«Uma das invenções mais perversas deste regime foi a proliferação de fundações. Nasceram como cogumelos na esfera privada, não para beneficiar a sociedade, mas para sugar recursos ao Estado. Multiplicaram-se também no domínio público, como organismos da administração sem qualquer controlo. Com recursos públicos, funcionam a favor dos seus dirigentes, sem qualquer escrutínio da opinião pública, sem qualquer controlo ou auditoria.
Uma verdadeira Fundação é uma entidade cujo instituidor, dispondo de meios avultados, de um fundo, decide disponibilizar esses recursos à comunidade para prosseguir um dado desígnio social, um qualquer benefício colectivo.
Nesta perspectiva, as fundações públicas nem sequer são fundações. São apenas departamentos da administração central ou local travestidos, com um estatuto que lhes permite funcionar de forma encoberta. Os seus directores não estão sujeitos a regras da administração pública e podem acordar negócios sem qualquer limite, permitindo-se ainda recrutar pessoal sem concurso. É-lhes assim permitido utilizar os recursos públicos em função dos seus interesses e dos seus negócios privados.
Já quanto às fundações privadas, podemos dividi-las em três grupos. Temos as que prosseguem um fim social útil, mas vivem maioritariamente de recursos públicos. Mas, se não dispõem de facto de fundos próprios, podemos considerá-las instituições de solidariedade ou associações, contudo, não fundações. Devem, por isso, mudar de regime e de estatuto.
Há um outro grupo cujos instituidores são personalidades com muitos recursos que registam os seus bens pessoais em nome de fundações particulares, mas que nada dão à sociedade. Com este esquema, ficam isentos de pagar IRC na sua actividade, os seus terrenos e prédios não pagam os impostos a que está obrigado o comum dos cidadãos, como o IMT e o IMI. Até alguns dos seus automóveis ficam isentos de pagar imposto de circulação e imposto automóvel. Este cavalheiros conseguem desta forma um paraíso fiscal próprio, ou seja, verdadeiras off-shore em território nacional. A estas fundações, que apenas servem para mascarar intentos de benefícios fiscais indevidos, retirem-lhes o estatuto de utilidade pública.
No final, restarão apenas cinco ou seis genuínas fundações [...]. São os casos d[a] Gulbenkian, Champalimaud e pouc[a]s mais. [...]
Em resumo, as fundações públicas devem ser extintas e as fundações privadas sem recursos têm de mudar de regime. E aquelas que, embora dispondo de muitos meios, não perseguem um fim social visível e proporcional aos benefícios que recebem, devem perder o seu estatuto de utilidade pública. Esta verdadeira limpeza e higienização levará à anulação de centenas destas entidades.»
Paulo de Morais, Da Corrupção à Crise — Que Fazer?, Gradiva.