sábado, 29 de maio de 2010

Ao sábado: momento quase filosófico

«Sem dúvida nenhuma, a estrela da filosofia no século XX foi a linguagem. Muitos filósofos insistiram até à saciedade em que nós, os falantes, não somos donos da linguagem, antes estamos sujeitos a ela. No entanto, mesmo que seja verdade, no sentido em que só podemos dizer aquilo que a linguagem nos deixa dizer, o certo é que também há um uso persuasivo da linguagem, de tal modo que é possível usar a linguagem para influenciar o próximo e conseguir os nossos propósitos. Um exemplo dessa utilização persuasiva desponta na seguinte história que, com diferentes variantes, aparece tanto na tradição indiana, como na japonesa, como na europeia. Na versão europeia, o protagonista é um jesuíta, já que os membros desta ordem tinham fama de ser especialmente astutos e sibilinos. É assim:
Dois sacerdotes de ordens distintas, ambos fumadores inveterados, foram falar com o papa e consultaram-no sobre se lhes seria permitido fumar enquanto rezavam a Deus.
Em primeiro lugar, um deles falou com o papa e perguntou-lhe se podia fumar enquanto rezava, recebendo da parte de Sua Santidade um redondo não, mais uma severa reprimenda.
Chegou então a vez do segundo sacerdote, o jesuíta, que formulou a mesma pergunta ao papa, com uma ligeira diferença.
— Também se aborreceu contigo? — perguntou o outro sacerdote, quando o viu sair da entrevista.
— Pelo contrário, ficou muito contente.
— Mas tu perguntaste se podíamos fumar enquanto rezamos?
— Sim, só tive de mudar um pouco a ordem das palavras: perguntei-lhe se podíamos rezar enquanto fumamos.»
Pedro González Calero, A Filosofia com Humor.