Depois de termos visto, nos textos anteriores, alguns dos graves problemas de concepção e operacionalização de que o conselho geral enferma, proponho que dediquemos agora alguma atenção ao órgão que, dentro do organograma do actual modelo de gestão das escolas, surge na segunda posição hierárquica: o director.
Esta segunda posição na hierarquia é segunda apenas no plano formal, porque, pelas razões já apontadas (composição do conselho geral e ausência de condições para a plena assunção das suas competências), o director ocupa, de facto, a primeiríssima posição na hierarquia. Resulta daqui uma situação particularmente perigosa e inaceitável:
— devido à incapacidade efectiva do conselho geral exercer as suas funções, as competências de direcção que lhe estão atribuídas são, na prática, exercidas pelo director, acumulando-as, assim, com as competências de administração e gestão que a lei já lhe confere.
Deste modo, uma só pessoa passa a ter o poder efectivo de dirigir, de administrar e de gerir uma escola em todas as áreas: pedagógica, cultural, administrativa, financeira e patrimonial.
— devido à incapacidade efectiva do conselho geral exercer as suas funções, as competências de direcção que lhe estão atribuídas são, na prática, exercidas pelo director, acumulando-as, assim, com as competências de administração e gestão que a lei já lhe confere.
Deste modo, uma só pessoa passa a ter o poder efectivo de dirigir, de administrar e de gerir uma escola em todas as áreas: pedagógica, cultural, administrativa, financeira e patrimonial.
Mas comecemos pelo princípio, comecemos pela concepção que sustentou a opção política de se criar um órgão unipessoal (director) em substituição de um órgão colectivo (conselho executivo/directivo).
Quando este modelo foi discutido na Assembleia da República, Sócrates e Rodrigues não se cansaram de dizer, com desmedida ênfase, que a introdução de um órgão unipessoal na gestão das escolas iria permitir criar «lideranças fortes». Assim mesmo: «lideranças fortes». Diziam que, com a institucionalização da figura do director, passaríamos a ter boas lideranças e eficazes lideranças. (É impressionante a facilidade com que o mais grosseiro senso comum sobe à tribuna política, se faz ideologia e se impõe a um país).
A propósito desta noção de liderança forte e de como ela se alcança, é oportuno recordar uma afirmação atribuída a Lao-Tsé: «Quando um verdadeiro líder dá o seu trabalho por terminado, as pessoas dizem que tudo aconteceu naturalmente». Sócrates e Rodrigues não faziam, e certamente continuam a não fazer, a mais pequena ideia do que isto significa. Pensavam, e certamente continuam a pensar, que as lideranças fortes podem ser instituídas por decreto, que basta anunciar «quem manda é só um» para que esse um se transforme em líder. Na verdade, para Sócrates e Rodrigues, líder forte é sinónimo de mandante. Mas esta é a concepção provinciana, medíocre, parola de liderança.
Deste modo, e mais uma vez, a partir de ideias amontoadas e mal pensadas, implementou-se uma solução híbrida: colocar um só homem, um executivo, um CEO a gerir — satisfazendo, assim, a crença naïf e o desígnio ideológico de equiparar a escola a uma empresa — concedendo-se, por outro lado, mas a contragosto, que esse órgão unipessoal (ainda) fosse ocupado por um professor. Contudo, esta concessão foi feita somente porque não existiam condições políticas para levar até ao fim a ideia inicial de criar uma carreira à parte da carreira docente: a carreira de gestor — algo que, curiosamente, está previsto no programa eleitoral do PSD.
Assim, com pressupostos falsos e sem fundamento sério, foram realizadas alterações radicais na natureza do órgão de gestão e administração das escolas.
Na realidade, é falso que, mesmo do ponto de vista formal da assunção de responsabilidades, não existisse, nos anteriores modelos de gestão, um rosto, não existisse um primeiro responsável a quem pedir contas. Esse rosto e esse responsável sempre existiu e sempre foi o presidente do conselho executivo (ou, na versão anterior, o presidente do conselho directivo). Em nenhuma circunstância existiram dúvidas sobre isto, nem da parte dos professores nem da parte do ministério da Educação. Aliás, sempre que foi necessário instaurar processos disciplinares por negligência na gestão, o ministério da Educação nunca teve dúvidas sobre quem deviam recair esses processos: os presidentes dos conselhos executivos/directivos. Sempre que o ministério da Educação quis apurar responsabilidades nunca teve dúvidas sobre a quem as devia pedir: aos presidentes dos conselhos executivos/directivos.
O problema da inexistência de um primeiro responsável é, pois, um problema falso assente numa proposição mentirosa.
Por outro lado, se o que verdadeiramente se pretendia era a promoção de lideranças fortes, o que deveria ter sido feito era precisamente o oposto: não adulterar a natureza do órgão que geria e administrava as escolas, mas enaltecer e desenvolver as suas potencialidades.
É em contexto de trabalho de equipa que se vê quem é naturalmente líder. Uma liderança, para o ser, de facto, não se impõe de cima para baixo, revela-se e é reconhecida, pela forma como é exercida e pelo projecto que a anima. Liderança quer dizer capacidade de persuasão, capacidade de mobilização de vontades e de coordenação de equipas.
Ninguém é líder porque passou a ter o estatuto de director, esse estatuto, só por si, a única coisa que pode propiciar é a categoria de mandante, mas isso nada tem que ver com liderança.
Continua na próxima semana.
Deste modo, e mais uma vez, a partir de ideias amontoadas e mal pensadas, implementou-se uma solução híbrida: colocar um só homem, um executivo, um CEO a gerir — satisfazendo, assim, a crença naïf e o desígnio ideológico de equiparar a escola a uma empresa — concedendo-se, por outro lado, mas a contragosto, que esse órgão unipessoal (ainda) fosse ocupado por um professor. Contudo, esta concessão foi feita somente porque não existiam condições políticas para levar até ao fim a ideia inicial de criar uma carreira à parte da carreira docente: a carreira de gestor — algo que, curiosamente, está previsto no programa eleitoral do PSD.
Assim, com pressupostos falsos e sem fundamento sério, foram realizadas alterações radicais na natureza do órgão de gestão e administração das escolas.
Na realidade, é falso que, mesmo do ponto de vista formal da assunção de responsabilidades, não existisse, nos anteriores modelos de gestão, um rosto, não existisse um primeiro responsável a quem pedir contas. Esse rosto e esse responsável sempre existiu e sempre foi o presidente do conselho executivo (ou, na versão anterior, o presidente do conselho directivo). Em nenhuma circunstância existiram dúvidas sobre isto, nem da parte dos professores nem da parte do ministério da Educação. Aliás, sempre que foi necessário instaurar processos disciplinares por negligência na gestão, o ministério da Educação nunca teve dúvidas sobre quem deviam recair esses processos: os presidentes dos conselhos executivos/directivos. Sempre que o ministério da Educação quis apurar responsabilidades nunca teve dúvidas sobre a quem as devia pedir: aos presidentes dos conselhos executivos/directivos.
O problema da inexistência de um primeiro responsável é, pois, um problema falso assente numa proposição mentirosa.
Por outro lado, se o que verdadeiramente se pretendia era a promoção de lideranças fortes, o que deveria ter sido feito era precisamente o oposto: não adulterar a natureza do órgão que geria e administrava as escolas, mas enaltecer e desenvolver as suas potencialidades.
É em contexto de trabalho de equipa que se vê quem é naturalmente líder. Uma liderança, para o ser, de facto, não se impõe de cima para baixo, revela-se e é reconhecida, pela forma como é exercida e pelo projecto que a anima. Liderança quer dizer capacidade de persuasão, capacidade de mobilização de vontades e de coordenação de equipas.
Ninguém é líder porque passou a ter o estatuto de director, esse estatuto, só por si, a única coisa que pode propiciar é a categoria de mandante, mas isso nada tem que ver com liderança.
Continua na próxima semana.