Vimos, no texto da semana passada, que a avaliação da dimensão científica e pedagógica é feita por dois avaliadores: por um avaliador externo, cujo peso da sua avaliação é de 70%; e por um avaliador interno, cujo peso da avaliação é de 30%. O primeiro realiza a sua exótica avaliação a partir de duas observações de 90 minutos de aula. O segundo, como também vimos no texto anterior, realiza a sua ainda mais exótica avaliação a partir de três possibilidades: a partir de eventuais palestras/conferências que o avaliado realize e/ou a partir de eventuais obras/artigos que o avaliado publique ou a partir do nada — do nada, porque este avaliador interno não observa aulas, que o pudessem elucidar da prática pedagógica do colega avaliado, nem consta que lhe possa realizar provas orais ou escritas, para avaliar os seus conhecimentos científicos e os seus conhecimentos pedagógicos.
Apesar do exotismo, quanto à substância e quanto à forma, destes dois processos avaliativos, o despacho normativo n.º 24/2012 prevê que a classificação da dimensão científica e pedagógica do docente avaliado resulte da conjugação da avaliação de ambos os avaliadores. Seria de esperar que a classificação final desta dimensão resultasse da média ponderada das duas classificações atribuídas pelos avaliadores, mas não, aquele despacho atribui uma competência específica ao avaliador externo, que é a de «articular com o avaliador interno o resultado final da avaliação da dimensão científica e pedagógica dos docentes sujeitos à avaliação» — alínea e) do Art.º 4.º.
Aqui não se compreendem três coisas.
Uma, no que respeita à forma: que a dita «articulação» seja uma competência do avaliador externo e não seja uma competência de ambos os avaliadores.
Duas, no que respeita à substância:
a) Que se entende por articulação? Articulação pretende significar consensualização? E se não existir consensualização, que faz o avaliador externo à competência que o despacho lhe confere?
b) Como se articula uma (suposta) avaliação (externa) resultante da observação de duas aulas com uma avaliação (interna) resultante de coisa nenhuma? A primeira, pelo modo como é desenvolvida (observação de 180 minutos de aulas, em quatro anos de escalão), tem uma credibilidade e uma fiabilidade inanes, e a segunda, porque assente no vazio, tem uma credibilidade e uma fiabilidade nulas. Como se articula isto?
A isto adiciona-se outro problema.
Para além do modelo de avaliação de Passos e de Crato não cumprir o compromisso assumido, por ambos, de que não haveria avaliação entre pares da mesma escola (como já vimos, o avaliador interno, ou seja, um par da mesma escola, é responsável por 30% da avaliação da dimensão científica e pedagógica), não cumpre outro compromisso também publicamente assumido por ambos, o compromisso de que nenhum professor seria avaliado por um colega que não pertencesse ao mesmo grupo disciplinar e que não estivesse integrado num escalão igual ou superior ao seu.
Na verdade, o decreto regulamentar 26/2012 autoriza que isso aconteça (Art.º 14). Basta que na escola (e isso sucederá em muitas escolas e em muitos grupos disciplinares) não haja um professor que cumulativamente:
i) esteja integrado em escalão igual ou superior ao do professor avaliado;
ii) seja do mesmo grupo disciplinar;
iii) seja titular de formação em avaliação do desempenho ou supervisão pedagógica ou detenha experiência profissional em supervisão pedagógica;
para que passe a ser o coordenador de departamento a assumir a função de avaliador interno — independentemente dos docentes avaliados serem ou não serem do seu grupo disciplinar e independentemente dos docentes avaliados serem ou não serem de escalão igual ou inferior ao seu. Quer isto dizer que voltaremos a ter, por exemplo, um professor de contabilidade a avaliar cientifica e pedagogicamente um professor de geografia (e vice-versa), ou um professor de educação física a avaliar cientifica e pedagogicamente um professor de artes (e vice-versa).
i) esteja integrado em escalão igual ou superior ao do professor avaliado;
ii) seja do mesmo grupo disciplinar;
iii) seja titular de formação em avaliação do desempenho ou supervisão pedagógica ou detenha experiência profissional em supervisão pedagógica;
para que passe a ser o coordenador de departamento a assumir a função de avaliador interno — independentemente dos docentes avaliados serem ou não serem do seu grupo disciplinar e independentemente dos docentes avaliados serem ou não serem de escalão igual ou inferior ao seu. Quer isto dizer que voltaremos a ter, por exemplo, um professor de contabilidade a avaliar cientifica e pedagogicamente um professor de geografia (e vice-versa), ou um professor de educação física a avaliar cientifica e pedagogicamente um professor de artes (e vice-versa).
Neste governo, a incompetência técnica, a desonestidade e a fraude políticas não têm limites.