sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Novas Oportunidades (1)

A Iniciativa Novas Oportunidades foi, no domínio da Educação, a menina dos olhos de Sócrates. As razões que explicam o facto de esta iniciativa ter obtido tão elevada consideração da parte do ex-primeiro-ministro foram, penso eu, as seguintes: 
i) A Iniciativa Novas Oportunidades constituía uma forma rápida e supostamente eficaz de resolver um problema gravíssimo: a falta de formação e de qualificação de uma parte muito significativa dos portugueses; 
ii) A Iniciativa Novas Oportunidades constituía, do ponto de vista estatístico, uma forma rápida e eficaz de nos aproximarmos da média europeia no índices relativos à qualificação da população; 
iii) A Iniciativa Novas Oportunidades constituía uma estratégia que reunia aspectos irresistíveis para Sócrates: conforme o projecto estava delineado, havia quase a garantia de que o investimento teria os primeiros resultados visíveis a breve prazo (três, quatro anos — o que em Educação é um prazo curtíssimo); era um projecto com elevadíssimas potencialidades eleitorais (dar qualificação, num abrir e fechar de olhos, a mais de um milhão de portugueses seria uma fortíssima arma eleitoral); e, por fim, o projecto coadunava-se com o modo de ser e de estar de Sócrates: com pouco esforço, sem sacrifícios de longo prazo, é possível obter o que se pretende (a filosofia de vida do ex-primeiro-ministro).

A reunião de tantos atractivos num só projecto fez da Iniciativa Novas Oportunidades uma espécie de Eldorado da política educativa de Sócrates. E ao mesmo tempo que se idolatrava o novo paradigma educativo, a nível da formação de adultos, que as Novas Oportunidades diziam corporizar, decretava-se a morte do anterior modelo: o ensino recorrente. 
Recordo-me bem, aquando da criação e divulgação pública da Iniciatva Novas Oportunidades, de ter ouvido, na rádio, uma das responsáveis deste projecto. E fiquei muito impressionado. Fiquei impressionado, em primeiro lugar, com a facilidade e com a arrogância com que esta responsável foi capaz de dizer o pior que se podia imaginar sobre os cursos nocturnos do ensino recorrente, ainda, na altura, plenamente em vigor. Reduziu a nada a sua valia, denominou-os de cursos estúpidos, porque completamente desadequados à formação de adultos. Desde os antigos cursos CCL às várias versões de ensino recorrente que se foram sucedendo ao longo de muitos e muitos anos, nada se aproveitava. Estes cursos que formaram milhares de alunos, hoje licenciados e a exercem as mais diversas profissões: advocacia, engenharias, ensino, relações públicas, etc., etc., foram, no discurso daquela responsável, transformados em pó. 
Fiquei impressionado, em segundo lugar, com a ininterrupta torrente de elogios dirigida ao novo modelo de formação de adultos designado de Iniciativa Novas Oportunidades. As virtudes eram múltiplas, óbvias e incontestáveis. As qualidades enumeradas eram tantas e de tamanha valia que só uma conclusão era possível tirar: tinha sido encontrada a fórmula perfeita para se ministrar a educação a adultos — seria agora interessante recuperar esta entrevista, dada à TSF, e confrontar o seu conteúdo com o que a realidade nos tem revelado neste domínio.

Contudo, e independentemente da desonestidade política com que Sócrates se agarrou ao projecto Iniciativa Novas Oportunidades e da desmedida arrogância com que alguns dos seus responsáveis a apresentaram e implementaram, julgo que valeria a pena realizar um estudo sério sobre este projecto: proceder-se à análise dos seus pressupostos educativos e pedagógicos, escrutinar os seus objectivos e avaliar o modo como foi e está a ser concretizado. Muito para além da rasca demagogia política que de todos os lados foi feita sobre esta matéria, a Iniciativa Novas Oportunidades parece-me ser um bom motivo para se debaterem conceitos essenciais sobre a Educação.
Sem pretensão de qualquer ordem, e à medida que o tempo mo possibilitar, procurarei deixar, nas próximas semanas, alguns apontamentos dispersos que fui guardando sobre este assunto.