sexta-feira, 23 de julho de 2010

Fragmenti veneris diei

«Há coisa mais estranhas que a sacrofobia, disse Elvira Campos, sobretudo se tivermos em conta que estamos no México e que aqui a religião foi sempre um problema, de facto, eu diria que todos nós mexicanos sofremos, no fundo, de sacrofobia. Pensa, por exemplo, num medo clássico, gefirofobia. É uma coisa que muitas pessoas têm. O que é a gefirofobia?, perguntou Juan de Dios Martinez. É o medo de atravessar pontes. É verdade, eu conheci um tipo, bom, na realidade era uma criança, que sempre que atravessava uma ponte tinha medo que esta caísse, por isso atravessava-as a correr, o que se tornava muito mais perigoso. É um clássico, disse Elvira Campos. Outro clássico: a claustrofobia. Medo dos espaços abertos fechados. E mais outro: a agorafobia. Medo dos espaços abertos. Esses eu conheço, afirmou Juan de Dios Martinez. Mais outro clássico: a necrofobia. Medo dos mortos, disse Juan de Dios Martinez, conheci gente assim. Se se trabalha como polícia é uma complicação. Também existe a hematofobia, medo do sangue. Bem verdade, disse Juan de Dios Martinez. E a pecatofobia, medo de cometer pecados. Mas depois há outros medos que são mais estranhos. Por exemplo, a clinofobia. Sabe o que é? Não faço ideia, disse Juan de Dios Martinez. Medo das camas. Pode alguém ter medo ou aversão a uma cama? Pois sim, há pessoas que sim. Mas isso pode ser atenuado dormindo no chão e nunca entrando num quarto. E depois existe também a tricofobia, que é medo do cabelo. Um pouco mais complicado, não é verdade? Complicadíssimo. Há casos de tricofobia que acabam em suicídio. E também existe a verbofobia que é o medo das palavras. Nesse caso o melhor é ficar calado, comentou Juan de Dios Martinez. É um pouco mais complicado do que isso, porque as palavras estão em toda a parte, inclusivamente no silêncio, que nunca é silêncio total, não é verdade?»
Roberto Bolaño, 2666, p. 441.