quarta-feira, 28 de maio de 2014

Professores Contratados: Comunicados 1 e 2 da ANVPC


Recebido por e-mail o pedido de divulgação dos seguintes comunicados da direcção da ANVPC:

Comunicado 1 – 27.05.2014

“A portaria da DISCORDÂNCIA e da DÚVIDA”

No que concerne à publicação da Portaria n.º 113-A/2014 de 26 de maio de 2014 (vagas do concurso externo extraordinário de acesso à carreira doente), a ANVPC tece as seguintes considerações:
1)      Esta organização estranha, antes de mais, que esta portaria, com a importância com que a mesma se reveste para várias dezenas de milhares de professores, seja curiosamente publicada no dia posterior ao das eleições europeias;
2)      Depois de um estudo cuidado não se encontra, novamente, qualquer critério adjacente quer ao número de vagas apresentadas, quer à sua distribuição pelos vários grupos de recrutamento. Nessa medida, a ANVPC requere, publicamente, que o MEC torne público o(s) critério(s) objetivo(s) quer para a abertura de apenas 1954 vagas, quer para a sua estranha distribuição pelos grupos de recrutamento atualmente existentes. O conceito de “Necessidades Permanentes do Sistema” continua, à data, a ser absolutamente nebuloso, num país democrático, onde todos os atos legislativos deveriam ser transparentes, e não aparentemente subjacentes a profundos princípios ideológicos;
3)      Tendo em conta o panorama acima referido, esta associação apresentará, nas próximas semanas, nova denúncia à Comissão Europeia, demonstrando o número insuficiente de vagas disponibilizadas pela tutela, tendo paralelamente em conta alguns grupos específicos onde não foram aberturas quaisquer vagas, ou consideradas absolutamente insuficientes face ao número de contratações dos últimos anos, apresentando casos concretos de indivíduos com mais de 3, 5, 10, 15 ou mais contratos completos sucessivos anuais, aos quais não é dada, novamente, oportunidade de entrada nos quadros;
4)      Esta associação lamenta, por fim, o ataque severo à Educação Artística, realizado por parte desta equipa ministerial nos últimos anos, e agora uma vez mais preconizado, já que, a título de exemplo, na presente portaria, no grupo de Música e de Artes Visuais não é disponibilizada qualquer vaga nacional a concurso, quando vêm sendo contratados inúmeros docentes há mais de 5, 10 ou 15 anos, sem que nunca lhes tenha sido permitida a entrada nos quadros. 
A ANVPC - Associação Nacional dos Professores Contratados apela a todos os docentes contratados que não se revêem neste normativo a darem início imediato às suas ações judiciais individuais, pela vinculação (via ANVPC ou juntos dos seus sindicatos/associações), cujo prazo para o final da 1ª fase foi recentemente estabelecido por esta associação de professores. (Ver mais em: http://anvpc.org/prazo-para-desenvolvimento-das-acoes-judiciais-para-a-vinculacao-dos-professores-contratados-1a-fase/ ).       

A direção da ANVPC 

Comunicado 2 – 27.05.2014

“ENVIO DE PEDIDO DE ESCLARECIMENTO AO MEC: Apresentação dos critérios objetivos de abertura do número de vagas e de distribuição das mesmas pelos grupo de recrutamento vigentes”

A ANVPC - Associação Nacional dos Professores Contratados, em conformidade com o COMUNICADO Nº1 hoje emitido (disponível em: http://anvpc.org/a-portaria-da-discordancia-e-da-duvida/ ) relativo à publicação da Portaria n.º 113-A/2014 de 26 de maio de 2014 (vagas do concurso externo extraordinário de acesso à carreira doente), requereu formalmente, ao início da tarde, a Sua Excelência o Ministro da Educação e Ciência,  que torne públicos, com a máxima urgência, os critérios objetivos de abertura do número de vagas (1954), assim como os de distribuição das mesmas pelos grupo de recrutamento vigentes.  

A direção da ANVPC

domingo, 25 de maio de 2014

Poemas

PÁTRIA

Por um país de pedras e vento duro
Por um país de luz perfeita e clara
Pelo negro da terra e pelo branco do muro

Pelos rostos de silêncio e de paciência
Que a miséria longamente desenhou
Rente aos ossos com toda a exactidão
Dum longo relatório irrecusável

E pelos rostos iguais ao sol e ao vento

E pela limpidez das tão amadas
Palavras sempre ditas com paixão
Pela cor e pelo peso das palavras
Pelo concreto silêncio limpo das palavras
Donde se erguem as coisas nomeadas
Pela nudez das palavras deslumbradas

- Pedra   rio   vento   casa
Pranto   dia   canto   alento

Espaço   raiz   e água
Ó minha pátria e meu centro

Me dói a lua me soluça o mar
E o exílio se inscreve em pleno tempo


Sophia de Mello Breyner Andresen

sexta-feira, 23 de maio de 2014

No próximo domingo

Imagem sem identificação do autor
É impressionante o cinismo político daqueles que tendo revelado, no decurso dos últimos cinco anos, nos seus países e na Europa, um enorme desprezo pelas pessoas solicitam agora o seu voto. Na verdade, só um desmedido cinismo pode justificar que os responsáveis pelas políticas de brutal empobrecimento de milhões de europeus se sintam capazes de vir para a rua pedir o apoio daqueles que maltrataram. Acresce que estas políticas são igualmente responsáveis pelo extraordinário fomento do chauvinismo, da xenofobia, do racismo, dos nacionalismos e de todos os movimentos de extrema-direita que pela Europa pululam. Crescem os grupos fascistas e nazis, cresce o número de agressões e insultos de que são alvo milhares de migrantes de diversos países europeus, crescem as tentativas de expulsão dos estrangeiros, cresce a divisão entre países do norte e países do sul da Europa, crescem os sinais de  animosidade entre nações, e os responsáveis por estas bestialidades andam de rua em rua, a pedir votos, sorridentes e alegres, como inimputáveis. A História ainda não os julgou, mas julgará. O retrocesso civilizacional que estamos a viver tem protagonistas, não acontece por geração espontânea. Os chefes de Estado e de governo dos países membros da União Europeia, a Comissão Europeia e, em particular, o seu presidente, a maioria dos eurodeputados, o BCE, os banqueiros europeus, os plutocratas e os governos nacionais servis constituem o núcleo gerador do movimento regressivo em que estamos envolvidos. Não há dúvidas de que a História lhes apontará a mediocridade e a incompetência que os enforma, assim como mostrará os interesses que serviram e de que se serviram, mas a vida é feita no presente, em função das opções e dos actos de agora. E agora é necessário fazer rupturas. Uma das muitas rupturas a fazer é a do rompimento com essa enorme família que alberga a direita, o centro-direita e o centro-esquerda que tem governado os países da Europa e tem governado a União Europeia, e que nos conduziu à gravemente injusta e perigosa situação em que nos encontramos.
Um sinal do início desse inevitável processo de ruptura, deveria ser dado, através do voto, no próximo domingo.

segunda-feira, 19 de maio de 2014

O arco da desgovernação

Imagem sem identificação do autor
No próximo domingo teremos eleições europeias e, o mais tardar, daqui a um ano e meio eleições legislativas.
Nos quarenta anos de regime democrático que levamos, os eleitores portugueses têm atribuído sistematicamente as vitórias eleitorais ao PSD ou ao PS. Foi sempre um destes partidos que venceu as eleições, quer sejam legislativas, autárquicas ou europeias. 
Desde 1976, com a excepção de um curto período de cerca de dois anos, em que existiram governos chefiados pelos designados independentes, todos os primeiros-ministros têm sido do PS ou do PSD. A lista:
- 1976 a 1978 - Mário Soares (PS);
- 1978 - Mário Soares (PS em coligação com o CDS);
- 1978 a 1980 - Governos de iniciativa presidencial;
- 1980 a 1981 - Sá Carneiro (PSD em coligação  com o CDS);
- 1981 a 1983 - Pinto Balsemão (PSD em coligação com o CDS);
- 1983 a 1985 - Mário Soares (PS em coligação com o PSD);
- 1985 a 1995 - Cavaco Silva (PSD);
- 1995 a 2002 - António Guterres (PS);
- 2002 a 2004 - Durão Barroso (PSD em coligação com o CDS);
- 2004 a 2005 - Santana Lopes (PSD em coligação com o CDS);
- 2005 a 2011 - Sócrates (PS);
- 2011 - actualidade - Passos Coelho (PSD em coligação com o CDS).

As contas mostram 19 anos de governos do PSD, 17 anos de governos do PS e 9 anos de participação do CDS no governo. Até hoje, tivemos 6 primeiros-ministros do PSD e 3 primeiros-ministros do PS. Isto é, os partidos responsáveis pela evolução que o país levou nos últimos 38 anos são o PSD, o PS e o CDS (o designado arco da governação); e os chefes de governo com mais responsabilidades são: Cavaco Silva (10 anos), António Guterres (6 anos), Sócrates (6 anos), Mário Soares (4 anos) e Passos Coelho (3 anos).
Desde 1976 até agora, existiu uma linha mais ou menos contínua, com excepção de um ou outro ziguezague, que marcou o rumo destes governos e a acção destes primeiro-ministros. Essa linha definiu-se e define-se pelo aprofundamento de privilégios e de condições favoráveis a quem é detentor de capital e pelo agravamento das condições e dos direitos de quem trabalha. Os últimos nove anos (de Sócrates e Passos Coelho) são particularmente relevantes desta orientação comum ao PS e ao PSD.
Na verdade, nada de substancial distingue estes dois partidos. As diferenças residem apenas em pequenas nuances de ritmo e de intensidade com que trilham o mesmo caminho. Desde Mário Soares que o PS desbrava caminho para o PSD. Apesar da retórica do PS, algumas vezes até inflamada, que reclama combates e heroicidades de esquerda, a realidade mostra que a prática não corresponde à prosa. A política da educação nos governos de Sócrates foi um exemplo paradigmático, objecto de entusiástico aplauso de toda a direita, em particular, da ideologicamente mais elitista e retrógrada. Mas também na política externa, nas privatizações, nas finanças, nas obras públicas, na justiça, na segurança social, nos transportes, etc., as diferenças são nulas ou quase. O mesmo acontece com os actuais cabeças de lista de ambos os partidos nas próximas eleições europeias. No que diz respeito à Europa, Rangel e Assis competem apenas na estridência dos discursos e em nada mais.

O PS tem sido dominado pelos mesmos interesses que dominam o PSD, e têm sido eles que, em diferentes momentos históricos, determinam as políticas nas áreas da governação. Dentro do PS, o pensamento divergente da replicação rosada do PSD tem sido quase sempre irrelevante.
Vivemos, desde 1976, debaixo do arco da desgovernação: PSD, PS e CDS são os responsáveis pelo estado a que chegámos.
Não há nenhuma razão que justifique continuarem a ser eles a merecer o voto dos eleitores portugueses.

domingo, 18 de maio de 2014

Pensamento


«Despendo mais energia numa discussão com minha mulher do que em cinco conferências de imprensa.»
Charles de Gaulle
In Paulo Neves da Silva, Dicionário de Citações, Âncora Editora.

sexta-feira, 16 de maio de 2014

O Avaliador

É com muito prazer que divulgo a publicação do livro O Avaliador, de Álvaro Ferreira Gomes, meu prezado amigo e colega, que tive o gosto de preambular.
A sinopse que se segue é do autor.

A novela O AVALIADOR, uma obra de ficção, mas que muito se aproxima da realidade, foi delineada e escrita durante a vigência do modelo de Avaliação do Desempenho Docente das ministras Lurdes Rodrigues e Isabel Alçada, no tempo político de José Sócrates. Uma avaliação 'entre os pares'. Na altura, esse modelo de Avaliação, e tudo o que estava ligado à carreira docente, dominavam o espaço mediático. Passavam-se para a opinião pública, entre tantas falsidades, as ideias de que a maioria dos professores não queria ser avaliado e a de que a Avaliação era uma peça fundamental (até como exemplo de ‘rigor’), no sentido da vocação salvífica da regeneração social e económica do país. Era preciso e urgente avaliar. 
Uma boa avaliação, pois.

Encarreirados e disciplinados os professores, já que se estava numa ‘carreira docente’, tornava-se premente criar toda uma panóplia de instrumentos, verbi gratia grelhas, que dessem aos sucessivos políticos, e através deles aos ‘aplicadores’, um meio eficaz de aferir, comparar, controlar, dominar, escalonar, etc.. Em suma, levar aos píncaros da eficácia o sistema pedagógico lusitano, e daí congregar energias para a salvação económica. 

É uma novela que qualquer cidadão pode ler. E poderá até divertir-se, lendo-a. A figura singular do Dr. António de Jesus, historiador por vocação, emerge nela, em sua humanidade. Ele dedica a sua solidão existencial a várias frentes de investigação, que tanto o deleitam. Inopinadamente, devido à sua robusta idade, é nomeado Avaliador, mais propriamente Relator, o que não deixou de ser um elo precioso na cadeia da Avaliação. Começa então mais um inferno em sua vida, para além de outros. 

É o 6.º escrito publicado do autor. Este título aparece em edição de autor, em número muito limitado, pois que os cortes brutais nos salários e/ou pensões tal não permitem mais. Por outro lado, embora o autor já tenha dois pequenos escritos (em coparticipação) na Editora Esfera do Caos, tem a certeza de que o trabalho editorial hoje é em grande parte dedicado ou à escrita/leitura de obras ‘de aeroporto’ ou a escritos que possam dar o guião a uma novela que arrebate audiências, se possível em horário nobre. 

Tem um preâmbulo do meu estimadíssimo amigo e colega Professor Mário Carneiro, que ajuda a perceber a ‘odisseia’, por vezes onírica, todavia partindo da realidade, em que se tornou a vida do Avaliador-Relator-Historiador António de Jesus. 

O autor desejava ser lido. Acima de tudo. O mediático pouco lhe interessa, até porque a verdadeira cultura é cada vez mais franja remota nesta sociedade que rejeita o humanismo, que até o Coração esquece. E que se entrega por demais ao divertissement (Blaise Pascal). 
Envio à cobrança a partir de 19 de Maio, por 13 euros (portes incluídos) um exemplar autografado a quem o desejar e mo pedir para o e-mail: ajfg25abril@hotmail.com.

Álvaro José Ferreira Gomes

quarta-feira, 14 de maio de 2014

Trechos — Joseph Stiglitz (12)


«Esta narrativa à volta das transformações de mercado e do contributo das forças de mercado para uma crescente desigualdade ignora o papel que o Estado desempenha na configuração do dito mercado. Grande parte dos empregos que não foram mecanizados (e que provavelmente não serão tão cedo) pertencem ao setor público, à área do ensino, da saúde e por aí adiante. Se tivéssemos decidido pagar mais aos nossos professores, poderíamos ter atraído e mantido melhores professores, e isso poderia ter melhorado o desempenho económico global a longo prazo. Permitir que os salários da função pública descessem foi uma decisão política.»
Joseph E. Stiglitz, O Preço da Desigualdade, Bertrand Editora.

domingo, 11 de maio de 2014

Acerca da via única

De repente, a vida e o mundo ficaram reduzidos a um pensamento e a uma via. Esse pensamento e essa via trazem riqueza e bem-estar a 1% e trazem pobreza e sofrimento a 99%. Apesar disso, é-nos afirmado que não existe outro modo de viver, que nenhuma outra alternativa é viável e que o bom senso exige conformismo e aceitação desta inevitabilidade.
Devido a uma «lei» da natureza humana por todos desconhecida, o mundo parece só poder ser organizado desta forma: possibilitar um incomensurável poder financeiro e económico a uma escassa minoria e reduzir a vida de todos os outros à gestão da sua sobrevivência ou pouco mais.
Este cenário eticamente desprezível não tem fundamento científico nem filosófico nem político, mas tem um fundamento ideológico, ainda que publicamente não confessado, que assenta num pressuposto: existem seres humanos detentores de uma genética que os faz superiores aos demais, e dessa superioridade decorre o natural acesso a um restrito mundo de privilégios. No fundo, a ideia é simples: os pobre são pobres porque não têm capacidade para serem ricos e os ricos são ricos porque possuem essa capacidade.
Esta proto-teoria, e a selvajaria que ela encerra, está a ser acarinhada e difundida como nunca antes o tinha sido. O enorme poder financeiro e económico do clube dos 1% possibilita e facilita a difusão desta visão do mundo à escala planetária. A sua impressionante capacidade de intervir e de manipular todos os sectores da actividade social transforma aquilo que é uma interesseira e ordinária perspectiva de vida numa «verdade» aparentemente universal e acatada. 
Da pregação deste ideário, estão encarregados os responsáveis políticos, jornalistas, cronistas sociais e comentaristas, que, por interesse ou ingenuidade, se voluntariam para a função. É pressuroso o exército de apóstolos: primeiros-ministros subservientes, ministros servis, directores de jornais e jornalistas amplificadores da voz de quem paga, cronistas aduladores e comentantes alvares. 
Todavia, é necessário introduzir um outro elemento nesta narrativa: o cidadão que vota e que tem a possibilidade de intervir politicamente, sindicalmente, civicamente. Uma parte do imenso poder que a classe dominante detém é-lhe facultada pelo anónimo cidadão. Na verdade, a persistência nos mesmos padrões de comportamento social e político — votando sempre nos partidos que, há décadas, (des)governam o seu país ou abstendo-se de intervir activamente nos múltiplos processos reivindicativos ou contestatários — conduz à manutenção e ao fortalecimento do sistema e dos seus protagonistas. 
Enquanto não formos capazes de votar e de agir de modo diferente, a via manter-se-á única.

sábado, 10 de maio de 2014

Trechos — Chrystia Freeland (3)

«O que se torna mais relevante para a nossa época é que os ricos de hoje também são diferentes dos ricos de ontem. A nossa economia à velocidade da luz e globalmente interligada levou à ascensão de uma nova superelite [...]
Num memorando de 2005, [o Citigroup refere] que "O mundo está a dividir-se em dois blocos — a Plutonomia e o resto. Numa Plutonomia [...] há consumidores ricos, poucos, e desproporcionados quanto à gigantesca fatia de rendimento e de consumo que tomam para si, e há o resto, os não ricos, uma multidão de muitos, mas que representam uma parte surpreendentemente pequena do bolo nacional." [...]
Mais recentemente, o Citigroup concebeu uma variação do tema, uma tese a que chamou "teoria do consumidor clepsidra". A ideia é que, em consequência da divisão da sociedade entre ricos e o resto, um investimento inteligente será comprar as ações de produtores de bens superluxuosos (as companhias que vendem aos plutocratas) e as de empresas de baixo preço, que vendem aos outros todos. (Como a classe média está a ser esvaziada, pressupõe esta hipótese, as empresas que a fornecem também.)»
Chrystia Freeland, Plutocratas, Temas e Debates — Círculo de Leitores.

sábado, 3 de maio de 2014

Poemas

EU ÀS SEGUNDAS-FEIRAS NICAMOR ME CHAMAVA

    Eu às segundas-feiras Nicamor me chamava.
Vingava o tédio horrível dos domingos
e perturbava umas horas as donzelas
e os horóscopos.

    A terça-feira é um belo dia para chamar-se Adriano.
Com isso vence-se o malefício da jornada
e pode entrar-se com o pé feliz na rubra pradaria
da quarta-feira,
quando é tão agradável informar os amigos
que nesse dia todo nosso nome é Cristóvão.

    Outrora eu escamoteava a guilhotina do tempo
mudando de nome cada dia para não ser localizado
pela senhora Aquela,
a que transforma todos os nomes num pretérito
decorado pelas lágrimas.

    Mas enfim aprendi que à quinta-feira Militão,
Recaredo sexta-feira, sábado Alexandre,
nunca impedirão de chegar ao pálido domingo inominado
quando ela baptiza e crava certeira seu venábulo
sob a máscara de um nome qualquer.

     Eu às segundas-feiras Nicamor me chamava.
E agora não me lembro em que dia nós estamos
nem como me tocaria chamar-me hoje inutilmente.

Gastón Baquero
(Trad.: José Bento)

quinta-feira, 1 de maio de 2014

A mentira como estratégia política

Há cinco dias, as celebrações oficiais dos 40 anos do 25 de Abril tiveram como principais protagonistas precisamente aqueles que mais têm destruído as benfeitorias que Abril trouxe para a maioria dos portugueses.
Hoje celebra-se o Dia do Trabalhador precisamente na altura em que o governo anuncia mais aumentos de impostos, depois de ter prometido, há poucas semanas, que não voltaria a fazê-lo.
Para Passos Coelho, a prática da mentira é uma estratégia política que, sem hesitações nem arrependimento, utiliza desde há três anos:


- Prometeu que não retiraria o 13.º mês e o subsídio de férias. Mentiu;
- Prometeu que não tomaria medidas contra a classe média. Mentiu;
- Prometeu que não utilizaria os 1000 euros de vencimento como critério de penalização fiscal. Mentiu;
- Prometeu que não faria qualquer aumento de impostos, porque a carga fiscal era suficiente. Mentiu;
- Prometeu que nunca penalizaria os funcionários públicos. Mentiu;
- Prometeu não liberalizar os despedimentos. Mentiu;
- Prometeu que não subiria o IVA. Mentiu;
- Prometeu não cortar salários. Mentiu;
- Prometeu não acabar com o IVA intermédio. Mentiu;
- Prometeu cumprir a palavra dada. Mentiu;
- Prometeu não desculpar-se com a herança do governo anterior. Mentiu.
Há dias, voltou a prometer não aumentar os impostos. Voltou a mentir. Vai aumentar dois impostos de uma só vez: o IVA e a TSU.
Esta estratégia, que é politicamente ilegítima e eticamente deplorável, desrespeita todos e destrói os alicerces do regime democrático.
Do mesmo modo que os 40 anos do 25 de Abril ficaram manchados pela medíocre qualidade dos principais protagonistas que oficialmente os celebraram, este 1º de Maio fica marcado por mais um despudorado exercício da mentira como estratégia política.