«Por que motivo, nas últimas três décadas, tem sido tão fácil ao poder convencer os seus eleitores da sabedoria — e, de qualquer modo, da necessidade — das políticas que quer seguir? Porque não tem havido alternativa coerente. Mesmo quando há diferenças políticas significativas entre os principais partidos, elas são apresentadas como versões de um único objectivo. Tornou-se um lugar-comum declarar que queremos todos o mesmo, e que temos só formas ligeiramente diferentes de o conseguir.
Mas isso é simplesmente falso. Os ricos não querem o mesmo que os pobres. Os que dependem do seu emprego para viver não querem o mesmo que os que vivem de investimentos e dividendos. Os que não precisam de serviços públicos — porque podem adquirir educação, protecção e transporte privados — não procuram o mesmo que os que dependem exclusivamente do sector público. Os que ganham com guerra — como fornecedores da defesa ou em bases ideológicas — têm objectivos diferentes de quem está contra a guerra.
As sociedade são complexas e contêm interesses em conflito. Afirmar o contrário — negar distinções de classe ou riqueza ou influência — é apenas um modo de promover um conjunto de interesses sobre outro. Esta proposição costumava ser óbvia; hoje somos incentivados a rejeitá-la como um encorajamento incendiário do ódio de classe.»
Tony Judt, Um Tratado Sobre os Nossos Actuais Descontentamentos, pp. 161-162.