Se excluirmos algumas belezas naturais (as que ainda existem...), alguma boa gastronomia, algum bom vinho, alguns bons amigos e alguma boa gente, os motivos de satisfação de se regressar a Portugal não existem. O confronto com a actual realidade portuguesa é penoso.
Dos incêndios à política, é um rol de horrores que diante de nós desfila e que nos leva a perguntar: que nação é esta?
1. As estradas deste país mostram-nos, quilómetro após quilómetro, a criminosa e devastadora destruição da nossa floresta, nas nossas serras e nos campos. Em vários sítios, o cheiro a queimado ainda se faz sentir, apesar desses incêndios terem sido extintos há vários dias. É um panorama de morte, de desolação, de angústia.
É um panorama que nos faz recordar que, para além da impunidade criminal de que muitos tarados e assassinos da natureza usufruem, e da impunidade dos criminosos que por negligência provocam incêndios, também existe uma impunidade política que é usufruída há vários anos pelos responsáveis deste país, que nada fazem para impedir que se repita, anos após ano, o desenrolar deste filme macabro.
A esta impunidade geral, junta-se a insensibilidade e o pedantismo de um primeiro-ministro que, enquanto as chamas devoravam árvores e vegetação e ameaçavam casas e bens de centenas de pessoas, se mostrava particularmente preocupado em dizer às televisões que, afinal, neste ano, tinha ardido menos área do que no ano anterior. Infelizmente o pedantismo teve resposta, e, alguns dias depois, deflagraram novos e gigantescos incêndios que impediram que tivéssemos de ouvir novamente este tipo de aleivosias.
2. Mas as estradas deste país não nos mostram apenas esta catástrofe, mostram-nos uma outra: o esbanjamento de dinheiro e o enorme poder do lóbi das grandes empresas de construção. Há dias, alguém afirmou que quem governa Portugal são os lóbis, aos quais nenhum governo resiste. Ora, dois desses lóbis são, ninguém duvida, o das fábricas de cimento e o das empresas que fazem as obras públicas e inventam obras públicas para serem feitas.
A quantidade de auto-estradas construídas e em construção, de viadutos construídos e em construção, de obras de alargamento, de melhoramento, de aperfeiçoamento e de sei lá mais o quê é tal que quem circula em Portugal, e não é de cá, fica a pensar que está a circular num país produtor de petróleo ou, no mínimo, cheio de dinheiro. Sai daqui convencido de que não existe nem nunca existiu qualquer crise, e sai a magicar que devemos ter uma área territorial superior à da França ou Alemanha.
3. Se as estradas nos mostram o que mostram, a Educação mostra-nos que se aproveita o período de férias para, por um lado, fechar escolas e para, por outro lado, amontoar escolas, amontoar alunos, amontoar professores, amontoar funcionários, não com a finalidade de melhorar as condições do ensino e da aprendizagem, mas com a finalidade de emagrecer o orçamento. Sem rei nem roque, este processo tem-se desenvolvido com trapalhadas atrás de trapalhadas e cenas próprias de far west.
Todavia, o curioso mesmo é ver que o dinheiro que mingua na Educação sobra na construção de estradas e viadutos — algo de que estamos absolutamente carenciados, como é sabido.
Mas a Educação mostra-nos também que vamos iniciar mais um ano lectivo com mais um simulacro de avaliação de professores. Os avaliadores farão de conta que avaliam e os avaliados farão de conta que foram avaliados. A fiabilidade e a seriedade de tudo isto é coisa que pouco interessa ao Governo. Como sempre, o que lhe interessa é a publicidade da coisa, é a aparência da coisa. O que a coisa realmente é nunca interessou nem interessará a um governo chefiado pelo actual primeiro-ministro.
4. O primeiro-ministro que, em menos de um ano, é capaz de se opor veementemente e de defender veementemente o fim das deduções fiscais na Saúde e Educação.
Em Setembro do ano passado, a propósito da proposta do BE sobre o fim das deduções fiscais, Sócrates proclamou, com a maior convicção que se pode imaginar: «Isto é gravíssimo! É a primeira vez que um partido propõe que se eliminem todos os benefícios fiscais — não para os ricos, mas para a classe média!»; «Como é possível, de um momento para o outro, fazer o seguinte: acabamos com as deduções e obrigamos a classe média a pagar mais de mil milhões de euros! Eu acho isto absolutamente impraticável!».
Agora, ouvimos, estupefactos, o mesmo primeiro-ministro defender, com a mesma sincera e profunda convicção, exactamente o contrário: o fim das deduções fiscais na Saúde e Educação são a coisa mais justa do mundo.
5. Estupefacto também se fica, quando se toma conhecimento de que o famoso cheque-bebé de 200 euros, prometido nas eleições por Sócrates e anunciado como a primeira medida deste Governo, ainda não foi depositado em nome de nenhum dos muitos bebés já nascidos. Inquiridos sobre o facto, os responsáveis do Instituto que deveria concretizar a medida não dão resposta.
Lamentavelmente, estes são apenas alguns exemplos de muitas e diversas situações que fazem do regresso de férias um momento de desagradável confronto com a nossa realidade.
O fim de férias não é bom para ninguém, mas, em Portugal, começa a tornar-se um suplício.
Dos incêndios à política, é um rol de horrores que diante de nós desfila e que nos leva a perguntar: que nação é esta?
1. As estradas deste país mostram-nos, quilómetro após quilómetro, a criminosa e devastadora destruição da nossa floresta, nas nossas serras e nos campos. Em vários sítios, o cheiro a queimado ainda se faz sentir, apesar desses incêndios terem sido extintos há vários dias. É um panorama de morte, de desolação, de angústia.
É um panorama que nos faz recordar que, para além da impunidade criminal de que muitos tarados e assassinos da natureza usufruem, e da impunidade dos criminosos que por negligência provocam incêndios, também existe uma impunidade política que é usufruída há vários anos pelos responsáveis deste país, que nada fazem para impedir que se repita, anos após ano, o desenrolar deste filme macabro.
A esta impunidade geral, junta-se a insensibilidade e o pedantismo de um primeiro-ministro que, enquanto as chamas devoravam árvores e vegetação e ameaçavam casas e bens de centenas de pessoas, se mostrava particularmente preocupado em dizer às televisões que, afinal, neste ano, tinha ardido menos área do que no ano anterior. Infelizmente o pedantismo teve resposta, e, alguns dias depois, deflagraram novos e gigantescos incêndios que impediram que tivéssemos de ouvir novamente este tipo de aleivosias.
2. Mas as estradas deste país não nos mostram apenas esta catástrofe, mostram-nos uma outra: o esbanjamento de dinheiro e o enorme poder do lóbi das grandes empresas de construção. Há dias, alguém afirmou que quem governa Portugal são os lóbis, aos quais nenhum governo resiste. Ora, dois desses lóbis são, ninguém duvida, o das fábricas de cimento e o das empresas que fazem as obras públicas e inventam obras públicas para serem feitas.
A quantidade de auto-estradas construídas e em construção, de viadutos construídos e em construção, de obras de alargamento, de melhoramento, de aperfeiçoamento e de sei lá mais o quê é tal que quem circula em Portugal, e não é de cá, fica a pensar que está a circular num país produtor de petróleo ou, no mínimo, cheio de dinheiro. Sai daqui convencido de que não existe nem nunca existiu qualquer crise, e sai a magicar que devemos ter uma área territorial superior à da França ou Alemanha.
3. Se as estradas nos mostram o que mostram, a Educação mostra-nos que se aproveita o período de férias para, por um lado, fechar escolas e para, por outro lado, amontoar escolas, amontoar alunos, amontoar professores, amontoar funcionários, não com a finalidade de melhorar as condições do ensino e da aprendizagem, mas com a finalidade de emagrecer o orçamento. Sem rei nem roque, este processo tem-se desenvolvido com trapalhadas atrás de trapalhadas e cenas próprias de far west.
Todavia, o curioso mesmo é ver que o dinheiro que mingua na Educação sobra na construção de estradas e viadutos — algo de que estamos absolutamente carenciados, como é sabido.
Mas a Educação mostra-nos também que vamos iniciar mais um ano lectivo com mais um simulacro de avaliação de professores. Os avaliadores farão de conta que avaliam e os avaliados farão de conta que foram avaliados. A fiabilidade e a seriedade de tudo isto é coisa que pouco interessa ao Governo. Como sempre, o que lhe interessa é a publicidade da coisa, é a aparência da coisa. O que a coisa realmente é nunca interessou nem interessará a um governo chefiado pelo actual primeiro-ministro.
4. O primeiro-ministro que, em menos de um ano, é capaz de se opor veementemente e de defender veementemente o fim das deduções fiscais na Saúde e Educação.
Em Setembro do ano passado, a propósito da proposta do BE sobre o fim das deduções fiscais, Sócrates proclamou, com a maior convicção que se pode imaginar: «Isto é gravíssimo! É a primeira vez que um partido propõe que se eliminem todos os benefícios fiscais — não para os ricos, mas para a classe média!»; «Como é possível, de um momento para o outro, fazer o seguinte: acabamos com as deduções e obrigamos a classe média a pagar mais de mil milhões de euros! Eu acho isto absolutamente impraticável!».
Agora, ouvimos, estupefactos, o mesmo primeiro-ministro defender, com a mesma sincera e profunda convicção, exactamente o contrário: o fim das deduções fiscais na Saúde e Educação são a coisa mais justa do mundo.
5. Estupefacto também se fica, quando se toma conhecimento de que o famoso cheque-bebé de 200 euros, prometido nas eleições por Sócrates e anunciado como a primeira medida deste Governo, ainda não foi depositado em nome de nenhum dos muitos bebés já nascidos. Inquiridos sobre o facto, os responsáveis do Instituto que deveria concretizar a medida não dão resposta.
Lamentavelmente, estes são apenas alguns exemplos de muitas e diversas situações que fazem do regresso de férias um momento de desagradável confronto com a nossa realidade.
O fim de férias não é bom para ninguém, mas, em Portugal, começa a tornar-se um suplício.