quarta-feira, 23 de maio de 2012

Empreendedorismo

Soubemos há dias que começam a existir bares a vender copos de água da torneira a 50 cêntimos. Houve quem protestasse, houve quem insultasse, houve quem chamasse a polícia, houve quem ligasse para a ASAE. Do meu ponto de vista, não procederam bem. O comportamento correcto e adequado à circunstância deveria ter sido o elogio e o incentivo. Na verdade, vender copos de água da torneira é um exemplo de empreendedorismo, de inovação e de criatividade. Segundo as elites que nos governam, na política e na economia, é justamente no empreendedorismo, na inovação e na criatividade que temos de investir. Passos Coelho não se cansa de repetir que a crise e o desemprego são momentos de oportunidade. Ora, dar de beber a quem tem sede sem a respectiva retribuição é um arcaísmo, a juntar aos outros arcaísmos que uns maduros ineptos e inadaptados incomprensivelmente teimam em lembrar, como é, por exemplo, aquela coisa — para não chamar «coiso» — dos direitos adquiridos, ou aquela coisa de ser solidário, ou a outra coisa da igualdade, ou a coisa da solidariedade. O arcaísmo deve pois ser substituído pela oportunidade: quem quer beber água paga, não interessa a origem do líquido. Aliás, não se compreende a contestação: o princípio do utilizador-pagador já há muito que devia estar universalizado, não há razão para que ele fosse aplicado apenas às ex-SCUT. 
Deste modo, o acto de cobrar 50 cêntimos por um copo de água não deve ser visto como uma forma grosseira de ganhar dinheiro, até porque, provavelmente, é também uma intenção ecológica que está presente nessa cobrança: trata-se, no fundo, de uma taxa moderadora para travar o consumo excessivo de água da torneira.
Empreendedorismo, inovação e consciência ecológica num copo de água da torneira. De modo idêntico ao desemprego, a água é uma boa oportunidade.