quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Às quartas

PERGUNTAS À HORA DO CHÁ

Este senhor pálido parece
uma figura de um museu de cera;
olha através das cortinas rasgadas:
que vale mais, — o ouro ou a beleza?,
Vale mais o regato que flui
ou a grama imóvel em sua margem?
Ao longe ouve-se muito bem um sino
que abre mais uma ferida, ou a fecha:
é mais real a água da nascente
ou essa jovem que se fita nela?
Não se sabe, a gente passa o tempo
a construir castelos sobre a areia:
— é superior o copo transparente
à mão do homem que o cria?
Respira-se uma atmosfera fatigada
de cinza, de fumo, de tristeza:
o que uma vez se viu já não se volta
a ver igual, dizem as folhas secas.
Hora do chá, torradas, margarina.
Tudo envolto numa espécie de névoa.

Nicanor Parra
(Trad.: José Bento)