sábado, 26 de fevereiro de 2011

Ao sábado: momento quase filosófico

MANDEM ENTRAR OS CLONES
«Se a vida acelerada parece demasiado cansativa, pensemos na técnica biológica mais sexual — se bem que totalmente assexuada — para a imortalidade através da não-morte: clona-te. Na verdade, clona-te, mas clona-te enquanto fores jovem; depois, à medida que vais envelhecendo, repete o processo vezes sem conta, ad infinitum.
De todos os projectos biotécnicos para criar seres humanos imortais, a clonagem humana não só parece eminentemente possível a curto prazo, como pode muito bem já ter acontecido, apesar de ninguém dizer. (porque é ilegal.) O que é certo é que a técnica, conhecida por transferência nuclear de células somáticas, já produziu a ovelha Dolly.
Eis como funciona a clonagem: o citoplasma (a matéria entre o núcleo e as membranas celulares) é removido de um óvulo da célula dadora; em seguida, introduz-se outra célula com o material genético que será clonado no óvulo original. E pronto! Está no forno uma cópia idêntica do original.
Um motivo que nos leva a crer que a clonagem humana é possível é que ela já acontece frequentemente na natureza: gémeos idênticos. Os gémeos idênticos são produzidos quando um único óvulo fertilizado se divide em duas pessoas com ADN idêntico. Só são confundidos com gémeos dizigóticos (dois óvulos diferentes que são fertilizados separadamente mas nascem do mesmo útero ao mesmo tempo) por pessoas como Merle Haggar, que, ao responder à pergunta sobre se os seus sobrinhos gémeos eram idênticos, declarou: "Um é idêntico, mas o outro não se parece com ninguém". [...]
Mas será que a clonagem cria uma réplica perfeita do original? Perguntem a uma gémea idêntica natural: ela não se vê como a mesma pessoa que a sua cópia exacta de ADN. Teve influências diferentes no desenvolvimento da sua personalidade; tem recordações diferentes, pontos de referência diferentes; estabeleceu contactos diferentes, encontrou significados diferentes. Na psicologia do desenvolvimento, isto proporciona um modelo experimental fascinante para investigar o velho "natureza versus educação", como casal de psicólogos do desenvolvimento que teve gémeos: a um chamaram João e ao outro Controlo.
Então, serão os gémeos idênticos assim tão idênticos? Nem por isso. Pelo menos não naquelas situações críticas em que um observador externo não consegue distinguir um do outro.
Reggie casou com uma gémea idêntica. Menos de um ano depois, pediu o divórcio.
— Muito bem — disse o juiz —, diga ao tribunal por que é que quer o divórcio.
— Bem, meretíssimo — começou Reggie. — De vez em quando a minha cunhada vinha visitar-nos e, como ela e a minha mulher são tão idênticas, de vez em quando fazia amor com ela por engano.
— Seguramente, deve haver alguma diferença entre as duas mulheres — disse o juiz.
— Ah pois há uma diferença, meretíssimo. É por isso que quero o divórcio — replicou ele.»
Thomas Cathcart, Daniel Klein, Heidegger e um Hipopótamo Chegam às Portas do Paraíso, pp. 228-230.