VAI-SE O ZODÍACO DE OURO
Vai-se o Zodíaco de ouro
Sobre a planura espectral.
Cochila o bicho Cachorro,
Dorme o pássaro Pardal.
As ondinas, bundalarga,
Voam rectas para o céu —
Braços fortes como varas,
Nabos de peitos sem véu.
Uma bruxa num triângulo
É fumaça e se esvaiu.
Falecidos e silvanas
Dançam cake-walk no cio.
Atrás deles, coro e pálio,
Feiticeiros caçam Mosca.
Sobre a encosta, vulto esquálido,
A lua de cara fosca.
Vai-se o Zodíaco de ouro
Pelos telhados da aldeia.
Cochila o bicho Cachorro,
Peixe-galo cabeceia.
Matraquinha tique-taca,
Dorme o animal Aranha,
Dorme a Mosca, dorme a Vaca,
O luar desemaranha.
Sobre a terra uma gamela
Entornada, jaz, enorme.
Silvano tirou tramela
Das barbas de lobisomem.
Vem a sereia descendo
Da nuvem, perna de fora.
O ogro rói o pudendo
De um gentleman de cartola.
Tudo gira em contradança,
Tudo voa e desconjunta,
Hamadríades de trança,
Pulgas, defuntos, defuntas.
Bacharel de eras passadas,
General dos novos tempos —
Meu bestunto! Estes fantasmas
São delírios sonolentos.
São delírios, desatinos,
Da mente que perde o prumo,
Pesares sem lenitivo,
Figurações do outro mundo.
Vai alta a hora terrestre,
Bestunto, velho guerreiro,
Descansa. Logo amanhece,
O sono é bom companheiro.
Que importam dúvidas? Nada!
Um dia a mais, outro a menos...
Bichos-deuses, meio termo,
Dormindo, despertaremos
No umbral de nova jornada.
Matraquinha tique-taca,
Dorme o animal Aranha,
Dorme a Mosca, dorme a Vaca,
O luar desemaranha.
Sobre a terra uma gamela
Entornada, jaz, enorme...
Dorme a planta Beringela,
Durmo eu e você dorme.
Nikolai Zabolótski
(Trad.: Haroldo Campos, Augusto de Campos e Boris Schnaiderman)