Reconheço a capacidade de persistência de alguns. Reconheço a capacidade que alguns têm de persistir no absurdo, de persistir naquilo que não tem fundamento. Essa persistência é uma persistência de natureza semelhante à do fanatismo religioso. Todavia, em abono da verdade, e apesar de ambos os fanatismos serem inaceitáveis, há uma diferença: o genuíno fanatismo religioso tem por base uma convicção no que é o «bem»; o fanatismo de que falo (e que a seguir explicitarei) tem por base a convicção no que mais «convém».
Refiro-me ao fanatismo que politicamente nos domina e que abarca toda a vida humana: desde a Economia à Educação, da Saúde à Cultura, do Público ao Privado, etc. Este fanatismo não se cansa na difusão das suas ideias, que afirma como inevitabilidades, e apesar da objectiva falta de sustentação de grande parte do que diz e do que faz, não perde nenhuma oportunidade para se fazer ouvir.
Serve isto para fazer notar que, esta semana, esteve entre nós, a convite do Ministério da Educação e Ciência, um dos fundamentalistas da ideologia dominante na área da Educação. Chama-se Eric Hanushek. É um conhecido americano que veio da Força Aérea dos Estados Unidos para se doutorar em economia no MIT e posteriormente se dedicar à investigação em Economia e Educação, na Universidade de Stanford. Vive obcecado com a «excelização» da educação, trata os «resultados» educativos como se fossem «resultados» contabilísticos de uma fábrica, defende o aumento do número de alunos por turma, acha que tudo se resolve dando mais dinheiro a alguns professores e menos a outros, ainda que não consiga fundamentar o critério para tal distinção.
Estranha e curiosamente, veio cá repetir precisamente aquilo que há dois anos já aqui tinha dito. O que nos faz interrogar sobre a razão do convite...
E o que disse e diz Hanushek?
Apesar da realidade teimar em não confirmar as suas teses, isso não o faz desistir. Vejamos a sui generis linha argumentativa deste investigador.
Há dois anos, quando perguntado sobre o que é que os bons professores têm em comum, respondeu: «Ainda não conseguimos identificar as características que fazem um bom professor. [...] Ainda não conseguimos identificar o que explica a qualidade.»
Esta foi a resposta dada há dois anos, mas, em 2008, numa entrevista à revista brasileira Veja, Hanushek, a uma pergunta semelhante — «O senhor está dizendo que não há uma explicação estatisticamente confiável sobre as características que determinam um bom professor?» —, respondeu: «Existem muitas suposições, mas nenhuma delas tem valor científico. Por isso fica tão difícil estabelecer critérios prévios para a selecção dos melhores professores – e erra-se tanto.»
O que responde hoje Hanushek à mesma questão, volvidos vários anos de investigação? Responde deste modo: «A investigação falha na descrição das características ou do comportamento de um “professor eficiente”. Sabemos que há profissionais que, por sistema, são melhores em sala de aula do que outros, mas é difícil descrevê-los.»
Esta confissão de objectiva ignorância relativamente à definição do que é um bom professor (ou professor eficiente, ou professor de qualidade — termos que Hanushek utiliza como sinónimos), seria de louvar, enquanto humildade intelectual, se o mesmo Hanushek, de seguida, não tecesse desabridas considerações que conflituam abertamente com a confessada impossibilidade de conceptualização do que é o «bom professor».
Apesar de afirmar não ser possível descrever o que é um professor eficiente, Hanushek defende que «as turmas podem ser maiores, desde que haja professores eficientes». É difícil compreender como é que Hanushek defende que as turmas podem ser maiores, se houver professores eficientes, se ele diz não saber o que é um professor eficiente, porque a investigação ainda não conseguiu defini-lo. Isto é, apesar de não ter base empírica para afirmar o que afirma, Hanushek não se inibe de o fazer. E fá-lo repetida e insistentemente, às vezes de modo a fazer inveja aos «bitaites» que se ouvem na rua. Diz: «Um bom professor sabe como gerir uma sala e levar os seus estudantes [independentemente do seu número por sala de aula], mesmo quando eles não estão naturalmente preparados para tal.» Mas perguntado sobre o que é um «bom professor», Hanushek não sabe responder. Alguns entrevistados de rua das nossas «futeboladas» certamente não diriam pior.
Hanushek não sabe responder e lamentavelmente parece não saber do que fala.
(Continua)
Serve isto para fazer notar que, esta semana, esteve entre nós, a convite do Ministério da Educação e Ciência, um dos fundamentalistas da ideologia dominante na área da Educação. Chama-se Eric Hanushek. É um conhecido americano que veio da Força Aérea dos Estados Unidos para se doutorar em economia no MIT e posteriormente se dedicar à investigação em Economia e Educação, na Universidade de Stanford. Vive obcecado com a «excelização» da educação, trata os «resultados» educativos como se fossem «resultados» contabilísticos de uma fábrica, defende o aumento do número de alunos por turma, acha que tudo se resolve dando mais dinheiro a alguns professores e menos a outros, ainda que não consiga fundamentar o critério para tal distinção.
Estranha e curiosamente, veio cá repetir precisamente aquilo que há dois anos já aqui tinha dito. O que nos faz interrogar sobre a razão do convite...
E o que disse e diz Hanushek?
Apesar da realidade teimar em não confirmar as suas teses, isso não o faz desistir. Vejamos a sui generis linha argumentativa deste investigador.
Há dois anos, quando perguntado sobre o que é que os bons professores têm em comum, respondeu: «Ainda não conseguimos identificar as características que fazem um bom professor. [...] Ainda não conseguimos identificar o que explica a qualidade.»
Esta foi a resposta dada há dois anos, mas, em 2008, numa entrevista à revista brasileira Veja, Hanushek, a uma pergunta semelhante — «O senhor está dizendo que não há uma explicação estatisticamente confiável sobre as características que determinam um bom professor?» —, respondeu: «Existem muitas suposições, mas nenhuma delas tem valor científico. Por isso fica tão difícil estabelecer critérios prévios para a selecção dos melhores professores – e erra-se tanto.»
O que responde hoje Hanushek à mesma questão, volvidos vários anos de investigação? Responde deste modo: «A investigação falha na descrição das características ou do comportamento de um “professor eficiente”. Sabemos que há profissionais que, por sistema, são melhores em sala de aula do que outros, mas é difícil descrevê-los.»
Esta confissão de objectiva ignorância relativamente à definição do que é um bom professor (ou professor eficiente, ou professor de qualidade — termos que Hanushek utiliza como sinónimos), seria de louvar, enquanto humildade intelectual, se o mesmo Hanushek, de seguida, não tecesse desabridas considerações que conflituam abertamente com a confessada impossibilidade de conceptualização do que é o «bom professor».
Apesar de afirmar não ser possível descrever o que é um professor eficiente, Hanushek defende que «as turmas podem ser maiores, desde que haja professores eficientes». É difícil compreender como é que Hanushek defende que as turmas podem ser maiores, se houver professores eficientes, se ele diz não saber o que é um professor eficiente, porque a investigação ainda não conseguiu defini-lo. Isto é, apesar de não ter base empírica para afirmar o que afirma, Hanushek não se inibe de o fazer. E fá-lo repetida e insistentemente, às vezes de modo a fazer inveja aos «bitaites» que se ouvem na rua. Diz: «Um bom professor sabe como gerir uma sala e levar os seus estudantes [independentemente do seu número por sala de aula], mesmo quando eles não estão naturalmente preparados para tal.» Mas perguntado sobre o que é um «bom professor», Hanushek não sabe responder. Alguns entrevistados de rua das nossas «futeboladas» certamente não diriam pior.
Hanushek não sabe responder e lamentavelmente parece não saber do que fala.
(Continua)