quarta-feira, 11 de maio de 2011

Às quartas

DESCENDENTE

Não há quadros dos meus antepassados
nem livro de família,
não conheço os seus legados,
suas faces, almas, vida.

Mas sinto pulsar o ancestral,
nómada, impetuoso sangue.
Furioso, desperta-me do sono nocturno,
encaminhando-me ao primeiro pecado.

Talvez a minha bisavó de negros olhos,
calças de seda e turbante,
tenha fugido a meio da noite
com algum louro khan estrangeiro

Talvez o trotar dos cavalos tenha ressoado
pelas planícies do Danúbio
e o vento, encobrindo seus vestígios,
os tenha salvo do vingador punhal.

Talvez por isso tanto ame
a estepe inatingível ao olhar,
o intempestivo voo dos cavalos
e a livre voz do vento

Talvez seja falsa e pérfida
e pelo caminho me dome,
sou na realidade tua filha,
minha consanguínea mãe — terra.

Elissavéta Bagriana

(Trad.: Vítor Tiago / J.C. González)