sábado, 2 de novembro de 2013

Acerca da crise e da corrupção (11)

«Não por acaso, muitos dos políticos dos diferentes partidos que promoveram as negociações [das PPP] em nome do Estado, integram agora os órgãos sociais dos concessionários reiteradamente beneficiados. Todos os ministros das Obras Públicas de referência do regime estão ligados às PPP. O ministro do sector no tempo de Cavaco Silva, Ferreira do Amaral, preside à Lusoponte, detentora da ponte Vasco da Gama, projecto que concebera enquanto governante. O seu sucessor no governo socialista, Jorge Coelho, administra o grupo Mota Engil, maior detentor de PPP rodoviárias em Portugal. Já o titular da pasta no consulado de Durão Barroso, Valente de Oliveira, pertence também ao mesmo conselho de administração da mesma Mota Engil. Aqui se cruzam e cruzaram Rangel de Lima, antigo presidente das Estradas de Portugal com Luis Parreirão, ex-secretário de Estado das Obras Públicas. Também Almerindo Marques, que presidiu às Estradas de Portugal, transitou para a presidência das obras públicas no grupo Espírito Santo. A transferência sistemática para grupos privados dos agentes públicos que decidem sobre PPP é obscena, mas parece recolher o apoio e mesmo a admiração de políticos no poder.
É o que se pode ler da decisão da Câmara do Porto de atribuir, a 25 de Abril de 2012, a medalha de ouro do município ao presidente do grupo Mota Engil. António Mota personifica a promiscuidade entre política e negócios. O grupo a que preside tem sido dos mais favorecidos pelos sucessivos governos, sustentando-se dessa enorme manjedoura que é o orçamento de Estado. E em todos os escândalos em que aparece envolvido, o grupo Mota escapa incólume. Foi assim com a prorrogação dos contratos da Lisconte ou com a operação Furacão em que foi arguido. Vem de longe a sua tradição de contratar políticos menos escrupulosos como Duarte Lima que, já enquanto líder parlamentar do PSD no tempo de Cavaco Silva, representava os interesses do grupo Mota. António Mota colecciona políticos de todos os quadrantes, cuja utilidade vai do tráfico de influências a favor dos seus negócios até à vassalagem, com a atribuição de comendas ou medalhas.
Entretanto, o grupo Mota Engil é o maior operador na área das parcerias público-privadas rodoviárias, nomeadamente nas designadas "ex-SCUT". É ainda o accionista de referência da Lusoponte, empresa detentora da ponte Vasco da Gama.
Quando a troika chegou a Portugal, em 2011, os quadros superiores do FMI, da União Europeia e do BCE ficaram atónitos com o nível de remuneração que era garantido aos concessionários das PPP.»
Paulo Morais, Da Corrupção à Crise — Que Fazer?, Gradiva.