«Havia um corpo fortalecido à força, uma cidade ao pé do mar e uma revolta-interrogação: estes três dados formam de súbito unidade em busca da unificação maior, por descoberta. Lisboa com seus bêbados e prostitutas compunha a música antiquíssima ao ritmo da qual dançado sou —por ter ali aberto os olhos à dor e à alegria. Eis-me (uma vez mais) no limiar do gesto sem passado nem futuro a que posso chamar peão branco na quarta casa do rei.
Rasgada, no infinito do possível, a porta duma abertura clássica — Ruy Lopez, digamos, por hipótese — retomo a posição coabitaste com milhões de companheiros, alguns talvez leitores. A partida desenrola-se, Neandertal e andando; o jogo, esse, define-se pela translúcida complicação de não ter princípio, meio ou fim. Quando um tipo cai nele, descobre como lá esteve, estará até mais não. Oh tempo e mortes no teu meio, eu quero é rir. Aliviadamente.»
Nuno Bragança, A Noite e o Riso, Pub. Dom Quixote.