Aí, do púlpito, Seaman falou da sua vida. Foi apresentado pelo reverendo Ronald K. Foster, se bem que pela maneira de o fazer se notasse que Seaman já ali havia estado antes. Vou falar de cinco temas, disse Seaman, nem um mais nem um menos. O primeiro tema é PERIGO. O segundo, DINHEIRO. O terceiro, COMIDA. O quarto, ESTRELAS. O quinto e último, UTILIDADE. As pessoas sorriram e alguns inclinaram a cabeça em sinal de aprovação, como se dissessem ao conferencista que concordavam, que não tinham nada melhor para fazer senão ouvi-lo. Num canto viu cinco rapazes, nenhum deles com mais de vinte anos, vestidos com casacos pretos, boinas pretas e óculos escuros que olhavam para Seaman com expressão aparvalhada e que tanto podiam estar ali para o aplaudir como para o insultar. No palco, o velho movia-se com as costas encurvadas de um lado para o outro, como se de repente tivesse esquecido o seu discurso. De improviso, a uma ordem do pastor, o coro cantou um gospel. A letra da canção falava de Moisés e do cativeiro do povo de Israel no Egipto. O próprio pastor acompanhava-os ao piano. Então Seaman voltou ao centro e levantou a mão (tinha os olhos fechados) e dali a poucos segundos cessaram as notas do coro e a igreja ficou em silêncio.»
Roberto Bolaño, 2666, p. 287.