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Estamos a pagar a factura da qualidade medíocre dos políticos e dos patrões que têm dominado o poder político e o poder económico no nosso país. A semana finda foi ilustrativa dessa realidade.
Da parte do governo derrubado e da minoria de deputados que o apoiava, o que foi dito e escrito gerou uma enorme náusea. À desonestidade intelectual que evidenciaram juntaram uma terminologia rasteira. Valeu dizer tudo: valeu o insulto, valeu a acusação moral, valeu a desqualificação, valeu a mentira, valeu a analogia estúpida, valeu tudo o que emergiu a cabeças desaustinadas. Passos Coelho, Paulo Portas e os deputados do PSD e CDS mostraram o pouco que valem, quer na substância do que pensam e dizem quer na falta de dignidade que demonstram ter no exercício dos cargos que ocupam.
Da parte da casta patronal, o que foi dito serviu para confirmar o que há muito é conhecido: quando estes protagonistas falam em «interesse nacional» estão na realidade a falar, apenas e só, em interesses particulares. As diferentes confederações e associações patronais que foram opinar a Belém disseram todas o mesmo: não querem um governo apoiado pela esquerda parlamentar. Não o querem porque a esquerda parlamentar não dá garantias de salvaguardar os interesses e os privilégios da casta patronal. As medidas previstas nos acordos assinados entre o PS e os partidos da esquerda parlamentar, medidas que estabelecem alguma redistribuição de riqueza, são inaceitáveis para a casta patronal. Regras que obriguem a qualquer diminuição das desigualdades sociais, ainda que pequena, são imediatamente atacadas, e quem as defender imediatamente vilipendiado.
PSD, CDS e entidades patronais formam um conjunto coerente, coeso e duradoiro. Sobre isso não existem dúvidas. Essa coerência, essa coesão e essa durabilidade interessam a Cavaco Silva, mas não interessam à esmagadora maioria dos portugueses. Não interessam aos desempregados, aos que tiveram que emigrar, aos pensionistas e reformados e aos trabalhadores que recebem salários vergonhosos ou medianos. Para o PSD e CDS e para as entidades patronais, a defesa dos interesses instalados constitui a primeira e única prioridade. A estes interesses hipotecam, com evidente à vontade, as regras da própria democracia. Por isso sugerem que os deputados do PS, do BE, do PCP e do PEV deveriam atraiçoar os compromissos que estabeleceram com os seus eleitores e deveriam permitir que PSD e CDS governassem. Na verdade, PSD e CDS têm tido essa prática. Passos Coelho foi e é um exemplo paradigmático dessa forma de estar na política. Ninguém se esquece das desvergonhadas promessas eleitorais que fez em 2011 e do modo como governou durante os quatro anos seguintes. Era esse modelo de comportamento que PSD, CDS e entidades patronais queriam que os deputados do PS e dos partidos da esquerda parlamentar seguissem, de modo a permitirem que aqueles dois partidos continuassem a governar o país.
Entretanto, Cavaco Silva hesita entre, contra vontade, terminar o mandato nomeando um governo do PS, apoiado pela esquerda, ou terminar como um déspota, que desrespeita as regras da democracia e impõe um governo de gestão.
Enquanto hesita, vai dois dias à Madeira, porque o país pode esperar.