segunda-feira, 22 de julho de 2013

Uma pausa na liça


Há dois anos, por esta altura, escrevi:
«Neste momento, partir de férias para fora do país corresponde, grosso modo, a uma partida para o paraíso, seja qual for o destino e seja o que for que se entenda por paraíso. Sair daqui vale sempre a pena, mesmo que a alma seja pequena. Seja Tui, Verin, Fuentes de Onõro, Badajoz, Ayamonte, Tanger, Ceuta, seja qual for o local, por mais próximo que seja daqui, mas desde que não seja aqui, será sempre um paraíso. Vá-se a pé ou de bicicleta, ou à boleia; coma-se uma só vez por dia ou dia sim dia não; durma-se na tenda ou ao relento; tome-se banho de dois em dois dias ou uma vez por semana; tudo é preferível a ficar. Ficar faz mal a tudo: à bolsa, à paciência, à sanidade mental.»
Há um ano, também por esta altura, escrevi:
«Hoje em dia fazer férias é, desgraçadamente, um luxo e uma necessidade vital.
Um luxo, se pensarmos nos milhares de desempregados ou se pensarmos naqueles que têm salários ou pensões semelhantes a esmolas. Ver tanta gente que foi despedida e cujo futuro ficou reduzido aos limites da sobrevivência, ou ver tanta gente que trabalha ou trabalhou um ano inteiro com salários, horários e condições de trabalho miseráveis, e que não pode usufruir do descanso a que tem direito, faz pensar e sentir que ainda ter a possibilidade de fazer férias é quase uma prodigalidade — mesmo que o subsídio respectivo, que a lei consagra, tenha sido objecto de extorsão.
Por outro lado, fazer férias é uma necessidade vital. É vital para a nossa saúde mental termos a possibilidade de, pelo menos durante uns dias, deixarmos de ter contacto visual e auditivo com quem governa este país.»
Malfadadamente, o que há dois anos e há um ano era verdade hoje é-o muito mais. Na realidade, deixar de conviver, ainda que temporariamente, com os protagonistas das elites que dominam as nossa vidas é, cada vez mais, quase tão vital como respirar. Deixar de ver e ouvir as principais figuras do nosso poder político, financeiro e empresarial é certamente uma dádiva dos deuses.
Tenho tido o privilégio de ainda o conseguir fazer, partindo para onde a natureza se oferece de um modo agreste mas indescritivelmente belo: os lugares das areias sem fim.
Sem dúvida que poder deixar para trás a fealdade dos comportamentos daqueles que diariamente aqui nos desrespeitam e poder passar a contemplar a elegância das formas, a intensidade das cores, os movimentos dunares, o jogo das sombras, sentir a gracilidade das areias ou o peso e a hospitalidade de um espaço imenso que nos derruba mas também nos acolhe é um privilégio sem preço. 
Substituir os irrevogáveis daqui por gente hospitaleira de lá, o cinismo político pelo sorriso franco ou pela mão que gentilmente nos acena é uma proposta irrecusável.
É por tudo isto que o blogue entra hoje de férias, para que eu possa preparar o regresso a esses lugares, dentro de dias.
Em Setembro voltamos à liça.
Votos de boas férias a todos aqueles que delas ainda puderem usufruir.