segunda-feira, 23 de abril de 2012

Uma entrevista esclarecedora

O presidente do Banco Espírito Santo (BES) deu uma entrevista ao Expresso. Vale a pena ler essa entrevista para, mais uma vez, nos lembrarmos do modo como estamos a ser dirigidos pelas diferentes elites, neste caso, a elite financeira. É notável a ligeireza e a irresponsabilidade que transpiram das palavras do presidente do BES, das palavras de alguém que, curiosamente, cultiva a imagem da mais elevada competência e do mais exigente rigor e que se apresenta (e é apresentado) como um modelo de gestor. (Sintomaticamente, há um facto observável nos últimos anos, em particular, a partir do momento em que Sócrates subiu ao poder, e que prossegue nos dias de hoje: aqueles que mais ornamentam os discursos com as palavras «competência», «rigor» e «excelência» são precisamente aqueles que menos revelam essas características).
Algumas passagens da referida entrevista.
Interrogado sobre o facto de os bancos terem fechado a «torneira» do crédito e isso estar a contribuir para a asfixia da economia portuguesa, o presidente do BES respondeu: «A ideia de que os bancos levaram a essa asfixia é bastante provocadora.» Depreende-se que se trata de uma falsa ideia.
Interrogado sobre o facto de os bancos terem anteriormente alimentado o endividamento, o presidente do BES respondeu: «Os bancos tanto contribuíram para o endividamento como agora estão a contribuir para a asfixia...». Depreende-se que os bancos não contribuíram nem para uma coisa nem para a outra.
Interrogado se a banca não andou a financiar o Estado e sectores não produtivos, o presidente do BES respondeu: «O Estado é o Estado, tem obrigação de saber o que faz. Se há programas de investimento que não se coadunam com a realidade... Houve certamente exageros, mas se não fossem os bancos portugueses, apareciam os bancos estrangeiros.» Depreende-se que a banca agiu bem.
Interrogado sobre se a banca tinha sido imprudente no jogo das parcerias público-privadas (PPP), o presidente do BES respondeu: «A análise das PPP ainda não está feita. [...] Certamente houve investimento excessivo, mas por exemplo, foram as PPP que permitiram financiar o Hospital Beatriz Ângelo (Loures) que foi recentemente inaugurado [...]». Depreende-se que as PPP foram uma boa política.
Interrogado sobre a irresponsável construção de auto-estradas sem tráfego, respondeu o presidente do BES: «Não tenho dúvidas de que teria havido opções melhores do que as que se tomaram. Mas é fácil criticar o passado. Não vou fazer essa crítica, acho que houve exageros mas há quantos anos é que esses programas de construção de estradas vêm a ser feitos?» Depreende-se que não há críticas a fazer nem responsabilidades a atribuir.
O atrevimento destas e de muitas outras respostas dadas pelo presidente do BES mostra o quanto as nossas elites são ineptas, o quanto são incapacitadas para assumir os graves erros que cometeram e o quanto podemos esperar delas. Depois de terem absorvido a riqueza do nosso país até ao tutano, deixando-o exangue, as nossas elites mostram-se impolutas de responsabilidades e prontas a prosseguir o mesmo caminho.