1 - Nos anos oitenta do século passado deu-se um acontecimento curioso. Na Itália de então, e perante a “incapacidade” (perceberam as aspas, claro) dos sindicatos em dar resposta às reivindicações dos trabalhadores, estes resolveram organizar-se espontânea e autonomamente, criando as COBRAS (Comissionnes…). Procuravam, desse modo, furar o cerco do poder político/económico e ultrapassar a paralisia sindical. Ora, passados uns dias de agitação, e vendo que não havia desmobilização, Aldo Moro, primeiro-ministro de então, fez uma “comunicação ao país”, admoestando os sindicatos e exigindo que estes “assumissem as suas responsabilidades”. O que eles fizeram, claro. E como? Colocando-se à cabeça das lutas … e traindo-as a seguir.
Quem, na altura, estava atento, e tinha idade para isso, é evidente, viu perfeitamente que o papel dos sindicatos já não era mais o de organizações de luta, mas, pelo, contrário, o de “bombeiros”, sempre prontos a apagar os fogos sociais, e se possível logo no início.
2 – Ora a notícia que vem no “Expresso” (do Balsemão socrático, diga-se), e que o Mário refere, é paradigmática quanto às relações entre os sindicatos e o poder. De facto, não há fronteira entre uns e outros, e, independentemente da veracidade do pormenor, a narrativa encaixa-se perfeitamente na ideia com que os professores “menos auto-cegos” ficaram da actuação dessa gente nos últimos tempos. A realidade é que eles se movimentam à vontade nos corredores dos palácios, e isso porque já deram aos governos-patrões todas as garantias de que podiam contar com eles para os fogos que ardem agora e para aqueles que se avizinham. Por isso, cada vez que os virmos a “criticar” o governo já sabemos que nova encenação se está a preparar e que o acordo já está feito, redigido e assinado.
3 – Todavia, o novelo não se esgota aqui. E isso porque, com manifestações combinadas por sms, mailes e telefonemas, o poder dos sindicatos foi posto em causa e a sua desnecessidade tornava-se evidente. E, não sendo úteis, seriam varridos por aqueles que neles mandavam. Assim, era também necessário que mostrassem que eram capazes de (re)tomar as rédeas das lutas (era o seu futuro que estava em jogo) (e se calhar tinham que vir trabalhar, alguns deles pela primeira vez na vida), o que, com a nossa incapacidade (de momento) de utilizarmos o poder que tínhamos nas mãos, conseguiram. Mas a traição ficou clara aos olhos de todos.
4 – Acabou tudo? Quem sabe de História sabe também que as coisas não acabam assim (só nos filmes). Neste momento, os professores estão ainda a digerir tudo o que se passou. Os mais depressivos choram a oportunidade perdida. Mas os optimistas têm a noção de que nada será igual, depois do 8 de Março.
Outra era começou. Dura, é verdade, mas sem cortinas de fumo.
5 - Ah, é verdade: dessindicalizei-me (23 anos depois). Já era tempo!