Defender a realização de exames nacionais a todas as disciplinas, no final de cada ciclo de estudos e no ano terminal de todas as disciplinas, com peso determinante para a aprovação do aluno, implica considerar que estas provas são particularmente fiáveis e credíveis. Ou melhor, implica considerar que através destas provas se avalia um aluno de modo mais fiável e credível do que através da avaliação que é feita pelos professores desse aluno no decurso de um ou mais anos lectivos. Caso contrário, não seria coerente propognar pela sua universalização e pelo seu carácter decisório.
A tese da superior fiabilidade dos exames pretende gerar na consciência individual dos alunos e dos pais e na consciência colectiva da população a ideia de que as classificações mais altas nos exames nacionais são necessariamente obtidas pelos melhores alunos, e de que os exames nacionais são a efectiva prova real que nos permite saber quem é verdadeiramente um bom aluno. Decorre daqui a convicção de que os exames nacionais mostram, de facto, quem está melhor capacitado para prosseguir estudos e quem merece efectivamente entrar no ensino superior.
Deste modo, um aluno que obtenha uma nota elevada num exame nacional é referido como um exemplo a seguir; um aluno que obtenha uma nota mediana é referido como um aluno mediano. Se este aluno obteve na classificação interna uma nota alta e no exame nacional uma nota significativamente mais baixa, infere-se imediatamente uma, duas ou três coisas: durante o ano, o professor avaliou mal o aluno; e/ou o professor preparou mal o aluno; e/ou o aluno é psicologicamente fraco, não aguenta o stress, e, por isso, não está preparado para a vida. O senso comum pensa assim e os alunos são induzidos a pensar e a sentir assim. Os teóricos que defendem o exame nacional como o arquétipo dos instrumentos de avaliação também é isto que dão a entender.
Deste modo, um aluno que obtenha uma nota elevada num exame nacional é referido como um exemplo a seguir; um aluno que obtenha uma nota mediana é referido como um aluno mediano. Se este aluno obteve na classificação interna uma nota alta e no exame nacional uma nota significativamente mais baixa, infere-se imediatamente uma, duas ou três coisas: durante o ano, o professor avaliou mal o aluno; e/ou o professor preparou mal o aluno; e/ou o aluno é psicologicamente fraco, não aguenta o stress, e, por isso, não está preparado para a vida. O senso comum pensa assim e os alunos são induzidos a pensar e a sentir assim. Os teóricos que defendem o exame nacional como o arquétipo dos instrumentos de avaliação também é isto que dão a entender.
Contudo, a proposição que afirma que o exame nacional é o instrumento de avaliação mais fiável que existe é uma proposição falsa. Em abstracto, e do ponto de vista técnico, o exame nacional enferma de todas as deficiências de que uma prova sumativa realizada a nível de turma enferma, mas tem outras graves debilidades acrescidas, das quais se podem salientar:
i) o exame nacional é inevitavelmente um instrumento de avaliação desvinculado do processo de ensino-aprendizagem ocorrido em cada escola, em cada turma e em cada ano ou anos lectivos, o que tem, do ponto de vista avaliativo, várias consequências negativas que não podem ser ignoradas;
ii) como referi no texto da semana anterior, o exame nacional, com peso determinante para a aprovação, é o único instrumento de avaliação cujas limitações e insuficiências são inultrapassáveis e as suas consequências são irreversíveis, para o aluno — enquanto que a multiplicidade de instrumentos de avaliação susceptíveis de utilização no decurso de um ano lectivo possibilita que as insuficiências e as limitações inerentes a cada instrumento de avaliação possam ser minimizadas, através da sua complementaridade, o exame nacional não permite essa possibilidade, se, repito, tiver uma ponderação decisiva na classificação final do aluno;
iii) um exame nacional decisório para a aprovação ou reprovação consente que, de forma potencialmente muito significativa, se imiscua no processo de avaliação um elemento completamente espúrio ao objecto dessa avaliação: o desequilíbrio emocional que a consciência do carácter decisivo da prova potencialmente gera. (Sobre o argumento que defende o valor alegadamente educativo deste desequilíbrio, falarei em texto posterior);
iv) o exame nacional tem inerente a si outra conhecida debilidade grave: a impossibilidade de serem ultrapassadas as grandes discrepâncias classificativas entre as centenas (ou milhares, depende da dimensão do país) de professores classificadores, cujas consequências não podem ser ignoradas e muito menos escondidas.
Estas são algumas das deficiências específicas de que os exames nacionais enfermam. Todavia, há um outro elemento singular que deve ser referido: estas provas pareceriam usufruir, a priori, de uma óbvia vantagem relativamente às provas realizadas a nível de turma ou escola. Esta vantagem consistiria no facto de serem provas elaboradas por professores especialmente dedicados a esta função. Contudo, nem esta presumida mais-valia é inteiramente confirmada pelos factos: basta lembrar as infindáveis polémicas e as inúmeras gafes técnicas que invariavelmente são suscitadas e detectadas na realização dos exames nacionais. Não deve haver um ano em que não se discuta se os exames foram demasiado fáceis ou demasiado difíceis, e não deve haver um ano em que não sejam detectados erros técnicos: perguntas mal ou deficientemente formuladas. Nem neste ponto, em que o rigor e a fiabilidade pareceriam garantidos, existe a confirmação que se esperaria.
iii) um exame nacional decisório para a aprovação ou reprovação consente que, de forma potencialmente muito significativa, se imiscua no processo de avaliação um elemento completamente espúrio ao objecto dessa avaliação: o desequilíbrio emocional que a consciência do carácter decisivo da prova potencialmente gera. (Sobre o argumento que defende o valor alegadamente educativo deste desequilíbrio, falarei em texto posterior);
iv) o exame nacional tem inerente a si outra conhecida debilidade grave: a impossibilidade de serem ultrapassadas as grandes discrepâncias classificativas entre as centenas (ou milhares, depende da dimensão do país) de professores classificadores, cujas consequências não podem ser ignoradas e muito menos escondidas.
Estas são algumas das deficiências específicas de que os exames nacionais enfermam. Todavia, há um outro elemento singular que deve ser referido: estas provas pareceriam usufruir, a priori, de uma óbvia vantagem relativamente às provas realizadas a nível de turma ou escola. Esta vantagem consistiria no facto de serem provas elaboradas por professores especialmente dedicados a esta função. Contudo, nem esta presumida mais-valia é inteiramente confirmada pelos factos: basta lembrar as infindáveis polémicas e as inúmeras gafes técnicas que invariavelmente são suscitadas e detectadas na realização dos exames nacionais. Não deve haver um ano em que não se discuta se os exames foram demasiado fáceis ou demasiado difíceis, e não deve haver um ano em que não sejam detectados erros técnicos: perguntas mal ou deficientemente formuladas. Nem neste ponto, em que o rigor e a fiabilidade pareceriam garantidos, existe a confirmação que se esperaria.
Os exame nacionais não são um exemplo de rigor nem de fiabilidade, ao contrário do que alguns querem fazer crer. Os exames nacionais vivem de uma aparência de credibilidade que, de facto, não possuem.
Nos próximos textos, procurarei recordar alguns aspectos concretos relativos aos exames nacionais cuja relevância é, do meu ponto de vista, decisiva para se discordar do fundamentalismo que defende a universalização e o carácter decisório destas provas.