quarta-feira, 27 de abril de 2011

Aloilei?

Tenho cada vez mais dificuldade em distinguir o sonho da realidade, ou, melhor, o pesadelo da realidade. A espantosa realidade das coisas, de que falava um dos nossos poetas, começa também a ser a minha descoberta de todos os dias, mas, diferentemente do que se passava com ele, essa realidade não me alegra nem me basta, pelo contrário, deixa-me boquiaberto e com dúvidas sobre minha saúde mental. 
Na verdade, o que diariamente vejo e oiço não deixa grandes saídas: ou fui eu que aloilei (que é um verbo que não existe, mas que a partir de hoje passa a existir) ou é aquela gente que aparece a politicar na televisão que aloilou
Neste momento, já não é apenas Sócrates que, no âmbito das ciências da psique, será um estudo de caso, também quem o rodeia terá de ser objecto de um estudo da mesma natureza: não é normal que um tipo que descolou da realidade, que vive num castelo nos arredores de Júpiter, consiga juntar tanto homem e mulher à sua volta para o aplaudir e idolatrar. Sabe-se que o desejo de poder é capaz de colocar a coluna vertebral em posições pouco ortodoxas, todavia, imagino que mesmo para a satisfação desse desejo haja limites no contorcionismo. Portanto, ou fui eu que aloilei, ou foram aqueles tipos que o adoram e que aceitaram candidatar-se a deputados sob a sua liderança que aloilaram. Estes e mais os trinta e tal por cento de portugueses que, nas sondagens, dizem ter intenções de votar no indivíduo que nos conduziu ao momento áureo que vivemos.
Contudo, para ser razoável, devo admitir que é mais provável ser eu o aloilado do que ser o povo que nele quer votar e a elite que nele vota e nele se revê. 
Compreendo agora por que razão ando a ver troikas por todo o lado, por que razão ando a ver o défice subir de quinze em quinze dias, por que razão oiço vozes a sussurrarem-me default, por que razão desconfio que me querem ir ao bolso nas férias e no Natal: eu vejo e imagino e oiço tudo isto porque  aloilei
Mas ainda bem que fui eu que aloilei, porque com mais um aloilado Portugal ainda aguenta. Agora, se fossem os trinta e tal por cento dos portugueses, mais as dezenas de cabeças de lista do PS, mais as centenas de candidatos a deputados do PS, mais os milhares de militantes do PS a aloilarem é que o problema seria grave e preocupante.
Estou aloilado, porém, descansado, porque, afinal, o país está bem, não aconteceu nada, ninguém é responsável por nada e Sócrates até já pode ser reeleito.