Fotografia de José Luís Mendes |
1. Faz hoje uma semana que os gregos se manifestaram, através de um referendo, relativamente à proposta de Memorando apresentada pelo BCE, FMI, CE e pelo Eurogrupo ao governo grego. Um decidido e estrondoso NÃO foi a resposta. Apesar da chantagem e das múltiplas ameaças, apesar do terrorismo verbal, apesar dos bancos fechados, apesar da incerteza sobre o futuro, o povo grego resistiu a tudo e a todos, com uma coragem que impressionou.
Pelo conhecimento que vamos tendo da Grécia, não parece haver dúvidas de que estamos perante um país arruinado pela corrupção e por desigualdades obscenas. A responsabilidade desta situação é dividida pelos políticos do arco da governação grego, formado pelos mesmos partidos que formam o arco da governação português, e pelos políticos europeus que são da mesma família política de ambos os arcos da governação e que foram objectivamente cúmplices da situação a que aquele país chegou.
Com a assunção de funções governativas por parte do Syriza, observámos, pela primeira vez na história da UE, um comportamento político de resistência aos interesses e aos ditames que têm dominado a política europeia. Ainda que por vezes de forma errática e com ziguezagues de difícil entendimento, pelo menos para quem está de fora, a verdade é que resistiu, contestou e desconstruiu publicamente a estratégia avassaladora que tem vindo a destruir económca e socialmente vários países europeus. Até hoje, foi o único governo que o fez. E porque defende uma política diferente que colide com os interesses instalados, o governo grego é um alvo a abater pelos governantes dos outros dezoito países do euro. É por isso que, apesar das enormes cedências que os seus responsáveis aceitaram fazer (algumas delas ultrapassando claramente as linhas vermelhas inicialmente definidas), o massacre dos dezoito prosseguiu ontem e promete continuar hoje na reunião do Eurogrupo. Agora já não é suficiente a imposição de mais um programa de austeridade, é necessária a humilhação e a descredibilização do governo que ousou e ousa pensar diferente.
Como é aceitável que homens como Dijsselbloem (presidente do Eurogrupo) ou Schäuble (ministro das Finanças da Alemanha) tenham ontem acusado os responsáveis gregos de não serem credíveis nem confiáveis, se o primeiro foi capaz de declarar no seu currículo possuir um mestrado em Economia Empresarial, pela University College Cork, quando esse programa nunca existiu nessa instituição irlandesa; e o segundo foi acusado de ter recebido dinheiro de um comerciante de armas num envelope, para financiar ilegalmente o seu partido, no tempo de Helmut Kohl?
Sem critério ético e com políticas fanáticas, o projecto europeu de paz e de bem-estar está em desmoronamento. Para este objectivo, a Grécia é apenas um pretexto.
2. Tentando contribuir para que não fiquemos sempre reféns da falta de seriedade jornalística de uma parte da nossa comunicação social, que deturpa ou omite parcial ou totalmente informação relevante, aqui fica a tradução integral, realizada pela página electrónica InfoGrécia, do discurso proferido pelo primeiro-ministro grego no Parlamento Europeu, na passa terça-feira:
Senhores Deputados,
É uma honra para mim falar neste verdadeiro templo da democracia europeia. Muito obrigado pelo convite. Tenho a honra de me dirigir aos representantes eleitos dos povos da Europa, num momento crítico tanto para o meu país, a Grécia, como para a zona euro e também para a União Europeia como um todo.
Encontro-me entre vós, apenas alguns dias após o forte veredito do povo grego, seguindo a nossa decisão de lhes permitir expressar a sua vontade, para decidir diretamente, para tomar uma posição e para participar ativamente nas negociações sobre o seu futuro. Apenas alguns dias após o seu forte veredito instruindo-nos a intensificar os nossos esforços para alcançar uma solução socialmente justa e financeiramente sustentável para o problema grego – sem os erros do passado que condenaram a economia grega, e sem a austeridade perpétua e sem esperança que tem aprisionado a economia num círculo vicioso de recessão, e a sociedade numa depressão duradoura e profunda. O povo grego fez uma escolha corajosa, sob uma pressão sem precedentes, com os bancos fechados, com a tentativa por parte da maioria dos meios de comunicação social de aterrorizar as pessoas no sentido que um voto NÃO levaria a uma rutura com a Europa.
É um prazer estar neste templo da democracia, porque acredito que estamos aqui para ouvir primeiro os argumentos para, em seguida, poder julgá-los. “Ataquem-me, mas primeiro ouçam o que tenho para dizer”.(Para continuar a ler, clicar aqui).