«Não estou disponível para colaborar na farsa desta avaliação do desempenho, pelo que não entregarei a Ficha de Auto-Avaliação
Em questões de coerência e dignidade prefiro, sempre, olhar para dentro do que para o lado. Como tal, é-me, relativamente, indiferente saber quantos colegas acompanham a minha decisão de não entregar qualquer Ficha de Auto-Avaliação (FAA) imposta por este modelo de avaliação do desempenho.
Neste particular, revejo-me, em absoluto, no poema de Torga: “Não sei quantos seremos, mas que importa?! - Um só que fosse, e já valia a pena - Aqui, no mundo, alguém que se condena - A não ser conivente - Na farsa do presente - Posta em cena!”
Confesso-me inexperiente e sem treino na técnica de adormecer sobre uma consciência pesada, pelo que não me resta outra autenticidade que não seja a de não sancionar este modelo de avaliação, nem ser cúmplice de um processo autocrático, destituído de seriedade, credibilidade, justiça e consistência.
Compreendo que a maioria dos professores, chegados a este momento da contestação, se encolha. Por conseguinte, nem sequer me acho no direito de empreender a pastoral da não entrega da FAA. Cada um deve decidir em consciência o que fazer.
Depois da fase do esfusiante unanimismo dos abaixo-assinados e da fase da resistência escola a escola (como é possível ter-se o desplante de afirmar que a estratégia não resultou, quando cerca de 60 mil professores se recusaram a entregar os seus objectivos individuais, num acto de desobediência cívica sem paralelo na história da democracia portuguesa!), parece-me chegado o momento das decisões individuais: cada um decide, em coerência, se participa ou não participa neste processo de avaliação. EU NÃO PARTICIPO!
Declaro, desde já, que não me atemorizam os argumentos legalistas e até farisaicos de muitos hermeneutas circunstanciais do direito e de inúmeros juristas de viveiro que por aí vão formigando.
Por norma, as interpretações alarmistas, que por aí vão vingando, tendem a confundir os dois planos seguintes:
1) o do direito à contestação cívica de leis reconhecidamente injustas e carecidas de seriedade (vejam-se, a propósito, as recentes declarações do presidente do Conselho Científico para a Avaliação os Professores, as quais assumem a fragilidade experimentalista do modelo de avaliação e reduzem os professores a meras cobaias de processos impreparados), de tal forma que este acto de rejeição nem sequer traduz qualquer tipo de incumprimento em termos de desempenho profissional – a nível pedagógico, científico e de envolvente institucional, antes pelo contrário (é pelo exemplo moral e espírito de exigência de alguns contestatários que grandes autores do direito e das teorias da justiça consideram a desobediência civil como um instrumento de aperfeiçoamento das instituições e da sociedade);
2) o do incumprimento dos deveres profissionais por parte dos funcionários públicos, quer seja por negligência, incompetência ou má vontade. Ora, a luta dos professores não configura nenhuma destas situações, as quais constituem, indiscutivelmente, o alvo e o horizonte das leis em apreço.
A história tem sido pródiga em demonstrações do que é, em determinadas circunstâncias, ser conivente de leis absurdas e injustas, apenas porque foi mais cómodo a muitos terem-se amouchado, acobardado ou eximido de lutar. Frequentemente, a manta da lei é curta para abafar a consciência e a exigência de justiça e de decência que ainda move muitos seres humanos, sobretudo quando se trata de leis que resultam em processos impositivos, impreparados e arbitrários, além de não colherem um reconhecimento social alargado, como é o caso vertente de muitos normativos legais expelidos por este Governo.
Apesar dos adamastores e papões que alguns vão agitando, na procura de escapatórias ou de subterfúgios de consciência, estou convicto que a minha decisão está resguardada e protegida por um conjunto de atenuantes e de circunstâncias favorecedoras, a saber:
1) sou um profissional empenhado e dedicado à escola, com uma folha de serviço irrepreensível de mais de vinte anos, nunca tendo negligenciado ou incumprido nenhum dos meus deveres como docente, pelo que apenas me limito a discordar de pôr em prática um modelo de avaliação que é injusto e não é sério. Tal não significa que me recuse a ver avaliada a minha prática profissional, uma vez que vou ter disponível, para o caso de alguém me querer avaliar, um relatório bem mais exigente, sério e circunstanciado da minha actividade docente;
2) além das práticas curriculares e extra-curriculares, disponho de mais do que a formação contínua exigida para o período sob avaliação, mau grado a maioria dos Centros de Formação não terem disponibilizado, por inépcia do Ministério da Educação, qualquer formação aos professores;
3) nenhum director, inspector ou juiz sacrificará a justiça e a decência a uma legalidade torpe, caprichosa e que a generalidade das sensibilidades políticas e sociais não reconhece, caso contrário são os fundamentos de uma sociedade justa que entrarão em erosão (haverá muita literatura e muitos exemplos para arrolar em conformidade);
4) tenho, do meu lado, todos os partidos políticos da oposição, bem como inúmeras autoridades de reconhecido mérito nacional e internacional, nas áreas da ciência, da pedagogia e do saber em geral. Acho que não estarei só.
Definitivamente, não estou disponível para colaborar na legitimação de um modelo de avaliação de que discordo, quer em termos dos fundamentos que o suportam e das debilidades e arbitrariedades em que se operacionaliza, quer tendo em conta a farsa em que se converteu.»
Em questões de coerência e dignidade prefiro, sempre, olhar para dentro do que para o lado. Como tal, é-me, relativamente, indiferente saber quantos colegas acompanham a minha decisão de não entregar qualquer Ficha de Auto-Avaliação (FAA) imposta por este modelo de avaliação do desempenho.
Neste particular, revejo-me, em absoluto, no poema de Torga: “Não sei quantos seremos, mas que importa?! - Um só que fosse, e já valia a pena - Aqui, no mundo, alguém que se condena - A não ser conivente - Na farsa do presente - Posta em cena!”
Confesso-me inexperiente e sem treino na técnica de adormecer sobre uma consciência pesada, pelo que não me resta outra autenticidade que não seja a de não sancionar este modelo de avaliação, nem ser cúmplice de um processo autocrático, destituído de seriedade, credibilidade, justiça e consistência.
Compreendo que a maioria dos professores, chegados a este momento da contestação, se encolha. Por conseguinte, nem sequer me acho no direito de empreender a pastoral da não entrega da FAA. Cada um deve decidir em consciência o que fazer.
Depois da fase do esfusiante unanimismo dos abaixo-assinados e da fase da resistência escola a escola (como é possível ter-se o desplante de afirmar que a estratégia não resultou, quando cerca de 60 mil professores se recusaram a entregar os seus objectivos individuais, num acto de desobediência cívica sem paralelo na história da democracia portuguesa!), parece-me chegado o momento das decisões individuais: cada um decide, em coerência, se participa ou não participa neste processo de avaliação. EU NÃO PARTICIPO!
Declaro, desde já, que não me atemorizam os argumentos legalistas e até farisaicos de muitos hermeneutas circunstanciais do direito e de inúmeros juristas de viveiro que por aí vão formigando.
Por norma, as interpretações alarmistas, que por aí vão vingando, tendem a confundir os dois planos seguintes:
1) o do direito à contestação cívica de leis reconhecidamente injustas e carecidas de seriedade (vejam-se, a propósito, as recentes declarações do presidente do Conselho Científico para a Avaliação os Professores, as quais assumem a fragilidade experimentalista do modelo de avaliação e reduzem os professores a meras cobaias de processos impreparados), de tal forma que este acto de rejeição nem sequer traduz qualquer tipo de incumprimento em termos de desempenho profissional – a nível pedagógico, científico e de envolvente institucional, antes pelo contrário (é pelo exemplo moral e espírito de exigência de alguns contestatários que grandes autores do direito e das teorias da justiça consideram a desobediência civil como um instrumento de aperfeiçoamento das instituições e da sociedade);
2) o do incumprimento dos deveres profissionais por parte dos funcionários públicos, quer seja por negligência, incompetência ou má vontade. Ora, a luta dos professores não configura nenhuma destas situações, as quais constituem, indiscutivelmente, o alvo e o horizonte das leis em apreço.
A história tem sido pródiga em demonstrações do que é, em determinadas circunstâncias, ser conivente de leis absurdas e injustas, apenas porque foi mais cómodo a muitos terem-se amouchado, acobardado ou eximido de lutar. Frequentemente, a manta da lei é curta para abafar a consciência e a exigência de justiça e de decência que ainda move muitos seres humanos, sobretudo quando se trata de leis que resultam em processos impositivos, impreparados e arbitrários, além de não colherem um reconhecimento social alargado, como é o caso vertente de muitos normativos legais expelidos por este Governo.
Apesar dos adamastores e papões que alguns vão agitando, na procura de escapatórias ou de subterfúgios de consciência, estou convicto que a minha decisão está resguardada e protegida por um conjunto de atenuantes e de circunstâncias favorecedoras, a saber:
1) sou um profissional empenhado e dedicado à escola, com uma folha de serviço irrepreensível de mais de vinte anos, nunca tendo negligenciado ou incumprido nenhum dos meus deveres como docente, pelo que apenas me limito a discordar de pôr em prática um modelo de avaliação que é injusto e não é sério. Tal não significa que me recuse a ver avaliada a minha prática profissional, uma vez que vou ter disponível, para o caso de alguém me querer avaliar, um relatório bem mais exigente, sério e circunstanciado da minha actividade docente;
2) além das práticas curriculares e extra-curriculares, disponho de mais do que a formação contínua exigida para o período sob avaliação, mau grado a maioria dos Centros de Formação não terem disponibilizado, por inépcia do Ministério da Educação, qualquer formação aos professores;
3) nenhum director, inspector ou juiz sacrificará a justiça e a decência a uma legalidade torpe, caprichosa e que a generalidade das sensibilidades políticas e sociais não reconhece, caso contrário são os fundamentos de uma sociedade justa que entrarão em erosão (haverá muita literatura e muitos exemplos para arrolar em conformidade);
4) tenho, do meu lado, todos os partidos políticos da oposição, bem como inúmeras autoridades de reconhecido mérito nacional e internacional, nas áreas da ciência, da pedagogia e do saber em geral. Acho que não estarei só.
Definitivamente, não estou disponível para colaborar na legitimação de um modelo de avaliação de que discordo, quer em termos dos fundamentos que o suportam e das debilidades e arbitrariedades em que se operacionaliza, quer tendo em conta a farsa em que se converteu.»
Octávio Gonçalves
Há uns dias que Octávio Gonçalves publicou o texto acima transcrito, que eu subscrevo, na íntegra. Por falta de tempo, ainda não pude comentar nem dedicar atenção, aqui, no blogue, a este importante assunto. Espero dar, na próxima semana, um contributo a este debate. Até lá, deixo o meu abraço ao Octávio Gonçalves.