«O principal target da governação ficou concluído pouco mais de um mês depois da tomada de posse [aprovação da resolução que criou o Sistema de Acompanhamento dos Projectos de Potencial Interesse Nacional (PIN) - cf. Retrato nº 13. O "Freeport" não se repetiria mais, pelo menos nos mesmos moldes]. Foi obra digna de monta. Mas não ficou por aqui. Três anos depois, já no início da recta final do seu mandato, em 30 de Junho de 2008, o governo aprovou dois decretos para a simplificação dos procedimentos administrativos em relação aos PIN's, agilizando ainda mais a possibilidade de construção de grandes empreendimentos em zonas proibidas pela legislação geral, nomeadamente Rede Natura, Reserva Ecológica Nacional e Reserva Agrícola Nacional.
O "homem" e o "líder" são como a natureza: têm horror ao vazio. A permanente sensação de concretização tem de estar em marcha. A fúria realizadora, ainda que muitas vezes só no papel, também fez o seu caminho no início. A presença constante nos media chegou a impressionar, tanto ou mais que o tratamento preferencial que a televisão pública sempre lhe concedeu, com o maior descaramento.
A governação passou a ser uma gigantesca ilusão, com truques e mais truques, como se de 'crimes' perfeitos se tratassem. Por vezes, nem havia tempo para os assimilar. Quando se começava a analisar um, já estavam cá fora mais uns tantos. Tudo a um ritmo estonteante. O efeito de paralisação das entidades com responsabilidades no escrutínio da actividade governamental foi evidente.
Mas a pérola do início da governação ainda foi mais requintada. Ainda durante o ano de 2005, José Sócrates consegue uma proeza extraordinária. Uma comissão — e não o Banco de Portugal — liderada por Vítor Constâncio elaborou um relatório 'independente' que estimou o défice na casa dos 6,83%. O ministro das Finanças, Luís Campos e Cunha, deu a triste notícia, em 23 de Maio de 2005: " A situação orçamental é, portanto, mais difícil do que então se esperava". De imediato, José Sócrates anunciou o aumento dos impostos. E convocou um conselho de ministros extraordinário para discutir as medidas adoptar. Perfeito! Foi o álibi para faltar a uma das suas principais promessas eleitorais: não aumentar os impostos. O paradigma da governação estava criado. [...]
A encenação foi de tal dimensão, e tão amplamente conseguida, que José Sócrates não só aumentou os impostos como também deu a maior paulada de que há memória nas garantias sociais. A reforma da Segurança Social não foi nem mais nem menos do que um fartar de cessação de direitos adquiridos, nomeadamente em relação às reformas e ao subsídio de desemprego, entre outros como os subsistemas de saúde. [...] Com uma campanha feroz, que explorou a ignorância militante dos portugueses em relação à história europeia, e que se sustentou no risco de "Portugal ser alvo de um procedimento por défice excessivo", como se fosse uma situação ímpar na União Europeia, José Sócrates conseguiu de uma penada fazer o mais difícil, sem que a contestação atingisse proporções difíceis de controlar. [...]
Este início ao jeito de buldozer, mas não menos assustador, não alterou a percepção dos principais opinion makers. Nem tão pouco resultou numa quebra de popularidade. Os portugueses estão habituados ao sacrifício, uma espécie de hábito salazarento que ainda por cima os inibe de protestar em tempo útil. Era preciso apertar o cinto, então tinha de se apertar o cinto. Ponto final! »
O "homem" e o "líder" são como a natureza: têm horror ao vazio. A permanente sensação de concretização tem de estar em marcha. A fúria realizadora, ainda que muitas vezes só no papel, também fez o seu caminho no início. A presença constante nos media chegou a impressionar, tanto ou mais que o tratamento preferencial que a televisão pública sempre lhe concedeu, com o maior descaramento.
A governação passou a ser uma gigantesca ilusão, com truques e mais truques, como se de 'crimes' perfeitos se tratassem. Por vezes, nem havia tempo para os assimilar. Quando se começava a analisar um, já estavam cá fora mais uns tantos. Tudo a um ritmo estonteante. O efeito de paralisação das entidades com responsabilidades no escrutínio da actividade governamental foi evidente.
Mas a pérola do início da governação ainda foi mais requintada. Ainda durante o ano de 2005, José Sócrates consegue uma proeza extraordinária. Uma comissão — e não o Banco de Portugal — liderada por Vítor Constâncio elaborou um relatório 'independente' que estimou o défice na casa dos 6,83%. O ministro das Finanças, Luís Campos e Cunha, deu a triste notícia, em 23 de Maio de 2005: " A situação orçamental é, portanto, mais difícil do que então se esperava". De imediato, José Sócrates anunciou o aumento dos impostos. E convocou um conselho de ministros extraordinário para discutir as medidas adoptar. Perfeito! Foi o álibi para faltar a uma das suas principais promessas eleitorais: não aumentar os impostos. O paradigma da governação estava criado. [...]
A encenação foi de tal dimensão, e tão amplamente conseguida, que José Sócrates não só aumentou os impostos como também deu a maior paulada de que há memória nas garantias sociais. A reforma da Segurança Social não foi nem mais nem menos do que um fartar de cessação de direitos adquiridos, nomeadamente em relação às reformas e ao subsídio de desemprego, entre outros como os subsistemas de saúde. [...] Com uma campanha feroz, que explorou a ignorância militante dos portugueses em relação à história europeia, e que se sustentou no risco de "Portugal ser alvo de um procedimento por défice excessivo", como se fosse uma situação ímpar na União Europeia, José Sócrates conseguiu de uma penada fazer o mais difícil, sem que a contestação atingisse proporções difíceis de controlar. [...]
Este início ao jeito de buldozer, mas não menos assustador, não alterou a percepção dos principais opinion makers. Nem tão pouco resultou numa quebra de popularidade. Os portugueses estão habituados ao sacrifício, uma espécie de hábito salazarento que ainda por cima os inibe de protestar em tempo útil. Era preciso apertar o cinto, então tinha de se apertar o cinto. Ponto final! »
Rui Costa Pinto, José Sócrates - o Homem e o Líder, Exclusivo Edições, pp. 116-118.