Durante vários anos, ouvimos, regular e insistentemente, que os nossos banqueiros e os seus gestores pertenciam ao grupo do melhor que havia na Europa e no mundo, no domínio financeiro. Ouvimos, regular e insistentemente, que a nossa banca estava na vanguarda da inovação e que a sua solidez era superior à de muitos dos maiores bancos estrangeiros.
E esta elite, com sobranceria, reluzia pelos corredores do poder. Conduzia negócios, punha e dispunha, discriminava financiamentos, garantia redes de interesses, alimentava especulações e aliciava as classes média e baixa para o consumismo e para o endividamento incontrolados. Simultaneamente, em fins-de-semana ou em noites quentes de Verão, organizava festas sumptuosas nas quintas, nas herdades, dos «seus» Alentejos e dos «seus» Algarves, ou nos «seus» hotéis da capital. Para além dos corredores do poder, também os corredores da fama estavam à sua disposição, com a cumplicidade subserviente e acéfala de órgãos de comunicação social. Jornais e televisões davam páginas e horas de publicidade e de engrandecimento a tudo que era evento organizado por estes protagonistas: festas de aniversário, de casamento, de baptizado, de noivado, de Verão, festa comemorativa, festa evocativa, festa porque sim e porque não eram objecto de permanentes mesuras mediáticas. Esposos, filhos, tios, primos, imensas amigas e imensos amigos enfileiravam assiduamente para a pose em frente às máquinas dos repórteres, que tinham a função, coadjuvados pelos designados «colunistas sociais», de propagandearem a notícia, de levarem ao comum dos mortais aquele glamour exclusivo.
Este mundo era o mundo modelo: quem dele fazia parte supostamente merecia essa pertença, pela sua alegada competência, pela sua alegada excelência, pela sua alegada competitividade e pela sua alegada moralidade. Constituía o paradigma da eficiência, da inteligência e dos bons costumes. À massa dos anónimos restava manifestar sentimentos de gratidão (pela sorte de haver uma elite assim preparada) e de humildade (perante a grandiosidade dos escolhidos).
Agora, ao fim destes anos de encenação orquestrada, de mitos construídos e de crimes escondidos, estamos cientes de que esta elite é uma das responsáveis (conjuntamente com a elite empresarial e a elite política que nos tem governado) pelo que de pior o nosso país está a passar. Na verdade, não há país que resista a uma ininterrupta amálgama de criminalidade, de corrupção e/ou de incompetência. A lista parece não ter fim: BPN, BPP, BCP, BES/NOVO BANCO, CGD, MONTEPIO, são siglas que não representam apenas instituições bancárias, são siglas que significam processos onde actos criminosos, actos de corrupção e/ou actos incompetentes se repetiram ao longo de anos e que contribuíram de forma determinante para a ruína do país, cujo o último episódio é o do BANIF, com mais uns milhares de milhões de euros que os contribuintes vão ter de desembolsar. Ao todo, já foram delapidados milhares de milhões de euros, que a designada massa anónima está a pagar e vai continuar a pagar, retirando a si própria verbas que poderiam e deveriam ser investidas na Saúde, na Educação, na Segurança Social, em investimento Público. É a massa dos anónimos que retira verbas dos seus salários e das suas pensões e que perde empregos para pagar a depradação e o esbulho levados a cabo pelos protagonistas da elite da excelência, da competitividade, da competência e da moralidade.
A estes responsáveis directos juntam-se os responsáveis indirectos, isto é, os dirigentes políticos e os dirigentes da entidade fiscalizadora (Banco de Portugal) que por omissão ou conivência ou subserviência possibilitaram ou ajudaram a que estas situações ocorressem. E a tudo isto junta-se ainda a vergonhosa inépcia da Justiça portuguesa. Os processos arrastam-se ano após ano e a impunidade prevalece.
Tudo isto é inaceitável, mas tudo isto continua a existir, com a complacência da designada massa anónima.