quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

Poemas


[PÁRA-ME DE REPENTE...]

Pára-me de repente o Pensamento...
— Como se de repente sofreado
Na Douda Correria... em que, levado...
— Anda em Busca... da Paz... do Esquecimento.

— Pára Surpreso... Escrutador... Atento
Como pára... um Cavalo Alucinado
Ante um Abismo... ante seus pés rasgado...
— Pára... e Fica... e Demora-se um Momento...

Vem trazido na Douda Correria
Pára à beira do Abismo e se demora

E Mergulha na Noute, Escura e Fria
Um Olhar d'Aço, que na Noute explora...

— Mas a Espora da dor seu flanco estria...

— E Ele Galga... e Prossegue... sob a Espora!

Ângelo de Lima

domingo, 22 de fevereiro de 2015

(In)dignidades

Imagem de Eduardo Almeida
A semana que agora termina foi demolidora para o governo português.

1. A assunção pública, por parte do actual presidente da Comissão Europeia, de que a tróica atentou «contra a dignidade dos portugueses, dos gregos e às vezes dos irlandeses» é o reconhecimento (tardio) de que o resgate de Portugal (da Grécia e da Irlanda) nada teve que ver com solidariedade europeia ou ajuda amiga. Foi um negócio, mas um negócio em que o credor entrou na casa do devedor, sentou-se à cabeceira da mesa da sala e passou a ditar as novas regras de funcionamento do lar. Nem um agiota se comporta assim, e muito menos os amigos. Por isso, Juncker afirma que atentaram contra a dignidade dos portugueses e dos gregos (e às vezes dos irlandeses — note-se a diferenciação...).
Esta afirmação pública constata um facto e evidencia um outro daí decorrente: o governo português não defendeu a dignidade do povo que representa. Permitiu que a sua dignidade ficasse ferida. Na verdade, o governo português, através das suas principais figuras (Passo Coelho, Paulo Portas, Vítor Gaspar, Maria Luís), foi colaboracionista nessa agressão. Foram múltiplos, repetidos e insistentes os discursos destes responsáveis políticos a enalteceram, a elogiarem, a agradecerem a «ajuda» europeia. O governo português foi protagonista activo no atentado à dignidade dos portugueses.

2. O comportamento político do primeiro-ministro e das ministra das Finanças relativamente ao problema grego/europeu faz-me sentir vergonha. Um país ser representado por políticos subservientes e bajuladores envergonha e repugna. A função a que se prestou Maria Luís Albuquerque, deslocando-se à Alemanha para se sentar ao lado do seu colega Schäuble e para, como uma marioneta política, fazer e dizer o que os alemães queriam que ela fizesse e dissesse, não tem adjectivação capaz dentro do vocabulário convencional. A decência política foi violada e, mais uma vez, a dignidade nacional foi ofendida.
A esta rebaixamento político, Passos Coelho acrescentou um discurso grosseiro sempre que se referiu ao novo governo grego. Falando como um menino birrento e mal-educado, não como um representante de um Estado, pronunciou-se de forma rasca, afirmando que os gregos querem viver à custa do dinheiro dos outros. A um primeiro-ministo exige-se mais. Linguajares desta natureza ouvimos nós de quem é involuntariamente desinformado ou de quem é voluntariamente mentiroso. De um primeiro-ministro espera-se mais decoro e mais seriedade política. Desgraçadamente, de Passos Coelho já nem isto podemos esperar.

3. A actuação do novo governo grego confirma o que todos sabíamos e sabemos e que sempre foi negado pelo governo português: que era e é possível defender políticas alternativas, que era e é possível lutar por elas, que era e é possível discutir, confrontar e combater a política do «inevitável». O exemplo grego confirma a confrangedora irrelevância política do nosso primeiro-ministro, no contexto europeu.

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

As propostas gregas e Passos Coelho

Imagem de Ricardo Araújo.
A reacção do governo português às questões de fundo que os novos responsáveis políticos da Grécia têm colocado revela a confrangedora pequenez política e ética dos nossos governantes, em particular, do nosso primeiro-ministro. O comportamento descaradamente grosseiro de apelidar de «conto de crianças» as ideias que um governo legítimo de um país soberano da União Europeia coloca à discussão e as posteriores tomadas de posição do nosso chefe de governo relativamente às propostas gregas confirmam a sua pequenez e a sua insignificância políticas.
Na realidade, em apenas uma semana, o Syriza já tentou fazer mais pelos povos da União Europeia do que Passos Coelho e Paulo Portas em quatro anos de governo. O nosso primeiro-ministro assumiu sempre, desde que tomou posse, a função de seguidor acrítico e acéfalo das determinações alemãs. Na verdade, nós não temos um governo com pensamento próprio, com vontade própria e que alguma vez tenha assumido o exercício da soberania; pelo contrário, nós temos uma espécie de agência ou delegação do governo alemão, que despacha semanalmente em Lisboa.
A Grécia é um país de dimensão semelhante à nossa, tem uma situação económico-financeira pior do que a nossa, ainda está debaixo de um processo de resgate, todavia, nada disso a impede de, neste momento, ter pensamento próprio, de ter vontade própria e de dialogar de igual para igual com os parceiros europeus.
Portugal, em quatro anos, nunca o fez. Portugal, na pessoa do seu primeiro-ministro, sempre partiu para e sempre chegou das reuniões com os governos e instituições europeias de coluna vertebral dobrada. Não tomou uma única posição de discordância de fundo em relação à política cega de austeridade, não apresentou uma única proposta alternativa ao empobrecimento e à miserabilização que a Alemanha impôs a vários países europeus. Subserviente até à náusea, Passos Coelho é um político medíocre. A história de Portugal não lhe dedicará mais do que uma linha numa escondida nota de rodapé. Caninamente obediente, Passos Coelho nunca foi nem nunca será capaz de defender uma opinião, de argumentar uma ideia que possa ser vista como heterodoxa, pelo poder alemão.
Nem Portugal nem os povos europeus poderão alguma vez esperar deste político um rasgo de inovação ou um contributo, por mínimo que seja, para a construção de algo novo, para a construção de algo que não seja monótona e desgraçadamente o mesmo e sempre ao serviço dos mesmos.

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

Pensamento


«Pergunte sempre a cada ideia: a quem serves?» 
Bertolt Brecht
In Paulo Neves da Silva, Dicionário de Citações, Âncora Editora.