segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Registos e notas do fim-de-semana

PISA: Docentes desvalorizam relatório da OCDE
Sol (10/12/10)

Ex-governantes e críticos do actual sistema avaliam consequências do PISA
Público (11/12/10)
PISA: Justa celebração

Mariano Gago trava acesso das Novas Oportunidades ao ensino superior
Expresso (11/12/10)
Portugal descobriu o PISA. Se um ET tivesse chegado ao nosso planeta, e se tivesse (para infelicidade sua) aterrado em Portugal, e se o dia da aterragem tivesse sido na passada terça-feira, e se se tivesse mantido por cá até ao fim-de-semana, e se «arranhasse» a nossa língua, e se tivesse tido oportunidade de ler as «gordas» dos jornais, e se tivesse assistido ao debate da passada sexta-feira no Parlamento, certamente que teria ficado convencido de duas coisas:  de que Pisa não fica na Itália, fica em Portugal, e de que tinha aterrado no país com os melhores alunos do mundo, com os melhores ministros da Educação do mundo e com o primeiro-ministro mais risonho do mundo.
Mas, do mesmo modo que se pergunta à hiena de que ri ela, devemos perguntar ao primeiro-ministro: o senhor ri de quê?
Um político, de um país cujos resultados do PISA ficaram um pouco acima da média dos alcançados pelos países da OCDE, tirou esta conclusão: «Estar na média não ajudará os nossos estudantes a conseguirem os empregos de amanhã.» Em Portugal, cujos resultados ficaram abaixo dessa média, o primeiro-ministro ri.
Em Portugal, sobe-se do «medíocre menos» para o «medíocre» e o primeiro-ministro ri. E a actual ministra da Educação ri, a anterior ministra ri, tudo que é político ri. Se não ligarmos ao circo político, e se nos ativermos apenas à realidade, deveremos questionar-nos se um aluno que passa de uma nota de 5 para 8 (numa escala de zero a vinte) tem motivos para ficar feliz. Não tem. Nesta situação, nenhum aluno ri. Um professor que vê um aluno seu passar de 5 para 8 fica feliz? Não fica.  Nesta situação, nenhum professor ri. Um pai que vê o seu filho passar de uma nota de 5 para 8 fica feliz? Não fica. Nesta situação, nenhum pai  ri. Todos eles têm motivos para ficar menos tristes, mas todos têm fundados motivos para estar tristes. Porém, em Portugal, os nossos políticos ficam felizes por passarmos do 5 para o 8. Nem sequer ao 10 chegámos, mas o nosso primeiro-ministro ri. Ficámos abaixo do meio da tabela, ficámos aquém da média, que em 2009 até baixou, mas o nosso primeiro-ministro ri.

Se a OCDE prosseguir no caminho que tem prosseguido nos últimos anos, tornar-se-á, a médio prazo, uma organização irrelevante, do ponto de vista da credibilidade técnica dos seus relatórios. Recordo o relatório sobre o modelo de avaliação de Lurdes Rodrigues; recordo a rocambolesca história de um outro relatório que era da OCDE, mas que depois já não  era da OCDE, mas que afinal tinha o seu informal beneplácito; recordo o relatório económico de Portugal apresentado no passado mês de Setembro e o recente relatório do PISA 2009. Todos eles têm um traço comum: são mais políticos do que técnicos e, o que é mais grave, pretendem esconder as suas avaliações políticas por detrás de uma capa técnica.

Este fim-de-semana, assisti, na televisão, a um momento politicamente obsceno. Vi o primeiro-ministro dirigir a palavra a alunos do Programa Novas Oportunidades, a quem tinha acabado de entregar diplomas, dizendo-lhes: «Ainda há quem considere que há facilitismo nos cursos das Novas Oportunidades! Vejam bem, dizem que há facilitismo, quando olho para vós e vejo pessoas que durante o dia trabalham e que, à noite, decidiram vir estudar. Isto é facilitismo?!»
Há limites que nunca deveriam ser ultrapassados. Este discurso repugna, porque manipula, sem pudor, pessoas que decidiram voltar à escola. Porque trata estas pessoas como marionetas do jogo político rasteiro. É inadmissível, é intolerável. Sócrates sabe que o facilitismo não está nem poderia estar no facto de as pessoas trabalharem de dia e irem estudar à noite. Mas di-lo, o que é obsceno. Sócrates sabe que o facilitismo reside no facto destes alunos concluírem o ensino secundário em ano e meio, enquanto os outros estudantes concluem-no em três anos. O facilitismo está no facto de estes cursos equivalerem formalmente ao 12.º ano. O facilitismo está em dizer a estes alunos que o seu curso de ensino secundário, pelas Novas Oportunidades, tem o mesmo valor  do que um curso do ensino secundário regular. O facilitismo está em permitir que alunos que têm baixíssimos níveis de literacia fiquem certificados com o 12.º ano. O facilitismo está em oferecer a estes alunos regras muito mais fáceis de acesso ao ensino superior do que aos outros alunos. O facilitismo reside nisto. Sócrates sabe, mas não o diz, esconde-o. E isso é obsceno.