(E. Hemingway, «O Velho e o Mar»)
Na passada semana, no final da última aula de uma turma de 12º ano (nocturno), o delegado de turma, em seu nome e no dos colegas, dirigiu-me algumas palavras que me tocaram profundamente: ... que tinha sido para eles um privilégio ter trabalhado com os três professores que lhes haviam calhado este ano (eu próprio e os outros dois colegas, por sinal também autores neste blogue); ... que era com «dinossauros» como os que haviam sido seus professores que a Escola ainda valia a pena; ... que me estavam particularmente gratos pela consideração que sempre manifestara pelo facto de eles serem trabalhadores-estudantes; ... que não pensasse na reforma antecipada porque eu fazia falta aos que viriam depois deles ...
O delegado de turma em causa é um homem na casa dos cinquenta, como eu. É um homem com uma postura verdadeiramente pedagógica, como, desde o início, os colegas com idade para serem seus filhos reconheceram. Fez, com as suas amáveis e imerecidas palavras com que eu me sentisse de novo no início dos anos oitenta, quando o encantamento se tornara paixão e me fazia sentir que ser professor era uma feliz opção de vida.
Entre o que de mais gratificante o ensino pode dar está, para mim, a possibilidade de estabelecer a melhor das «cumplicidades» com um colectivo, como se, por vezes, o plural se tornasse singular. E foi com essa «cumplicidade» que, em diversas ocasiões (e mais convictamente após a última traição sindical), lhes manifestei a minha esperança em poder passar à reforma antecipada no próximo ano lectivo, que me sentia cada vez mais humilhado, que não aceitaria ser despojado da minha dignidade profissional (como o actual Poder quer), que a escola se tornara um fardo que a vontade carregava com acrescida dificuldade, que tinha mesmo receio de o único espaço onde ainda me sinto professor - a aula - ser também "invadido" por esse estado de alma próprio da derrota, como diria Hemingway.
Sei que alguns alunos da turma visitam este blogue. Porque a lealdade com que sempre nos relacionámos a isso obriga, digo-lhes, sinceramente, que espero encontrá-los "por aí", partilhando o mesmo gosto pelo conhecimento e pela mais sã das convivências. Se a a lei da sobrevivência mo permitir, o que quero é, apenas, terminar a actividade profissional sob o lema que, há muitos anos, aprendi em «O Velho e o Mar»: as razões da minha existência (neste caso profissional) podem ser destruídas, mas não derrotadas.