quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Ter ou não ter

Há determinadas vozes públicas que só de as ouvirmos nos incomodam. Isto acontece não porque o problema resida no timbre das vozes, mas simplesmente porque associado a elas está o permanente uso e abuso da demagogia, e/ou da mentira, e/ou da arrogância e/ou da falta de pudor.
Uma dessas vozes é a de Teixeira dos Santos. O caso de Teixeira dos Santos é mais grave do que outros, porque a sua voz não só está associada à série de qualidades que acima enumerei como tem um efectivo problema de timbre. Por conseguinte, ouvi-lo incomoda-me duplamente: pela qualidade das pregas vocais e pelo que diz. E ontem, no Parlamento, esta voz disse: «O Governo não tem vergonha de pedir sacrifícios aos povo português.» Disse e repetiu duas vezes. Disse e repetiu duas vezes, em tom agressivo e quase aos gritos. Foi, pois, particularmente incomodativo ouvi-lo. 
Incomodativo e elucidativo. Nós sabemos que, em regra, este Governo não tem vergonha. Contudo, há algo de que este Governo não poderia deixar de sentir vergonha: exactamente de estar a pedir sacrifícios, melhor dito, de estar a impor sacrifícios brutais aos portugueses. Disto, pelo menos, o Governo teria de sentir vergonha. Porque o primeiro responsável pelo estado calamitoso a que o país chegou é o Governo. Ele é o primeiro responsável e, para a política ter ainda alguma réstia de dignidade, o Governo teria de considerar como um imperativo seu assumir a responsabilidade da situação que vivemos. Mas  o Governo não assume essa responsabilidade nem sente essa vergonha. Pelo contrário, pabula-se com ela, bazofeia-se com ela.
Quando se atinge o ponto em que o pudor é substituído pela ufania, quer dizer que há algo de muito errado, quer dizer que há algo que necessita de urgente saneamento.