sexta-feira, 16 de maio de 2008

Liberdade de escolha...

O bastonário da Ordem dos Advogados parece ter a recorrente necessidade de ser sui generis e, para isso, não olha a meios. Desta vez, apeteceu-lhe criticar o facto de a violência doméstica ser considerada um crime público que não permite à vítima desistir da queixa. E disse: «A mulher deve poder escolher em liberdade [se quer retirar a queixa], desde que as consequências da violência não sejam irreversíveis. [...] Há uma espécie de feminismo impertinente nesta leis».

1. «A mulher deve [...]»?! A mulher?! Para Marinho Pinto a violência doméstica tem obrigatoriamente como vítima a mulher? Em que mundo e em que século vive este homem? Para o bastonário da Ordem dos Advogados, o marido ainda continua a ser o «chefe de família»? Aquele que, quando chega a casa mal disposto, bate na mulher? Para ele, o homem agredido não existe ou a possibilidade de escolha é só para a mulher?

2. «Deve poder escolher»?! A vítima (homem ou mulher, diga-se) leva uma tareia e, por aquelas razões que a razão desconhece, perdoa ao agressor(a), logo, na opinião de Marinho Pinto, o crime apaga-se, deixa de existir, nunca ocorreu. É bonito!
Que a vítima perdoe, isso é um problema entre a vítima e o agressor, agora, que o agressor cometeu um crime e que tem de ser responsabilizado por ele, isso não me parece que possa levantar grandes dúvidas. Quer dizer: uma vítima que, pelas tais razões que a razão desconhece, sucessivamente perdoasse sucessivas sovas ao agressor (e quantos casos existem assim!) poderia sempre ilibar o criminoso; excepto quando as consequências da violência fossem consideradas irreversíveis, isto é, só a partir do momento em que ficasse a vítima desfigurada, paralítica ou por aí fora, aí, sim, é que já poderia haver crime.
Já, agora, sr. bastonário, porque é que nessa altura (desde que não ficasse cerebralmente afectada) a vítima não poderia ter, novamente, «liberdade de escolha» e voltar a perdoar e voltar a ilibar e voltar a candidatar-se a nova sessão de porrada?

É isto feminismo? E impertinente? Sim, senhor.