quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Um desabafo

Não sou comentador político nem aspiro a sê-lo. Para além de manifesta incapacidade e absoluta falta de vocação, tenho suficiente desconsideração pela grande maioria dos políticos para consumir tempo a comentar o que eles dizem ou fazem só pelo prazer de comentar ou de me entreter com fait-divers que dominam grande parte da actividade política.
Muito do que escrevo neste blogue faz parte do meu empenhamento cívico e do combate profissional em que decidi empenhar-me, ao verificar, há cerca de três anos, que os limites da decência política estavam a ser largamente ultrapassados por este Governo, juntamente com uma inimaginável incompetência técnica. Todavia, este combate está centrado na defesa de ideias e de valores e as críticas que dirijo a personalidades políticas, e outras, derivam exclusivamente das ideias e dos valores que defendo e das práticas políticas a que me oponho. Mesmo quando falo, e falo várias vezes, de características pessoais, como a arrogância, orgulho, vaidade, etc., de um(a) político(a), faço-o pelas objectivas implicações políticas que essas características pessoais têm (seria, aliás, curioso que se desenvolvessem investigações científicas sobre a relação entre perfis psicológicos e opções políticas — julgo que os resultados seriam curiosos). Não me interessam, pois, os jogos florentinos, os golpes baixos, nem os pântanos em que grande parte dos políticos se afundam.
Isto tudo para dizer que, pelo que acima afirmei, a única coisa que se me oferece observar, relativamente à comunicação ao país ontem apresentada pelo Presidente da República, é a seguinte, e digo-a como um desabafo: já tendo nós um primeiro-ministro medíocre que, lamentavelmente, vai continuar a exercer essas funções por mais algum tempo, é lúgubre verificar que temos um outro órgão de soberania ocupado por alguém que se permite ter um comportamento político inaceitável, à luz de qualquer dos pontos de vista possíveis.
Cavaco Silva desceu ao nível das intrigas palacianas em que os políticos medíocres se comprazem. Meteu os pés pelas mãos, enredou-se em histórias burlescas e revelou uma inesperada irresponsabilidade política. Já sabíamos que andou muito pouco atento aos problemas da Educação, mas não sabíamos que se permitia o direito de alimentar — pelo silêncio que manteve durante semanas, e sem qualquer campanha eleitoral a decorrer — boatos e suspeições da maior gravidade. Se o fez conscientemente, é gravíssimo, pelo que ética e politicamente significa; se o fez inconscientemente, gravíssimo é, pelo que denota de incapacidade para o exercício das suas funções.
E nem me vou referir ao grotesco da parte final da sua comunicação, onde diz: «A segunda interrogação que a publicação do referido e-mail me suscitou foi a seguinte: “será possível alguém do exterior entrar no meu computador e conhecer os meus e-mails? Estará a informação confidencial contida nos computadores da Presidência da República suficientemente protegida?”
Foi para esclarecer esta questão que hoje ouvi várias entidades com responsabilidades na área da segurança. Fiquei a saber que existem vulnerabilidades e pedi que se estudasse a forma de as reduzir.»
Comentar isto seria, provavelmente, ainda mais ridículo do que afirmá-lo.
Tenho uma dúvida que me assalta cada vez mais: não sei se este país apenas está doente, ou se é mesmo doente.