Canto VI
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E esses doze protectores de prostitutas,
exaltados violentamente pelos facto
de alguém ter chamado prostitutas
às doze prostitutas suas amigas,
envolveram-se de imediato em longas horas frente
ao espelho,
compondo fato e gravata, cabelo,
e experimentando diversas roupas, de modo
a escolherem, como qualquer assassino elegante,
as que melhor ficariam com o sangue.
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Eram doze valentes e doze cobardes
que ali iam,
sendo apenas doze homens no total. E isto porque
cada homem tem, de modo telegráfico, as duas faces:
tem medo e mete medo.
Um homem unilateralmete corajoso não existe,
a não ser que seja unilateralmente pouco inteligente.
É que o raciocínio começa no abc de estar vivo:
quando vês o abismo alto, deves afastar-te cuidadosamente.
Eis tudo. Ou quase.
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E houve um deles que falou.
Disse que tinha tanta curiosidade
por conhecer países estrangeiros
que, mesmo sem viajar, há mais de dez anos que
não deixava de se obrigar a mudar hábitos alimentares,
móveis de cozinha,
vestimentas, horáriaos de acordar e adormecer
e outras miudezas— como religião,
leis e língua —, de modo a simular,
sem sair do sítio,
as múltiplas viagens que poderia fazer
se para calçar os sapatos
tivesse paciência.
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Mas não poupemos na brutalidade quando ela elucida
— disse o velho, o contador da história —,
só há um instante em que se tem realmente
os sapatos apertados: é quando o corpo
balança enforcado numa árvore; o resto são
pequenos incómodos. As extremidades
incham, como o próprio nome indica, apenas
em situações extremas, e uma vida tranquila e
burguesa não tem, ao longo de setenta anos,
nenhuma extremidade: é feita de centro e esse centro
é feito de nada.
Gonçalo M. Tavares, Uma Viagem à Índia, Caminho