas de que foram alvo os desastrosos «Padrões de Desempenho» elaborados pela anterior equipa ministerial.
O grosso fica para cada escola definir. Ora, juntando os errados pressupostos de que o modelo enferma ao desvario de muitas cabeças e à falta de formação séria e credível, em matéria de avaliação docente, da quase totalidade dos professores não é difícil prever no que vai resultar este processo. Aliás, este últimos anos foram pródigos na revelação objectiva desse desvario e dessa (natural) impreparação. O Ministério sabe disso, mas, porque politicamente lhe convém, faz de conta que não sabe. Segue o exemplo de Pilatos e assim resolve o (seu) problema.
Artigo 7.º (Natureza da avaliação) - O n.º 2 deste artigo tem o seguinte enunciado: «A avaliação interna é efectuada pelo agrupamento de escolas ou escola não agrupada do docente e realizada em todos os escalões.» Duas curiosidades:
i) Mais à frente — n.º 2 do Art.º 27.º — é dito que os docentes do 10.º escalão (para além dos do 9.º e 8.º, mas, para o caso, interessam apenas os do 10.º) entregam o relatório de auto-avaliação no final do ano escolar anterior ao do fim do ciclo avaliativo.
Ora, os professores do 10º escalão (quando os houver) já não têm ciclo avaliativo, porque os ciclos avaliativos referem-se ao tempo necessário à transição de escalão, e como estes professores já não têm escalão para transitar também não têm ciclo avaliativo. Logo...
ii) Por outro lado, o n.º 3 do mesmo Art.º 27.º enuncia: «A não entrega injustificada do relatório de auto-avaliação, por motivo não previsto na lei, implica a não contagem do tempo de serviço do ciclo avaliativo em causa para efeitos de progressão na carreira docente.»
Ora (mais uma vez), aos professores do 10.º escalão já não há contagem de tempo de serviço a realizar para efeitos de progressão na carreira, porque eles não têm mais carreira para progredir. Logo...
Estas duas «curiosidades» servem apenas para ilustrar a qualidade do trabalho que se continua a produzir no Ministério da Educação e Ciência.
Espero poder continuar, na próxima sexta-feira, com a apresentação de mais algumas notas sobre este novo/velho Projecto de Avaliação do Desempenho Docente.