Há dias, ouvi, no banco, o diálogo que se segue, entre um rapaz e a funcionária que o atendia.
— Não chega — respondeu a funcionária do outro lado do balcão.
— Não chega? O Bilhete de Identidade não chega para provar que já tenho dezoito anos, que já sou de maioridade?! — espantou-se o jovem que estava ao meu lado.
— Não, não chega — insistiu a funcionária.
— Para além de eu estar aqui em carne e osso e de trazer o meu Bilhete de Identidade que indica a data do meu nascimento, que foi há mais de dezoito anos, que é que eu tenho de fazer mais para provar que sou de maioridade? Pode dizer-me? — perguntou ironicamente o rapaz.
— Para além do B.I., deve trazer o seu Cartão de Contribuinte...
— Mas o número de contribuinte já vocês o têm aí na ficha da minha conta. Sem o meu Cartão de Contribuinte não teria sido possível aos meus pais abrir esta conta em meu nome, quando eu era miúdo, e que agora quero movimentar — interrompeu o meu jovem vizinho de balcão.
— Sim, é verdade, nós temos aqui o seu número fiscal, mas tem de trazer o cartão. E, para além disso, ainda tem de trazer um comprovativo de morada e outro de ocupação — concluiu a bancária.
— Um comprovativo de morada? Que é isso? — inquiriu o rapaz, já a ferver.
— É um documento que indique qual é a sua morada, por exemplo: o recibo da EDP, da Água, do Gás, qualquer recibo em seu nome que tenha o endereço de sua casa — respondeu a funcionária.
— Mas eu ainda não saí de casa. Vivo com os meus pais. E, felizmente, os recibos vêm em nome deles, não em meu — disse ele, com um sorriso malandro.
— Então, tem de ir à Junta de Freguesia com o testemunho de duas pessoas ou de duas casas comerciais que comprovem que o senhor vive onde vive — disse a mulher.
— Portanto, para eu fazer a prova de que sou de maioridade, não chega eu trazer a minha pessoa comigo e trazer o meu B.I. Tenho de trazer também o Cartão de Estudante, Cartão de Contribuinte, que vocês já tiveram na mão e do qual têm todos os elementos, e, ainda, tenho de ir arranjar duas testemunhas, ir com elas à Junta de Freguesia, de modo a que esta me passe uma declaração a dizer que eu vivo onde vivo, e com essa declaração mais o B.I e mais o Cartão de Contribuinte e mais o Cartão de Estudante e mais a minha pessoa venho aqui novamente e mostro-vos tudo. Certo? — resumiu o jovem.
— Exactamente — anuiu ela.
— Não é mais nada? Veja lá! Não terei de ir ao notário ou à conservatória ou à secretaria da faculdade, ou à polícia? — perguntou ele.
— Há vários anos que é assim. São ordens do Banco de Portugal — finalizou a funcionária.
O rapaz, visivelmente maldisposto, desejou um bom dia aos presentes e foi, presumo eu, arranjar modo de provar que tem mais de dezoito anos.
Eu fiquei a pensar: rapaz ingrato. Não sabe a sorte que tem. Não sabe agradecer o facto de viver no tempo histórico do simplex socrático. É verdade que lhe pediram quatro documentos para provar o que um deles sozinho provava, mas, de outro ponto de vista, ele deveria ver que não lhe pediram a certidão de nascimento, não lhe pediram o registo criminal, não lhe pediram o certificado de robustez física, não lhe pediram análises ao sangue. Os jovens de hoje acham que é chegar e andar. Não é assim. Calma! Se não sabe do cartão de contribuinte, vai às Finanças pedir outro, e fica com entretenimento para o dia inteiro. Se precisa de testemunhas e de um documento da Junta de Freguesia, aproveita a circunstância e desenvolve o convívio social e, de seguida, aprofunda o conhecimento das instituições autárquicas.
Por outro lado, o jovem devia dar graças aos deuses por termos o Banco de Portugal que temos. Se para se provar a maioridade há esta exigência, este rigor, esta absoluta ausência de facilitismo, imagine-se a exigência, o rigor e o controlo que o Banco de Portugal não terá com a fiscalização dos bancos e das suas operações. Deve ser um rigor! Deve ser uma exigência!
Imagino como os banqueiros, ao longo destes anos, devem ter temido a fiscalização do Banco de Portugal!
É pena é que o rapaz não valorize nada disto.
— Não chega — respondeu a funcionária do outro lado do balcão.
— Não chega? O Bilhete de Identidade não chega para provar que já tenho dezoito anos, que já sou de maioridade?! — espantou-se o jovem que estava ao meu lado.
— Não, não chega — insistiu a funcionária.
— Para além de eu estar aqui em carne e osso e de trazer o meu Bilhete de Identidade que indica a data do meu nascimento, que foi há mais de dezoito anos, que é que eu tenho de fazer mais para provar que sou de maioridade? Pode dizer-me? — perguntou ironicamente o rapaz.
— Para além do B.I., deve trazer o seu Cartão de Contribuinte...
— Mas o número de contribuinte já vocês o têm aí na ficha da minha conta. Sem o meu Cartão de Contribuinte não teria sido possível aos meus pais abrir esta conta em meu nome, quando eu era miúdo, e que agora quero movimentar — interrompeu o meu jovem vizinho de balcão.
— Sim, é verdade, nós temos aqui o seu número fiscal, mas tem de trazer o cartão. E, para além disso, ainda tem de trazer um comprovativo de morada e outro de ocupação — concluiu a bancária.
— Um comprovativo de morada? Que é isso? — inquiriu o rapaz, já a ferver.
— É um documento que indique qual é a sua morada, por exemplo: o recibo da EDP, da Água, do Gás, qualquer recibo em seu nome que tenha o endereço de sua casa — respondeu a funcionária.
— Mas eu ainda não saí de casa. Vivo com os meus pais. E, felizmente, os recibos vêm em nome deles, não em meu — disse ele, com um sorriso malandro.
— Então, tem de ir à Junta de Freguesia com o testemunho de duas pessoas ou de duas casas comerciais que comprovem que o senhor vive onde vive — disse a mulher.
— Portanto, para eu fazer a prova de que sou de maioridade, não chega eu trazer a minha pessoa comigo e trazer o meu B.I. Tenho de trazer também o Cartão de Estudante, Cartão de Contribuinte, que vocês já tiveram na mão e do qual têm todos os elementos, e, ainda, tenho de ir arranjar duas testemunhas, ir com elas à Junta de Freguesia, de modo a que esta me passe uma declaração a dizer que eu vivo onde vivo, e com essa declaração mais o B.I e mais o Cartão de Contribuinte e mais o Cartão de Estudante e mais a minha pessoa venho aqui novamente e mostro-vos tudo. Certo? — resumiu o jovem.
— Exactamente — anuiu ela.
— Não é mais nada? Veja lá! Não terei de ir ao notário ou à conservatória ou à secretaria da faculdade, ou à polícia? — perguntou ele.
— Há vários anos que é assim. São ordens do Banco de Portugal — finalizou a funcionária.
O rapaz, visivelmente maldisposto, desejou um bom dia aos presentes e foi, presumo eu, arranjar modo de provar que tem mais de dezoito anos.
Eu fiquei a pensar: rapaz ingrato. Não sabe a sorte que tem. Não sabe agradecer o facto de viver no tempo histórico do simplex socrático. É verdade que lhe pediram quatro documentos para provar o que um deles sozinho provava, mas, de outro ponto de vista, ele deveria ver que não lhe pediram a certidão de nascimento, não lhe pediram o registo criminal, não lhe pediram o certificado de robustez física, não lhe pediram análises ao sangue. Os jovens de hoje acham que é chegar e andar. Não é assim. Calma! Se não sabe do cartão de contribuinte, vai às Finanças pedir outro, e fica com entretenimento para o dia inteiro. Se precisa de testemunhas e de um documento da Junta de Freguesia, aproveita a circunstância e desenvolve o convívio social e, de seguida, aprofunda o conhecimento das instituições autárquicas.
Por outro lado, o jovem devia dar graças aos deuses por termos o Banco de Portugal que temos. Se para se provar a maioridade há esta exigência, este rigor, esta absoluta ausência de facilitismo, imagine-se a exigência, o rigor e o controlo que o Banco de Portugal não terá com a fiscalização dos bancos e das suas operações. Deve ser um rigor! Deve ser uma exigência!
Imagino como os banqueiros, ao longo destes anos, devem ter temido a fiscalização do Banco de Portugal!
É pena é que o rapaz não valorize nada disto.