Uma história persa mostra quando, por um escasso momento, a estupidez e a inteligência andaram juntas.
Um beduíno, que seguia sentado num camelo carregado com dois sacos, encontrou um homem que lhe perguntou:— Que leva o teu camelo?— De um lado um saco cheio de trigo — respondeu o beduíno — e do outro um saco cheio de areia.— Por que razão fazes isso?— Para equilibrar a carga.— Era melhor repartir o trigo pelos dois sacos — disse o homem. — Assim, a carga do teu camelo seria menos pesada.O beduíno ficou impressionado com a inteligência deste conselho.— Mas tens razão! — exclamou ele. — Tens mil vezes razão! O teu pensamento é fino, subtil! Sobe para o meu camelo, vem!O beduíno ajudou o homem a subir para o camelo e disse-lhe:—Quem és tu? Um homem inteligente como tu deve ser sultão, ou pelo menos vizir!— Não, não sou nada.— Mas és rico?— Não. Olha para a minha roupa.— Que espécie de comércio praticas? Onde é a tua casa, onde está a tua loja?— Não tenho loja, nem casa.— E os teus camelos? As tuas vacas?— Não tenho disso.— Mas então, como uma inteligência assim, o que tens?— Não tenho nada, já te disse, nem tenho um bocado de pão para comer. E as minhas roupas são andrajos.— Desce deste camelo! — exclamou o beduíno. — Vai-te embora! Leva para longe de mim a tua inteligência perigosa, que eu não quero perder a minha estupidez!Os dois homens separaram-se para sempre e o beduíno continuou o seu caminho, um saco de trigo de um lado e um saco de areia do outro.
Jean-Claude Carrière, Tertúlia de Mentirosos, Teorema (adaptado).