Feriar é um direito. Em Portugal, além de ser um direito é uma obrigação, para quem pretende manter alguma saúde mental. E feriar de uma forma radical, isto é, fazer férias cortando qualquer contacto com grande parte da realidade portuguesa que chega até nós através da comunicação social.
Vejamos. Desde as últimas férias, passou um ano, mas pareceu ter sido uma eternidade:
1. Passos Coelho continuou a ser politicamente insuportável, manteve a proficiência na arte do engano e da omissão e juntou ao seu curriculum de engodos aquilo que não foi capaz de esclarecer sobre o caso «Tecnoforma» e aquilo que foi descoberto acerca dos seus incumprimentos para com a Segurança Social. Numa sociedade civicamente mais exigente, estes dois casos chegariam e sobrariam para destituir um primeiro-ministro.
2. PSD e CDS continuaram a ser aquilo que são: partidos guardiães de um paradigma social e económico que preserva e desenvolve a injustiça e a desigualdade entre os cidadãos.
3. António Costa derrubou António José Seguro com o argumento de que com ele a oposição ao governo seria diferente, seria mais eficaz e mobilizaria os portugueses. Não cumpriu nenhuma destas promessas. O PS continuou a ser o que sempre foi: o partido-irmão do PSD.
4. Um ex-primeiro-ministro foi detido, por ser suspeito de ter cometido crimes graves. A esta lamentável circunstância — a de virmos a concluir que alguém que nos governou durante seis anos aproveitou esse período para enriquecer ilicitamente — juntou-se o folclore jurídico-político e o folclore da idolatria pública do preso. Pseudo-entrevistas do arguido; insultos e arrogâncias várias do advogado; cortejos, desfiles e cartazes promovidos por uma dúzia de crédulos alimentaram o populário.
5. O principal banqueiro português e toda a elite do BES e da (defunta) PT juntaram-se à infindável lista de políticos, banqueiros e empresários responsáveis pela destruição do país. As declarações que muita daquela gente proferiu na Comissão Parlamentar de Inquérito fizeram dos reality shows hinos à inocência infantil.
6. Crescimento do grupo de gente fútil e inútil que parasita em programas televisivos fúteis e inúteis e em revistas fúteis e inúteis. Várias tropas de escribas e de fotógrafos fúteis e inúteis alimentam este parasitismo. Inundam os quiosques com jornalecos e revistecas repletas de intrigas, de coscuvilhices e de poses grotescas que vão alimentando um circo ordinário.
7. Entretanto, as sondagens indicam que os portugueses continuam a pensar que os boletins de voto só contêm duas hipóteses de escolha: votar nos que destruíram o país antes deste governo ou votar nos que estão a destruir o país agora.
Que venham as férias... Até Setembro.