Os sindicatos de professores que temos são maus. Do meu ponto de vista, são maus porque seguem uma política sindical vinculada aos interesses e às estratégias partidárias. São maus porque, verdadeiramente, nunca acreditam na capacidade e na força daqueles que representam. São maus porque alguns sindicalistas, já sedimentados em anos e anos de rotina sindical, cedem aos interesses da manutenção do statu quo que garante horários privilegiados ou mesmo isenção de horário, que lhes dá acesso a certos meios, contactos, deferências, mordomias e protagonismos que, de outro modo, não teriam.
A combinação destes factores determina que tenhamos um sindicalismo docente que não cumpre as funções para o qual foi criado. Pior: não só não cumpre como acaba por gerar o descrédito nas próprias instituições sindicais. É frequente, por isso, ouvirmos, em relação aos sindicatos, epítetos idênticos àqueles que ouvimos em relação aos políticos. Os sindicalistas, contudo, sentem-se possuídos de uma superioridade moral tal que, pensam eles, os deveria isentar da censura e até mesmo da crítica. É por essa razão que, sempre que são confrontados com o escrutínio de quem deles diverge, reagem como alguém que foi ofendido na honra e, não discutindo os argumentos que sustentam a crítica, optam por apelidar os que os interpelam de: divisionistas, irrealistas, zurzidores ao serviço do Governo e por aí fora (há quem, neste país, se considere sempre possuído do direito da crítica, mas isento do dever de ouvir a objecção alheia - os sindicalistas são disso um exemplo, todavia, bem acompanhados, quer por jornalistas quer por juízes.)
Mas estava eu a dizer que temos maus sindicatos, e isto tem uma consequência objectiva: a resolução dos verdadeiros problemas profissionais, cuja existência é a razão de ser dos próprios sindicatos, é relegada para plano secundário, é esquecida sempre que se atinge um elevado patamar de conflitualidade. Nesses contextos de conflito aberto e radicalizado predomina sempre aquilo que, estrategicamente, é mais conveniente ao partido que domina o sindicato x ou y. Sempre foi assim, e este último ano de luta dos professores não fugiu à regra.
Depois de uma primeira manifestação de 100 mil professores, depois de uma segunda manifestação de 120 mil professores, depois de duas greves nacionais cuja adesão foi superior a 90%, os sindicatos malbarataram toda esta imensa força - uma força que nunca na história do sindicalismo português uma classe profissional tinha demonstrado possuir e que se manteve viva durante um ano (facto para o qual muito contribuiu a mais que meritória acção dos movimentos independentes de professores).
Foi, certamente, um momento único, propiciado por uma relação de causa-efeito difícil de repetir: uma equipa do Ministério da Educação que ultrapassou os limites imagináveis da incompetência - política e técnica - gerou uma gigantesca onda de indignação e de oposição que ninguém tinha suposto ser possível acontecer. E, de facto, não é plausível que o fenómeno venha a repetir-se, pois não é (felizmente) congeminável poder vir a constituir-se, no futuro próximo nem no longínquo, um grupo de secretários de Estado e ministro(a) tão manifestamente incapaz e que, simultaneamente, junte à incapacidade congénita uma inusitada grosseria e arrogância pessoais.
Ora, a gravidade extrema do conflito, atingida em Novembro do ano passado, só deveria ter tido uma saída: a demissão da ministra e a alteração da política educativa. Se a política fosse uma coisa séria e o sindicalismo docente estivesse exclusivamente ao serviço dos professores, só poderia ter sido este o desfecho da situação a que se chegou. Mas não foi. E não foi porquê? Porque não era justo, não era adequado, não era possível que assim tivesse sido? Todos sabemos que era justo, que tinha sido adequado e possível. Mas não aconteceu. Foram razões genuinamente sindicais que impediram que isso acontecesse? Foram razões de salvaguarda das justíssimas reivindicações dos professores? Sabemos que não. E que sabemos mais? Sabemos duas coisas:
1. Que a política não é séria. Que este Governo não é sério. Que este primeiro-ministro não é politicamente sério. Sabemos que este primeiro-ministro colocou o seu orgulho pessoal e a sua arrogância à frente dos verdadeiros interesses do país: recusou-se a fazer uma segunda remodelação governamental, depois de já ter substituído os ministros da Saúde e da Cultura. Apesar dos objectivos malefícios que a ministra da Educação diariamente produzia ao país, José Sócrates e o seu núcleo de conselheiros optaram pela chantagem: ou se negociava uma trapalhada qualquer que salvasse a face do Governo ou o Governo cairia. Não interessava nada o que os alunos, os professores, as escolas, o país ganhariam com a mudança da ministra e da política, interessava apenas manter uma posição intransigente que, em eleições antecipadas, até poderia render frutos;
2. Que, perante isto, os sindicatos optaram por recuar. Porquê? Porque não era do interesse de nenhum partido, em particular daqueles que dominam os principais sindicatos de professores, que o Governo caísse. Calculavam que, eleitoralmente, fosse mau. E como, do ponto de vista eleitoral, não era conveniente que isso acontecesse, hipotecou-se a resolução de um gravíssimo problema profissional, de um gravíssimo problema da Educação e do país aos interesses eleitorais. Os professores foram, uma vez mais, manipulados. O sindicalismo esteve, uma vez mais, ao serviço dos proveitos partidários.
Agora, convocaram uma manifestação para o dia 30 de Maio. Como estamos próximos de eleições, quer-se marcar o ponto e tentar lançar alguma perturbação eleitoral ao PS. Mas, do ponto de vista da nossa luta profissional, esta manifestação, desgarrada, isolada, é para alcançar o quê? É para fazerem com ela o quê? O mesmo que fizeram com as duas manifestações anteriores? Agora, marcaram também uma greve pífia de 90 minutos para o dia 26. Qual é o seu objectivo? Alguém consegue explicar?
Se vou à manifestação? Vou, claro. Apesar dos maus sindicatos que temos, temos algo ainda pior: um péssimo Governo e, em particular, uma ministra da Educação politicamente desprezível. Poderia eu ficar em casa no próximo dia 30? Não poderia.
A combinação destes factores determina que tenhamos um sindicalismo docente que não cumpre as funções para o qual foi criado. Pior: não só não cumpre como acaba por gerar o descrédito nas próprias instituições sindicais. É frequente, por isso, ouvirmos, em relação aos sindicatos, epítetos idênticos àqueles que ouvimos em relação aos políticos. Os sindicalistas, contudo, sentem-se possuídos de uma superioridade moral tal que, pensam eles, os deveria isentar da censura e até mesmo da crítica. É por essa razão que, sempre que são confrontados com o escrutínio de quem deles diverge, reagem como alguém que foi ofendido na honra e, não discutindo os argumentos que sustentam a crítica, optam por apelidar os que os interpelam de: divisionistas, irrealistas, zurzidores ao serviço do Governo e por aí fora (há quem, neste país, se considere sempre possuído do direito da crítica, mas isento do dever de ouvir a objecção alheia - os sindicalistas são disso um exemplo, todavia, bem acompanhados, quer por jornalistas quer por juízes.)
Mas estava eu a dizer que temos maus sindicatos, e isto tem uma consequência objectiva: a resolução dos verdadeiros problemas profissionais, cuja existência é a razão de ser dos próprios sindicatos, é relegada para plano secundário, é esquecida sempre que se atinge um elevado patamar de conflitualidade. Nesses contextos de conflito aberto e radicalizado predomina sempre aquilo que, estrategicamente, é mais conveniente ao partido que domina o sindicato x ou y. Sempre foi assim, e este último ano de luta dos professores não fugiu à regra.
Depois de uma primeira manifestação de 100 mil professores, depois de uma segunda manifestação de 120 mil professores, depois de duas greves nacionais cuja adesão foi superior a 90%, os sindicatos malbarataram toda esta imensa força - uma força que nunca na história do sindicalismo português uma classe profissional tinha demonstrado possuir e que se manteve viva durante um ano (facto para o qual muito contribuiu a mais que meritória acção dos movimentos independentes de professores).
Foi, certamente, um momento único, propiciado por uma relação de causa-efeito difícil de repetir: uma equipa do Ministério da Educação que ultrapassou os limites imagináveis da incompetência - política e técnica - gerou uma gigantesca onda de indignação e de oposição que ninguém tinha suposto ser possível acontecer. E, de facto, não é plausível que o fenómeno venha a repetir-se, pois não é (felizmente) congeminável poder vir a constituir-se, no futuro próximo nem no longínquo, um grupo de secretários de Estado e ministro(a) tão manifestamente incapaz e que, simultaneamente, junte à incapacidade congénita uma inusitada grosseria e arrogância pessoais.
Ora, a gravidade extrema do conflito, atingida em Novembro do ano passado, só deveria ter tido uma saída: a demissão da ministra e a alteração da política educativa. Se a política fosse uma coisa séria e o sindicalismo docente estivesse exclusivamente ao serviço dos professores, só poderia ter sido este o desfecho da situação a que se chegou. Mas não foi. E não foi porquê? Porque não era justo, não era adequado, não era possível que assim tivesse sido? Todos sabemos que era justo, que tinha sido adequado e possível. Mas não aconteceu. Foram razões genuinamente sindicais que impediram que isso acontecesse? Foram razões de salvaguarda das justíssimas reivindicações dos professores? Sabemos que não. E que sabemos mais? Sabemos duas coisas:
1. Que a política não é séria. Que este Governo não é sério. Que este primeiro-ministro não é politicamente sério. Sabemos que este primeiro-ministro colocou o seu orgulho pessoal e a sua arrogância à frente dos verdadeiros interesses do país: recusou-se a fazer uma segunda remodelação governamental, depois de já ter substituído os ministros da Saúde e da Cultura. Apesar dos objectivos malefícios que a ministra da Educação diariamente produzia ao país, José Sócrates e o seu núcleo de conselheiros optaram pela chantagem: ou se negociava uma trapalhada qualquer que salvasse a face do Governo ou o Governo cairia. Não interessava nada o que os alunos, os professores, as escolas, o país ganhariam com a mudança da ministra e da política, interessava apenas manter uma posição intransigente que, em eleições antecipadas, até poderia render frutos;
2. Que, perante isto, os sindicatos optaram por recuar. Porquê? Porque não era do interesse de nenhum partido, em particular daqueles que dominam os principais sindicatos de professores, que o Governo caísse. Calculavam que, eleitoralmente, fosse mau. E como, do ponto de vista eleitoral, não era conveniente que isso acontecesse, hipotecou-se a resolução de um gravíssimo problema profissional, de um gravíssimo problema da Educação e do país aos interesses eleitorais. Os professores foram, uma vez mais, manipulados. O sindicalismo esteve, uma vez mais, ao serviço dos proveitos partidários.
Agora, convocaram uma manifestação para o dia 30 de Maio. Como estamos próximos de eleições, quer-se marcar o ponto e tentar lançar alguma perturbação eleitoral ao PS. Mas, do ponto de vista da nossa luta profissional, esta manifestação, desgarrada, isolada, é para alcançar o quê? É para fazerem com ela o quê? O mesmo que fizeram com as duas manifestações anteriores? Agora, marcaram também uma greve pífia de 90 minutos para o dia 26. Qual é o seu objectivo? Alguém consegue explicar?
Se vou à manifestação? Vou, claro. Apesar dos maus sindicatos que temos, temos algo ainda pior: um péssimo Governo e, em particular, uma ministra da Educação politicamente desprezível. Poderia eu ficar em casa no próximo dia 30? Não poderia.