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Nada de novo. O dinheiro não é uma invenção
do ar livre: foi criado nas fábricas,
nos compartimentos espessos, nos grandes edifícios.
Na cidade, o gosto a leite já lembra mais a máquina
que a vaca. Entardece, e as meias que de manhã
eram brancas são despidas em casa já negras.
O fumo baixo come lentamente os tornozelos
ocupados. A cidade bebe vinho, e alguns pais
distraídos cantam canções pornográficas
para as crianças adormecerem. Se alguém ouvir o galo
pensará de imediato que começou a catástrofe.
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De qualquer modo, na cidade
as batalhas são dirigidas de outra forma:
empregados cobertos de civilização
num único momento transformam-se
em assassinos. Nem um segundo separa a educação
da barbárie.
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As flores são mais móveis na cidade
do que na floresta: o vento provocado
pelo trânsito intenso não as deixa
sossegar. Só não se mata
por acasos do caminho: a vontade existe,
as armas são vendidas a preços comedidos
e duas balas chegam para quem não tem pontaria.
A cidade é uma infelicidade organizada.
Gonçalo M. Tavares, Uma Viagem à Índia, Caminho.