Os professores da Escola Francisco de Holanda, de Guimarães, têm agido com elevada responsabilidade profissional e consciência social. Depois de terem, há dias, tomado posição pública sobre a catastrófica política educativa do actual governo, dirigem-se agora, por carta, aos pais e encarregados de educação, alertando-os para as consequências que essa política terá sobre o presente e o futuro dos seus filhos e educandos.
Passo a divulgar o conteúdo dessa missiva, que me chegou por e-mail:
Ex.mo Sr.
Encarregado de Educação:
Tendo em conta a gravidade da situação do país e, muito em particular, da Escola Pública, dirigimo-nos, deste modo, aos Pais e Encarregados de Educação.
Como é sabido, o Governo tem vindo a encetar uma série sucessiva de cortes nas funções do Estado e, em particular, na Escola Pública, visando, ao que dizem, equilibrar as contas públicas e diminuir a dívida do país.
No entanto, como também é público, não só a dívida global do país tem aumentado como também o défice, pese embora o crescente empobrecimento de funcionários públicos e pensionistas, não dá sinais de estabilizar. Em grande parte, a subida da dívida e a manutenção do défice nos valores atuais deve-se a que as políticas de austeridade têm conduzido a um brutal aumento do desemprego, e consequentes encargos sociais, e à diminuição do consumo em geral, fazendo diminuir, ao mesmo tempo, os resultados das coletas de impostos, em virtude da diminuição acentuada da atividade económica.
No entanto, o efeito destas políticas especificamente sobre a Escola Pública é ainda mais terrível. Tendo como objetivo a sua desestruturação, o Governo decidiu encetar na Educação uma série de políticas, das quais destacamos:
- cortes nos apoios socioeconómicos às famílias (SASE, NEE, apoios escolares…);
- aumento do preço dos manuais escolares;
- aumento do custo dos passes de transportes escolares;
- aumento do número de alunos por turma, até ao máximo de trinta;
- aumento do horário de trabalho letivo dos professores, implicando a diminuição de aulas de apoio individualizado aos alunos;
- aumento de número de turmas e de alunos por professor, que pode, em alguns casos, chegar a mais de 250 ou mesmo 300 alunos por professor;
- diminuição do número de horas dos professores para receber as famílias dos alunos;
- quase eliminação de horas no horário de trabalho dos professores para o trabalho individualizado ou não disciplinar com os alunos;
- congelamento das carreiras e progressões profissionais dos professores, há pelo menos seis anos;
- redução acentuada dos salários;
- redução do número de funcionários auxiliares/administrativos.
Todas estas políticas, incluindo um novo e considerável aumento do horário de trabalho dos professores, nova redução de salarial, anunciado aumento das propinas dos alunos (espécie de taxas moderadoras da educação), das refeições escolares/bar/reprografia têm um único objetivo: reduzir o investimento na educação até um mínimo desprezível, permitindo o despedimento do máximo de professores e outros funcionários das escolas, abrindo espaço à privatização do ensino público e à sua transformação num negócio, transformando a Escola Pública numa escola exclusiva para pobres.
Claro que conhecemos uma certa argumentação segundo a qual o despedimento de professores tem diretamente a ver com a redução do número de alunos. Mas isso simplesmente não é verdade. O número de professores aposentados nos últimos anos tem sido verdadeiramente esmagador, compensando a relativa diminuição do número de alunos, para já não falar no enorme número de adultos e jovens adultos portugueses com baixíssimas qualificações que procuram as escolas portuguesas mas a que estas, pelos cortes produzidos, não são capazes de responder.
A Escola Pública está no centro da Democracia portuguesa. Ela é o seu mais poderoso instrumento de ascensão, mobilidade e igualdade social, tendo produzido as mais qualificadas gerações da história de Portugal, permitindo que os jovens de todas as classes sociais e níveis económicos pudessem aspirar a uma vida melhor. O que estas políticas do Governo pretendem é, pelo contrário, diminuir a capacidade de ação educacional e cívica da Escola Pública, entregando ao mercado e à competição económica a tarefa de qualificar os portugueses. Todos sabemos onde isso nos irá conduzir: à criação de uma sociedade com dois níveis: um para ricos e outro para pobres, sem espaço para a justiça e a igualdade social. A curto prazo é a própria democracia portuguesa que está em causa.
Todas estas políticas afetarão imediatamente as vidas de milhares de professores, muitos com dezenas de anos de serviço, conduzindo-as à pobreza, mas, logo a seguir, afetarão também profundamente todos os portugueses e a capacidade da Escola Pública para educar e formar as crianças e jovens, eliminando as suas perspetivas de um futuro com um mínimo de esperança e prosperidade.
Todas as posições que os professores venham a adotar visam defender a Escola Pública. Neste sentido, vimos apelar aos pais dos nossos alunos para que se ponham do nosso lado na defesa de uma educação de qualidade; sem um número mínimo de professores e condições profissionais, o seu trabalho será crescentemente difícil ou, até, uma triste impossibilidade, cujo preço final não deixará de ser pago pelos alunos das escolas portuguesas.
A defesa da Escola Pública e do trabalho, com qualidade, dos professores, é, afinal, a defesa das crianças e jovens de Portugal (vossos e nossos filhos), para os quais se exige a nossa mobilização e ação conjuntas.
Contamos consigo.
Os signatários do manifesto aprovado em plenário de professores em 8.05.2013