É sempre com grande interesse que oiço muitos dos nossos economistas e gestores dissertarem sobre as receitas para a superação da crise. Desta, da anterior a esta, da anterior à anterior a esta e, no fundo, de uma qualquer, porque a receita é invariavelmente a mesma. É um regalo para o ouvido estar atento ao conteúdo do discurso destes homens e destas mulheres que dominam o mundo da economia e da gestão. E o meu interesse aumenta à medida que as soluções são enunciadas. Já todos as conhecemos, mas é sempre uma emoção ouvi-las, como se da primeira vez se tratasse: cortar nas despesas do Estado, baixar os impostos e privatizar.
Oiço dizer que devem ser privatizadas as empresas públicas que, curiosamente, dão lucro (e também algumas que não dão, mas que rapidamente nas mãos dos privados passariam a dar já que seriam destituídas das suas obrigações sociais).
Oiço dizer que os impostos devem baixar, ainda que não tenha compreendido como é que, vendendo as empresas públicas que dão lucro e baixando os impostos, o Estado obtém receitas para pagar a sua enorme dívida.
Oiço dizer que as despesas do Estado reduzem-se drasticamente se diminuírem as verbas destinadas ao pagamento dos salários dos funcionários públicos. A descoberta em si não é brilhante — se não se paga ao trabalhador é óbvio que a despesa diminui — o que é brilhante é o que vem a seguir. As verbas destinadas ao pagamento dos vencimentos diminuem de que modo? As soluções são várias e interessantes:
1. Congelam-se os salários por tempo indeterminado;
2. Diminuem-se os salários em 10%;
3. Acaba-se com o 14.º mês;
4. Impõe-se a regra do 3 ou do 5 para 1 (por cada 3 ou 5 funcionários que vão para a reforma, só entra 1).
Estas ideias propostas por muitos dos nossos mais brilhantes economistas e gestores adquirem um valor acrescido e um brilhantismo inultrapassável quando temos conhecimento das suas reacções à proposta de cortes ou de congelamento dos prémios que anualmente recebem. As sua vozes elevam-se e reclamam que são propostas demagógicas, que são propostas populistas, que são propostas injustas, que são propostas absolutamente inaceitáveis. (Note-se que estamos a falar apenas de prémios, não de salários).
É realmente enternecedor ouvir falar alguns dos nossos mais brilhantes economistas e gestores. É enternecedor ouvi-los falar do dinheiro dos outros, ouvi-los falar do congelamento do salário dos outros, ouvi-los falar da diminuição do salário dos outros e ouvi-los falar dos seus próprios prémios. E para além da ternura que essa audição envolve, também nos apercebemos de quão isentas, rigorosas e sérias são as opiniões destes nossos economistas e gestores.
São mulheres e homens assim que nos devem servir de exemplo.
Deste modo, e pela minha parte, prescindirei durante os próximos anos (cinco, dez, quinze, os que forem necessários) de qualquer aumento salarial; prescindirei do 14.º mês (se for necessário, também do 13.º), e verei com bom grado que me diminuam o salário em 10% ou mais.
Imponho apenas uma condição: que este dinheiro de que prescindo, e que, acredito, muitos outros prescindirão, seja canalizado para o pagamento anual dos prémios destes nossos brilhantes economistas e gestores. Assim, ficaremos todos bem: nós, porque a crise terminará, e eles, porque não verão reduzidos os seus merecidos prémios.
Oiço dizer que devem ser privatizadas as empresas públicas que, curiosamente, dão lucro (e também algumas que não dão, mas que rapidamente nas mãos dos privados passariam a dar já que seriam destituídas das suas obrigações sociais).
Oiço dizer que os impostos devem baixar, ainda que não tenha compreendido como é que, vendendo as empresas públicas que dão lucro e baixando os impostos, o Estado obtém receitas para pagar a sua enorme dívida.
Oiço dizer que as despesas do Estado reduzem-se drasticamente se diminuírem as verbas destinadas ao pagamento dos salários dos funcionários públicos. A descoberta em si não é brilhante — se não se paga ao trabalhador é óbvio que a despesa diminui — o que é brilhante é o que vem a seguir. As verbas destinadas ao pagamento dos vencimentos diminuem de que modo? As soluções são várias e interessantes:
1. Congelam-se os salários por tempo indeterminado;
2. Diminuem-se os salários em 10%;
3. Acaba-se com o 14.º mês;
4. Impõe-se a regra do 3 ou do 5 para 1 (por cada 3 ou 5 funcionários que vão para a reforma, só entra 1).
Estas ideias propostas por muitos dos nossos mais brilhantes economistas e gestores adquirem um valor acrescido e um brilhantismo inultrapassável quando temos conhecimento das suas reacções à proposta de cortes ou de congelamento dos prémios que anualmente recebem. As sua vozes elevam-se e reclamam que são propostas demagógicas, que são propostas populistas, que são propostas injustas, que são propostas absolutamente inaceitáveis. (Note-se que estamos a falar apenas de prémios, não de salários).
É realmente enternecedor ouvir falar alguns dos nossos mais brilhantes economistas e gestores. É enternecedor ouvi-los falar do dinheiro dos outros, ouvi-los falar do congelamento do salário dos outros, ouvi-los falar da diminuição do salário dos outros e ouvi-los falar dos seus próprios prémios. E para além da ternura que essa audição envolve, também nos apercebemos de quão isentas, rigorosas e sérias são as opiniões destes nossos economistas e gestores.
São mulheres e homens assim que nos devem servir de exemplo.
Deste modo, e pela minha parte, prescindirei durante os próximos anos (cinco, dez, quinze, os que forem necessários) de qualquer aumento salarial; prescindirei do 14.º mês (se for necessário, também do 13.º), e verei com bom grado que me diminuam o salário em 10% ou mais.
Imponho apenas uma condição: que este dinheiro de que prescindo, e que, acredito, muitos outros prescindirão, seja canalizado para o pagamento anual dos prémios destes nossos brilhantes economistas e gestores. Assim, ficaremos todos bem: nós, porque a crise terminará, e eles, porque não verão reduzidos os seus merecidos prémios.