Contou-me um amigo que, no fim-de-semana prolongado de Carnaval (a empresa onde trabalha foi uma das trezentas e vinte e cinco mil quatrocentas e vinte sete que não respeitou a ordem do governo sobre o fim da tolerância de ponto) decidiu partir para o campo e fazer uma greve geral a tudo o que fosse notícia. Nem jornais, nem televisão, nem rádio, nem internet, nem telemóvel. Nada. Apetrechou-se de livros e de música e partiu. E chegou. E instalou-se. E saboreou o que havia para saborear: lambuzou-se de leitura, de música, de lareira, de gastronomia, de natureza, de paisagem, de esplanada, de cabrinhas, de ovelhinhas, de convívio com homens e mulheres que não têm coelho, nem relvas, nem gaspar, nem portas, nem crato no apelido, e só têm a preocupação de fazer bem o seu trabalho e de ser amigos e hospitaleiros.
O meu amigo sentiu-se noutro país. Acreditou que estava noutro país. E desejou não ter de regressar à cidade. E de não ter de regressar às notícias do que dizem e fazem os coelho, os relvas, os gaspar, os portas, os crato e outros do mesmo género (os sousa, as rodrigues, os silva, os martins...)
Por momentos, o meu amigo pensou que era possível viver num Portugal liberto de gente com aqueles apelidos e nomes próprios nossos conhecidos.
Ontem encontrei-o. Já não pensa assim. Decidiu emigrar.